Crítica
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Sinopse
Capaz de mergulhar no inconsciente das mentes possuídas, um exorcista nada ortodoxo encontra uma garota com uma capacidade muito semelhante. Paralelo a isso, ele se depara com um menino assombrado por um inimigo letal.
Crítica
No início de Dominação, ao voltar para casa com a mãe (Carice van Houten), após as compras para o jantar, o jovem Cameron (David Mazouz) avista na calçada uma moradora de rua de aparência estranha, que lança sobre ele um olhar ameaçador. Na sequência, já dentro do apartamento, temos uma breve e superficial contextualização sobre o núcleo familiar rachado, com a menção a um pai ausente e aparentemente abusivo. Mais tarde, ainda na mesma noite, o garoto ouve ruídos vindos da sala e, depois de confrontar o inesperado invasor, termina sendo possuído por uma entidade demoníaca. Cameron, então, encara a câmera diretamente, com luzes vermelhas emanando de seus olhos, enquanto a cartela com o título do longa surge do zoom out da imagem, embalada por uma trilha com resquícios dos sintetizadores dos terrores oitentistas.
Mesmo com pouca habilidade para a criação de suspense, a abertura de Dominação apresenta uma aura clássica de filme B, apontando para uma direção que, caso fosse abraçada plenamente, poderia resultar em um produto divertido. Infelizmente, o diretor Brad Peyton ignora este caminho, levando o material que tem em mãos muito mais a sério do que o próprio demanda. Sua aposta é na criação de uma mitologia supostamente complexa envolvendo o protagonista, Dr. Seth Ember (Aaron Eckhart), um cientista que possui habilidades excepcionais, sendo capaz de entrar na mente de vítimas possuídas para realizar um exorcismo – embora ele refute o termo por não ter envolvimento com qualquer religião – de dentro para fora. Essa capacidade implica em uma série de regras, sempre expostas de maneira rasa, e que são arbitrariamente quebradas o tempo todo.
A fragilidade da lógica poderia até ser relevada, algo geralmente aceito mais facilmente dentro do gênero fantástico e de horror, porém, Peyton demonstra uma inaptidão quase total para utilizar esses elementos na concepção de um universo, de fato, envolvente. Responsável por aventuras de grande escala, mas igualmente sem personalidade, como Viagem 2: A Ilha Misteriosa (2012) e Terremoto: A Falha de San Andreas (2015), o cineasta exibe grande dificuldade para trabalhar dentro das limitações da produção e dos arquétipos desse tipo de filme. Sua direção falha completamente na construção de atmosfera, com uma encenação simplista, prejudicada ainda mais pela montagem truncada. No aspecto dramático da trama, sua condução não se mostra mais capacitada, seja nos conflitos envolvendo a tragédia familiar do passado de Ember ou na relação entre Cameron e os pais.
Ao longo da projeção, diversas oportunidades são desperdiçadas, já que essa mistura de O Exorcista (1973) com A Cela (2000) poderia, em mãos mais talentosas, trazer algum frescor ao desgastado filão dos filmes de possessão. Há também certo clima, mal desenvolvido, de histórias em quadrinhos, como as do personagem John Constantine, de Hellblazer. A menção a um grupo de outros “exorcistas” iguais a Ember, por exemplo, não é explorada, ficando limitada à figura do padre Felix (Tomas Arana), que também acaba subutilizado. Seu esconderijo e seus experimentos com o sangue de um possuído, que lhe permitem a criação de uma fórmula capaz de auxiliar na expulsão dos demônios, por mais mal explicados e improváveis que sejam, poderiam despertar algum interesse, mas a participação do personagem se restringe a duas cenas.
Os elementos fantásticos compõem outro aspecto pouco aproveitado pelo filme. Mesmo com boa parte da ação se passando no ambiente dos sonhos, Peyton não adentra de vez o surreal e o absurdo, utilizando apenas o recurso das portas que se abrem quando o possuído foca seu pensamento em algo que lhe agrada, no caso, sempre sua cor favorita. Um clichê psicológico dos mais rasteiros. Visualmente, o trabalho do diretor nunca vai além do básico, ignorando diversas possibilidades de compor planos esteticamente mais atraentes, tendo à disposição material para isso, como a sequência no parque de diversões, com a sala de espelhos e os palhaços. O mesmo vale para o momento em que o ser demoníaco adquire sua forma original, mostrada apenas parcialmente. O que poderia ser um artifício para manter o mistério, mas que soa mesmo como fruto do orçamento reduzido.
Em meio a tantos problemas, Aaron Eckhart mostra um empenho – até mesmo físico – bem acima do que se poderia exigir, tentando dar algum peso a seu personagem. A holandesa Carice van Houten também se esforça, mas, assim como para Catalina Sandino Moreno, no papel da especialista do Vaticano enviada para acompanhar o caso, pouco lhe é oferecido pelo roteiro repleto de reviravoltas sem impacto. São as figuras dos assistentes de Ember (interpretados por Keir O'Donnell e Emily Jackson), porém, que talvez representem melhor o pecado fundamental de Dominação: a falta de humor, até mesmo o involuntário. Evidentemente criados para a função de alívios cômicos, os dois não possuem nenhuma piada digna de nota, nem quando tentam comparar o conceito de alma ao de um sinal de wi-fi. Desta forma, Peyton rejeita por completo a vocação para o entretenimento trash que havia ficado na promessa de seu prólogo.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Leonardo Ribeiro | 3 |
Francisco Carbone | 1 |
Diego Benevides | 2 |
MÉDIA | 2 |
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