Sinopse
Odile suspeita que Jean, seu marido, seja infiel a ela. Decide, então, lhe dar de seu próprio remédio. Ela conhece por acaso Daniel, um ator que vai usar para sua vingança. Daniel, que vive com o ex-militar Albert, vai fazer amor com ela, o que desencadeará algumas consequências inesperadas: os dois serão para sempre ligados por um amor incontrolável.
Crítica
A negação inicial do campo/contracampo é indício do tratamento ímpar que o diretor Paul Vecchiali pretende dar ao amor neste filme. Jean (Julien Lucq) chega tarde e se põe a discutir com Odile (Astrid Adverbe), sua esposa insatisfeita em virtude das ausências, do cansaço e de outras desculpas repetidas por ele. Vecchiali dá importância às perspectivas acima do diálogo. Antes, temos o ponto de vista do homem, depois o da mulher, separadamente, com falas e entonações iguais. Essa dinâmica de isolar as partes evidencia a impossibilidade de tornar indivisíveis, mesmo até então unidos por um sentimento forte, dois corpos estranhos que respondem a estímulos e expectativas de maneiras distintas. Ao tirar da encenação a naturalidade, o realizador sinaliza anseios de abordar as complexidades inerentes ao ato de amar sob uma ótica privada de vícios, dotada de uma austeridade bastante própria.
Odile, desconfiada da lealdade do marido, promete traí-lo para ver se o tira do estado letárgico que tanto a incomoda. A partir daí, o que era benéfico estranhamento se torna gradativamente uma tônica repetitiva e contraproducente. As pessoas se assemelham a autômatos, com expressões milimetricamente compostas para transmitir as sensações de torpor e impotência. Não só isso. Em determinadas cenas, como, por exemplo, na da festa em que a protagonista procura aleatoriamente um amante, o comportamento quase geométrico dos figurantes expõe essa diretriz de negar o registro cotidiano, de correr riscos, se preciso for, penhorando até a empatia que porventura possamos criar pelos personagens. A forma se sobrepõe ao conteúdo, oprimindo-o com imperativos estilísticos. O diretor paga um alto preço por deflagrar (desajeitadamente) camadas sentimentais não ordinárias.
Outro ponto que atrapalha a fruição de É o Amor é a forma como Vecchiali deliberadamente se vale das elipses para fragmentar demasiadamente a narrativa. Como efeito colateral, vamos perdendo contato com o aspecto humano e com as aflições. O posterior envolvimento de Odile com Daniel (Pascal Cervo), ator de renome que vive em regime matrimonial com Albert (Frédéric Karakozian), ex-militar dono de uma cooperativa vitivinícola, tenta evocar a poesia como condutor dos encontros e, porque não, também dos desencontros. Embora aparentemente destituído de qualquer significado, pois esvaziado, o sexo entre eles é o gatilho para uma insuspeita paixão de ordem superior, bem mais delineada por meio de palavras que propriamente pela encenação. Aliás, este é um dos pontos mais frágeis do longa-metragem, sua subserviência ao dito, ainda assim, nem sempre manifestado com pungência suficiente.
O desenvolvimento de É o Amor se ressente da falta de solidez no engendramento das singularidades afetivas. A linguagem está a serviço de uma investigação que mira os afetos com menos racionalidade, tentando captar algo nas fraturas e nos contratempos. É um caminho repleto de pedregulhos esse proposto por Paul Vecchiali, no qual o caráter expositivo fica a cargo do texto, muitas vezes empostado excessivamente, enquanto a imagem se encarrega do que escapa ao falatório. As duas instâncias se digladiam, ao invés de trabalharem em consonância. Odile, ora é uma mulher que sofre pela iminente falência do casamento, ora praticamente uma entidade hipersexualizada. Os demais são figuras essencialmente apáticas. Raras as sequências que neste filme servem, de fato, ao propósito de esquadrinhar com relevância o amor e suas vicissitudes, mesmo dentro das insólitas realidades propostas.
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