Crítica
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Sinopse
O mundialmente famoso neurocirurgião Dr. Stephen Strange, em sua busca pela cura após um terrível acidente de carro, descobre uma poderosa magia em um lugar misterioso conhecido como Kamar-Taj. Com as habilidades que lhe foram conferidas, travará uma linha de frente contra forças ocultas do mal determinadas a destruir nossa realidade.
Crítica
O plano aéreo de Nova Iorque que destaca o logotipo dos Vingadores cravado no topo de uma das torres mais altas deixa claro o alinhave de Doutor Estranho na megalômana trama cinematográfica da Marvel. Deriva também dessa filiação boa parte do tom adotado pelo diretor Scott Derrickson, uma mescla eficiente de ação e humor. O protagonista é Stephen Strange (Benedict Cumberbatch), proeminente neurocirurgião com um ego só comparável, em tamanho, à sua eficiência com o bisturi. Completamente autocentrado, ele não se furta de humilhar colegas menos talentosos e de fazer pouco do afeto demonstrado pela colega Christine (Rachel McAdams). Um acidente gravíssimo, porém, compromete o funcionamento de suas mãos, instrumentos de trabalho então avariados quase irremediavelmente. Nesse ponto do filme, a despeito das falhas de caráter, são ressaltadas as virtudes do protagonista, sobretudo a tenacidade, por vezes confundida com obsessão, que mais adiante será imprescindível à rápida assimilação de um mundo novo, feito de magia e transcendência.
Homem estritamente racional, ele demora a acreditar no que os olhos testemunham no Nepal. Recebido pelo enigmático Ancião (Tilda Swinton) e por Mordo (Chiwetel Ejiofor), começa um árduo processo de aprendizado, que inclui idas constantes à biblioteca de Kamar-Taj – onde, aliás, ocorrem ótimas piadas com o guardião dos livros, sujeito que não possui sobrenome –, e um desprendimento gradativo de suas fraquezas. Doutor Estranho é um longa-metragem visualmente bastante engenhoso. A forma como os cenários são distorcidos, duplicados, invertidos, entre outras possibilidades exploradas, confere efeito lisérgico à imagem, o que amplifica a sensação de estarmos diante do extraordinário, de algo que foge inteiramente da chamada normalidade. Strange sofre para conseguir se relacionar de fato com o intricado multiverso destrinchado com a serenidade dos mestres orientais pela personagem de Swinton. O itinerário do enredo é mais ou menos reconhecível, já que as habilidades inatas do protagonista permitem a ele pular etapas, tomando logo ciência de informações avançadas.
Em Doutor Estranho o antagonista é uma ovelha desgarrada, antigo discípulo do Ancião, que tende a queimar as asas, pois próximo demais do sol. Kaecilius (Mads Mikkelsen) é essa ameaça poderosa que manipula os elementos com destreza. A certa altura, percebendo as aptidões precoces de Strange, ele tenta o novato, apelando ao amplo poder que reside nas sombras. Não bastasse o protagonista ser evidentemente uma espécie de escolhido, paralelo óbvio com a figura maior do cristianismo, essa cena faz, ainda, alusão à famosa passagem bíblica da tentação do diabo ao filho de Deus no deserto. Simbologias à parte, o que realmente confere tônus a Doutor Estranho é o seu elenco, repleto de talentos facilmente identificáveis. Benedict Cumberbatch transita com desenvoltura da arrogância inicial ao heroísmo latente que gradativamente toma conta de Strange. Swinton e Ejiofor suportam a jornada do protagonista com a solidez de seus coadjuvantes. E Mikkelsen, com a contumaz capacidade de criar tipos ambíguos e ferozes, prova ser uma escolha acertada para o papel do vilão principal.
Embora menor e ligeiramente subaproveitada, a personagem de Rachel McAdams garante o elo de Strange com a dimensão material, além de proporcionar alguns dos momentos mais engraçados e curiosos do filme, como quando é orientada na mesa de cirurgia pelo espírito inquieto e pedante do paciente ou no susto que leva pela simples queda de uma vassoura. Doutor Estranho é bem-sucedido no que diz respeito à apresentação de uma figura praticamente desconhecida do grande público, com potencial para agregar importantes camadas ao universo cinematográfico da Marvel. Alimentada por uma interessante coreografia de lutas e pelos sortilégios de uma direção, senão absolutamente inventiva, ao menos efetiva o suficiente para não deixar a adaptação cair numa vala comum, a narrativa prima pela agilidade. Sem descuidar dos elementos humanos, surgidos em meio aos bem-vindos instantes de descontração que aliviam a sisudez, o longa não banaliza os perigos e os desdobramentos nefastos de uma guerra, cujas ameaças, aqui, apenas acenam com implicações devastadoras.
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