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Crítica


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Sinopse

Uma mulher é acusada de matar o chefe após ser absolvida do assassinato do marido. Uma jornalista volta à sua cidade natal com a filha, a fim de investigar o caso, sendo obrigada a confrontar o passado e sua mãe.

Crítica

Stephen King não esconde o amor que sente por Louca Obsessão (1990), suspense baseado em sua obra que rendeu a Kathy Bates o Oscar de Melhor Atriz. Não apenas pelo filme, mas principalmente pela intérprete de uma das personagens mais bem construídas de toda sua carreira. O escritor ficou tão impressionado que escreveu um novo papel já com Bates em mente. Eis que surgiu Dolores Claiborne, a protagonista de Eclipse Total, um thriller psicológico, rico em utilizar o suspense como pano de fundo à possível retomada de uma não relação entre mãe e filha, mas que acaba pecando em alguns momentos pela falta de um roteiro mais coeso e uma direção menos esquizofrênica.

A Dolores do título original, personagem de Bates, é uma mulher já com certa idade, que trabalha cuidando de uma senhora rica da Nova Inglaterra, Vera Donovan (Judy Parfitt). Um dia, a velha rola escada abaixo e vemos Dolores se dirigindo a ela com um rolo de madeira em mãos. A mulher morre. A criada vai presa. A filha, Selena (Jennifer Jason Leigh), jornalista de Nova York, é notificada. O encontro entre as duas se dá após mais de uma década. Percebe-se que a relação é turbulenta por conta de questões mal resolvidas do passado. Afinal, o que causou tamanho distanciamento entre elas? Acima de tudo: Dolores matou Vera, mesmo?

O roteiro do então inexperiente Tony Gilroy consegue prender a atenção em sua primeira parte ao estabelecer as peças do jogo (Dolores/Selena/Vera e o investigador que cuida do caso), mas, quando adentra no segundo ato, com os flashbacks tomando conta da história entre idas e vindas, falha justamente em sua resolução. Não que esse seja o mote principal. A morte de Vera mais parece um McGuffin que propriamente o tema do filme. O que importa é o tratamento dispensado pela mãe à filha, e vice-versa. Algo que só aos poucos o público começa a entender. A fotografia, um dos melhores aspectos do longa, acentua ainda mais esse distanciamento familiar. Se no passado, no flashback de 1975, as cores são mais quentes, retratando certa esperança no futuro, o presente é cinzento, azulado, frio, assim como as emoções das personagens, tão contidas, mesmo que prestes a explodir.

Justamente para retratar emoções tão conflitantes, Bates e Leigh são as melhores intérpretes possíveis dentro desse mundo gélido de meias verdades. Ambas submergem em Dolores e Selena, numa química perfeita de mãe e filha, mesmo que tão distantes emocionalmente. Elas refletem o eclipse total do título brasileiro e que também faz parte da trama num momento importante do passado – algo que só saberemos de verdade no clímax da história. Porém, não é apenas no aspecto psicológico que o texto original de King toca fundo. É nas diferenças sociais e de classes que tudo se perpetua. Da mãe caipira trabalhadora braçal que sempre teve de lutar para conseguir os mínimos trocados e sobreviver, à filha que nasceu nesse contexto, mas conseguiu subir na vida com os próprios esforços, por conta do intelecto e da ambição, além, é claro, da ricaça que nunca passou dificuldades na vida.

Talvez seja um dos enredos de Stephen King com menos cara de... Stephen King. Porém, seus dedos estão ali, a todo momento, mesmo que o suspense ou até o sobrenatural pareçam pouco se comparados ao que o escritor já fez. Só faltou ao diretor Taylor Hackford dosar melhor o esmaecimento da trama. O final apressado torna o desenvolvimento lento, como uma desculpa para preencher tempo e espaço. Uma armadilha que não desmerece o filme, mas faz pensar se ele não teria sido melhor conduzido com um pouco mais de cuidado.

Ainda com boas aparições de David Strathairn como Joe, marido de Dolores, e de Christopher Plummer como o obcecado detetive Mackey, Eclipse Total fala muito de machismo e feminismo através de suas protagonistas fortes e solitárias, que não precisam de homens ao lado para seguir seus rumos. É também através da voz delas que percebemos o quanto esse mundo é injusto com as mulheres, por mais grandiosas que elas sejam, deixando toda a culpa sempre cair pro lado do “sexo frágil”, se é que um dia assim poderia ser chamado.

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é crítico de cinema, apresentador do Espaço Público Cinema exibido nas TVAL-RS e TVE e membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista e especialista em Cinema Expandido pela PUCRS.
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