Crítica
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Sinopse
Crítica
Embora seu pai, Eduardo (Osvaldo Doimeadiós), seja um tirano em casa, que faça de sua mãe, Alina (Lynn Cruz), refém num angustiante cárcere doméstico, Lili (Gabriela Ramos) o idolatra sobremaneira. A constatação dessa violência, oriunda de uma deturpação dos afetos por força da agressividade, é fundamental à pungência de É Você, Papai?, filme não necessariamente dado a explicitar os instantes de maior brutalidade. A prevalência do extracampo é ora eficiente, ora conveniente, isto por soar como artifício para evitar a efetivação de cenas complexas do ponto de vista prático, tais como a derrubada da motocicleta de uma ponte ou a devora de um cadáver pelos porcos da propriedade que desponta como cenário principal. Não fosse a excelência do tratamento sonoro, que confere impacto às circunstâncias das quais somos privados visualmente, e esse equilíbrio seria prejudicado. O cineasta Rudy Riverón Sánchez, todavia, se empenha para adensar a atmosfera.
Eduardo mantém a esposa amarrada enquanto sai com a filha para trabalhar. A menina não demonstra piedade diante do calvário materno, assim deflagrando outra camada dessa selvageria perpetrada por alguém “autorizado” por um machismo que supostamente lhe concede poderes sobre outrem. É Você, Papai? outorga à direção de arte um papel imprescindível, pois as paredes carcomidas e o terreno que abriga a residência depauperada, numa estância afastada e com poucos olhares externos, ampliam a noção de abandono sobressalente, inclusive quando a tragédia bate à porta dessa família tornada disfuncional pelos ímpetos paternos altamente corrompidos. Voltando à questão do som, é por meio de seu rico desenho que há a sensação do volume das hostilidades que mediam os passos rotineiros. O arfar intenso do homem diante dos pés da amada subjugada é essencial para que esse ato aparentemente de carinho seja tido como nocivo.
É Você, Papai? não tem pressa para edificar a opressão que ganha novos ingredientes com a presença subalterna, mas enigmática, de Carlos (Jorge Enrique Caballero). Substanciado pela conjugação da imagem e do som, de modo que tais componentes não se sobreponham, mas se complementem expressivamente, o filme, contudo, demonstra morosidade especialmente após a atitude que modifica o panorama apresentado como essencial à concepção familiar de Lili. Ajudada por uma vizinha que a resgata na estrada, a protagonista empreende um ritual sobrenatural visando o regresso que tortuosamente lhe diminuiria a tristeza. Rudy Riverón Sánchez se demora, às vezes excessivamente, no rosto de Gabriela Ramos, num semblante anuviado pela influência nefasta, manifestada através da menina que se recusa a aceitar a liberdade da mãe. Falta objetividade quando a narrativa bem poderia crescer no que tange à intensidade dessas angústias.
A despeito da temperatura contida, da selvageria que surge sem a necessidade de cenas repletas de jump scares, É Você, Papai? se ressente da falta de uma variação emocional mais efetiva, se desenvolvendo em modulações reiterativas. Além da esfera fantástica, acessada mais sugestivamente, o imprescindível aqui é a deflagração do espelhamento sinalizado desde o início. Embora o realizador pudesse sublinhar melhor a natureza perniciosa de um falocentrismo que, não satisfeito em brutalizar a mãe, arrasta a filha para um redemoinho de identificação altamente tóxico, esse substrato constante é carente de tônus. Rudy Riverón Sánchez permanece entre mostrar o que acontece e apenas insinuar, geralmente logrando êxito nessa operação delicada, demonstrando criatividade, mas ocasionalmente expondo possíveis contingências de produção. Mas, entre mortos e feridos, o saldo é positivo, sobretudo pelo domínio das instâncias que geram o horror.
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