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Sinopse

Carlos e Allison se acostumaram a dizer "não" para amigos e familiares. O casal decide mudar essa realidade e passar a dizer "sim" para tudo. O que eles não imaginavam era acabar envolvidos numa série de confusões e trapalhadas.

Crítica

Apontado como um dos grandes lançamentos originais da Netflix nessa temporada, Dia do Sim é nada mais do que o resultado de um estudo de algoritmo, buscando atender às mais diversas manifestações da sua ampla gama de assinantes. Afinal, tem-se aqui um filme que atira para tantos lados que, na tentativa de agradar a muitos, fica sempre pelo meio do caminho, sem nunca, no entanto, alcançar a plena realização. É um projeto que aponta destinos interessantes, mas nunca o compromisso necessário para alcançá-los com efeito. Mais do que estar atento aos nomes dos envolvidos tanto à frente como atrás das câmeras, tem-se aqui um longa esquemático que reflete com maior precisão as necessidades de uma cartilha a ser preenchida, de uma fórmula de laboratório que visa agradar a uma maioria, e nem chega próximo de realizar qualquer tipo de visão, seja artística ou de mero entretenimento.

O tal ‘dia do sim’ do título é nada mais do que o reflexo de uma geração acomodada e mimada ao excesso pelos próprios pais e professores que deveriam se encarregar antes de suas educações e de prepará-los para um mundo que nem sempre será o mais gentil com eles, e menos em atender toda e qualquer necessidade pontual, seja ela real ou apenas passageira. Allison (Jennifer Garner, que ao menos se mostra comprometida com a proposta) e Carlos (Edgar Ramírez, que parece não entender ao certo o que se passa ao seu redor) eram jovens divertidos e apaixonados, e por isso decidiram casar e formar família. Só que com essa decisão vem junto as responsabilidades de uma casa, empregos que os sustentem e filhos. Estes, porém, como desconhecem como os pais eram antes disso tudo, os veem apenas como controladores, preocupados e exigentes. Aliás, como qualquer pai ou mãe consciente se mostra na maior parte do tempo.

O problema é que ela, principalmente, sente saudades da leveza e maleabilidade de tanto tempo atrás. Ainda mais quando percebe que é nas suas costas que muito dessas culpas recaem, pois, do casal, é com ela que recai o papel do “tira mau”, enquanto que ao marido resta apenas ser o “tira bom”, ou seja, o que até tenta fazer as vontades dos filhos, mas que se resigna aos mandos e desmandos maternos quando essa decide impor ordem no lar. Pois bem, cansada de estar sempre de mau-humor e disparando ordens a torto e direito, aceita o pedido dos pequenos: durante um único dia, tudo o que Katie (Jenna Ortega, de A Babá: Rainha da Morte, 2020), Nando (Julian Lerner) e Ellie (Everly Carganilla) pedirem, serão atendidos. Claro que há alguns limites: nada de grandes deslocamentos geográficos (sem passar o dia na Disney, por exemplo) ou aquisições exorbitantes (carro zero quilômetro? Só depois dos 18 anos, mocinha).

Essa seria uma excelente oportunidade para discutir os limites da criação e como pais devem e podem se impor diante das múltiplas vontades e anseios dos filhos, constantemente bombardeados por demandas publicitárias e consumistas por todos os lados – internet, televisão, cinema, revistas, redes sociais. O diretor Miguel Arteta – que já havia passado por um imbróglio familiar semelhante em Alexandre e o Dia Terrível, Horrível, Espantoso e Horroroso (2014), mas deixando claro estar cada vez mais distante da boa estreia que teve com Por Um Sentido na Vida (2002) – opta por seguir trilhas mais cômodas, resignando-se ao embate entre crianças e adultos, buscando o riso fácil a qualquer custo. E assim tem-se à exaustão overdose de sorvetes, bombas d’água jogadas umas nas caras dos outros e piadas escatológicas comedidas, bem de acordo, é claro, com a faixa etária dos personagens. Nada que chegue a ameaçar, mas também longe de soar minimamente memorável.

Entre passagens que abusam do melodramático – como a declaração mútua entre mãe e filha em meio a um show de música pop – e sequências que mereciam ser melhor desenvolvidas – a festa de espuma que toma conta de toda a casa parece não gerar consequências aos envolvidos, como se não houvesse lição alguma a ser aprendida diante tamanha falta de controle – o que termina por justificar alguma curiosidade a respeito são participações especiais, como da cantora H.E.R. (indicada ao Oscar pela canção do filme Judas e o Messias Negro, 2020) e os comediantes Fortune Feimster (a paramédica descontrolada), Nat Faxon (o professor responsável pela ideia do ‘Dia do Sim’) e Arturo Castro (o policial enganado pelas crianças). São eles que respondem por momentos que acabam resgatando Dia do Sim de uma previsibilidade quase anestesiante, tamanha é a quantidade de lições de moral de efeito prático próximo ao zero que o enredo se preocupa em acumular. Caso tirasse o pé dos freios, poderia ser realmente anárquico e marcante – a proposta, ao menos, poderia sugerir tais caminhos. Mas, ao se mostrar comportado além do necessário, tudo que consegue é resvalar no óbvio, acentuando ainda mais sua irrelevância.

 

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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