Crítica
Leitores
Sinopse
Há 20 anos convivendo com o HIV, o cineasta Joaquim Pinto faz uso de drogas clandestinas durante um período prolongado e conta suas experiências em forma de filme.
Crítica
No início de E Agora? Lembra-me, o técnico de som e diretor Joaquim Pinto afirma que sua vida não é muito interessante. Porém, é o espectador que vai julgar isto após mais de duas horas deste sensacional documentário que relata o cotidiano do cineasta e sua convivência com o vírus HIV e a Hepatite C. Entre testes experimentais para combater a doença em Madrid, a rotina da sua casa em um pequeno sítio em Portugal onde mora com o companheiro Nuno e os quatro cachorros e as dores que experimenta ao longo dos tratamentos, Pinto se utiliza como objeto para dar uma dimensão muito maior de como houve avanços contra o HIV nos últimos 20 anos - por sinal, o tempo que ele convive com o vírus no corpo.
Se o tempo de duração pode causar um certo receio em que lê a sinopse, logo o medo se perde pois a história é fluida e contagiante. Dono de um carisma ímpar, o diretor tenta lidar com bom humor o máximo que pode a respeito de sua história, mesmo que a memória de amigos queridos que partiram com a doença, especialmente nos anos 1980, bata em sua cabeça como uma realidade difícil de fugir. Ao longo dos 160 minutos do documentário, Pinto não apenas nos mostra sua vida como tenta dar voz ao próprio vírus que carrega consigo, seja através de pesquisas na internet, uma passagem por um laboratório que estuda a doença ou os imagens documentais que mostram como era ser portador quando o HIV explodiu no início dos anos 1980, tanto no corpo de quem carregava a doença como a imagem que se criou. É claro, não fugindo da discussão sobre o "câncer gay" que todos chamavam e a vida que todos conseguem levar nos dias de hoje através de coqueteis e afins.
A estética naturalista muitas vezes se transforma através da performance do próprio diretor. Mesmo que ele não esteja propriamente atuando. Porém, é visível seu sofrimento, ainda que a imagem que ele tenta nos passar seja de positividade. Objetivo que ele alcança pela sutileza de deixar quem está assistindo entrar na sua intimidade, como um reality show em uma versão reduzida, sem vencedores ou perdedores, apenas um homem que é afetado pelas consecutivas perdas de memória recente e com uma bagagem emocional intensa, de anos, para nos contar. É um desabafo honesto sobre si e sobre o mundo, de como ele e como ele foi durante todo este tempo. Fica difícil não se apaixonar por sua figura com tanta honestidade e sinceridade colocadas à prova.
É uma obra desconcertante, que provoca, instiga. Pinto filosofa e questiona a todo o momento o que é a vida, a sua e a dos outros, por vezes até de modo fatalista e dramático demais. Porém, o que poderia soar como uma obra de depressão sobre a doença como último estágio antes da morte se torna uma celebração da vida. No caso da relatada aqui, o contrário do que o diretor tenta nos convencer, pois é repleta de amor aos seus e à arte do que é fazer bom cinema. Mérito de alguém que sempre soube filmar seus projetos com alma, ainda mais este que é seu trabalha mais intimista, revelador e que deixa o espectador emocionado, doido para aproveitar seus melhores momentos. Afinal, nunca se sabe a verdadeira hora de partir.
Últimos artigos deMatheus Bonez (Ver Tudo)
- In Memoriam :: Joan Fontaine (1917-2013) - 22 de outubro de 2020
- Morte Sobre o Nilo - 10 de março de 2020
- Aspirantes - 1 de novembro de 2019
Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Matheus Bonez | 9 |
Diego Benevides | 9 |
Chico Fireman | 9 |
Edu Fernandes | 9 |
MÉDIA | 9 |
Deixe um comentário