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Sinopse

Dona Flor é uma professora de culinária de Salvador que se vê dividida entre o amor de dois homens. Um é o malandro Vadinho, já o outro, é o correto farmacêutico Dr. Teodoro.

Crítica

Durante muito tempo, Dona Flor e Seus Dois Maridos (1976) foi o grande recordista de bilheteria do cinema brasileiro. Então, dá para especular que a realização deste remake roteirizado e dirigido por Pedro Vasconcelos intenta, num primeiro momento, aproveitar-se da imensa popularidade da história escrita por Jorge Amado que, conforme os números de outrora comprovam, caiu amplamente no gosto do público. Em comparação ao antecessor, a nova versão possui prós e contras (ligeiramente mais contras), mas apresenta semelhante debilidade quando vislumbramos o todo. Se destaca, inicialmente, a adoção do sotaque baiano pelo elenco, traço imprescindível de caracterização que passou batido por Bruno Barreto nos idos anos 70. Dona Flor (Juliana Paes), mulher batalhadora, uma linda soteropolitana, sofre cotidianamente ao casar-se com Vadinho (Marcelo Faria), mulherengo e jogador inveterado. Aqui, ela é efetivamente a personagem principal do filme, pois tudo parte de sua percepção.

Esse protagonismo de Florípedes sobressai já na primeira cena, a da morte do esposo em meio aos festejos de carnaval. A câmera se importa muito mais com o percurso penoso da esposa em direção ao corpo inerte do homem amado, isolando propositalmente sua dor do resto, buscando ampliá-la expressivamente. A narração em off que ocasionalmente entrecorta a narrativa torna essa centralização mais evidente, pois nos aproxima inequivocamente das sensações íntimas da viúva logo cobiçada. Dona Flor e Seus Dois Maridos apresenta um percurso atropelado na tentativa de sintetizar e, portanto, dinamizar o relato dos dias de vadiagem de Vadinho e, por conseguinte, do calvário de Flor. Falta espessura dramática às cenas em que ele deixa para trás a imagem de sedutor apaixonado, para revelar-se um bon vivant aproveitador. Aliás, o tom adotado pelo cineasta é grave, especialmente quando detido na insatisfação da mulher que encontra felicidade conjugal apenas na cama, na hora do amor.

O grande ativo da realização setentista é realmente o trabalho do elenco. Os desempenhos marcantes de Sônia Braga, José Wilker e Mauro Mendonça são fantasmas incômodos durante este Dona Flor e Seus Dois Maridos. Juliana Paes dá conta do recado, sobretudo se levarmos em conta a diferença de abordagem, com Flor ganhando nuances e espaço. Marcelo Faria, também produtor do filme, é extremamente íntimo de Vadinho, pois o interpretou no teatro anos a fio. Todavia, sua caracterização deixa a desejar, pois carece da malandragem genuína que Wilker trouxe ao personagem, tornando-o carismático acima de qualquer coisa. Mas, o elo frágil da trinca é realmente Leandro Hassum que, infelizmente, reduz Teodoro a uma figura patética no mais das vezes, valendo-se de caras e bocas para construir na telona o segundo marido da protagonista. Os olhos arregalados ao expressar formalmente seu amor, por exemplo, provocam riso involuntário, evidenciando uma tentativa malfadada de humor.

Há, porém, uma vontade flagrante de equilibrar melhor as instâncias da história. Ao contrário do longa-metragem de 1976, aqui não se deixa para praticamente os últimos minutos a interação do casal com o fantasma de Vadinho. Dona Flor e Seus Dois Maridos logra êxito ao dar mais relevo ao triângulo, mesmo incorrendo em repetições contraproducentes – como a reutilização de certas músicas para denotar estados de espírito e o jogo de encenação a fim de fortalecer o caráter fantasmagórico do regresso – e claramente atribuindo a Teodoro um papel meramente ilustrativo. Pedro Vasconcelos se foca no fogo que une Flor e Vadinho, mais especificamente na constatação de que ela precisa dos dois homens para sentir-se plena. Isso chega a ser verbalizado pelo morto, que, assim, direciona desnecessariamente a nossa percepção. Os coadjuvantes tornam-se figurantes, peças descartáveis neste filme conduzido com mão visivelmente pesada, que extrai charme apenas da convergência de tudo em Flor.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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