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Sinopse

Rogéria, Jane Di Castro, Divina Valéria, Camille K, Eloína dos Leopardos, Fujika de Halliday, Marquesa e Brigitte de Búzios são ícones da primeira geração de artistas travestis do Brasil. A partir de uma íntima relação com a diretora e com o teatro de sua família, importante palco na trajetória de todas elas, acompanhamos as personagens no processo de construção de um espetáculo que celebra seus 50 anos de carreira.

Crítica

Leandra Leal nasceu nos palcos. É filha da atriz Ângela Leal e neta de Américo Leal, dono do Teatro Rival. Desde pequena, a intérprete conviveu com o diferente. E, consequentemente, com suas diferenças. A pluralidade sexual e de gênero foi marca constante de seu crescimento. Isso ela faz questão de salientar em sua doce e saudosa narração em off que conduz Divinas Divas. O filme é sua estreia como diretora em um longa-metragem documental. Um retrato histórico de oito drag queens que ascenderam ao estrelato. E isso, justamente em um dos períodos mais duros da história brasileira, a ditadura militar. Partindo de um espetáculo com o mesmo nome desta produção, Leandra promoveu uma homenagem. Além de ter contado com a presença das estrelas nos holofotes, resultando neste belo trabalho.

Em meio aos bastidores do show, acompanhamos depoimentos de Rogéria, Jane Di Castro, Divina Valéria, Camille K, Eloína dos Leopardos, Fujika de Halliday, Marquesa e Brigitte de Búzios. Além de pessoas ligadas às suas trajetórias. Muito mais que o combate ao preconceito, estas divas que dão título à obra são desnudadas por uma câmera intimista e pela própria presença de Leal. Ao fazer parte da história do próprio filme, a atriz incita à humanização de suas personagens. Elas podem ser falantes por natureza. Porém, a confiança conquistada pela agora cineasta faz com que revelem muito além das palavras.

É a partir daí que compreendemos como este grupo tão pequeno conseguiu se sobressair numa sociedade extremamente hipócrita e julgadora. Algumas vieram de famílias de baixa renda, foram rejeitadas por conta de sua condição e tiveram que penar muito para se sustentar. Outras, como a própria Rogéria, deram sorte de nascerem abastadas e com pais de mente aberta. Eles nunca questionaram negativamente a vida que os filhos queriam levar. Mas não se trata de uma ser melhor ou pior que a outra por terem conseguido se estabelecer de forma mais “fácil” ou não. Aliás, essa não seria a palavra correta para descrever o que cada uma passou, independente de suas bases. Afinal, o mundo aqui fora gosta de olhar torto para o que é diferente. Isto quando não abusa da própria força física para querer diminuir os outros.

Por conta destes relatos é que se vai além do clichê de Cidade Maravilhosa que o Rio de Janeiro ostenta, como maior capital turística do país. É a terra de oportunidades para quem é diferente e pretende fazer diferença. Também é um poço de dificuldades que não se afunila apenas nas favelas. Assim compreendemos como estas oito artistas conseguiram ser privilegiadas por conta de seu trabalho árduo. Ainda, é claro, que centenas de outras colegas suas, sexagenárias ou balzaquianas, continuem em busca de um lugar ao sol. Seja nas praias cariocas ou em qualquer outro canto do país.

A estreia do longa vem bem a calhar numa época em que há tanta discussão sobre travestis, transexuais e draga queens. O foco está nas novelas e em reportagens nacionais. Mas também na ascendência de shows locais e novos talentos graças à popularização de programas como Ru Paul's Drag Race. Eles mostram o glamour e a humanidade de pessoas que querem ser apenas elas mesmas, independente de sexo e gênero. A sexualidade nunca esteve tão em pauta no mundo. Mesmo que tenha ocorrido um grande hiato após a popularização do tema nos anos 1990 com filmes como Priscilla: A Rainha do Deserto (1994).

Neste ínterim, Leandra Leal e suas Divinas Divas aportam como um sopro de criatividade e simplicidade. Estamos em uma era em que os direitos humanos nunca estiveram tão ameaçados pela truculência religiosa e política. Muito além da beleza de uma homenagem intimista, o filme apresenta ao público um outro estilo de vida ao qual muitos não estão habituados. Nem por isso devemos ter menos respeito. É um debate maior que tem como grande objetivo a inclusão. Uma palavra que nem todos entendem o que quer dizer. Talvez com uma obra pequena, mas que tem tanta força como esta, uma parcela dos espectadores possa olhar com maior empatia o outro. Sonhar não custa, como estas divas ensinam a cada take.

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é crítico de cinema, apresentador do Espaço Público Cinema exibido nas TVAL-RS e TVE e membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista e especialista em Cinema Expandido pela PUCRS.
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