Em Nome De…
Crítica
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Sinopse
Adam é um padre católico que descobriu sua vocação como um servo de Deus com a idade relativamente tardia de 21 anos. Ele agora vive em uma aldeia na zona rural da Polônia, onde trabalha com adolescentes com problemas comportamentais que sofreram abusos. Ele recusa os avanços de uma jovem loira chamada Ewa, dizendo que ele já está comprometido. No entanto, o celibato não é a única razão para a sua rejeição. Adam sabe que deseja homens e que seu abraço do sacerdócio tem sido uma fuga de sua própria sexualidade. Quando ele conhece Åukasz, o filho estranho e taciturno de uma simples família rural, a abstinência auto-imposta de Adam torna-se um fardo pesado. Filme visualmente poderoso, carregada com imagens marcantes da Paixão de Cristo, se atreve a abordar o tema ainda tabu da homossexualidade no sacerdócio. Confrontado com os seus desejos proibidos, o protagonista experimenta momentos de felicidade e desespero. Um filme sobre emoções confusas, repressão e solidão – e a possibilidade de, talvez, encontrar-se depois de tudo.
Crítica
Esteticamente irretocável, a sequência que abre Em Nome De... exibe um grupo de garotos e seus jogos pueris. Quando as inocentes brincadeiras se tornam agressões contra o maior deles, que possui alguma deficiência intelectual, é possível pensar na lei do mais forte de Charles Darwin e seus investimentos contra o criacionismo. Considerando o argumento e ambientação do filme da cineasta polonesa Malgorzata Szumowska, que são essencialmente religiosos, esta pequena introdução é suficiente para revelar o posicionamento da realizadora e de sua obra ao tema que apresenta.
Numa pequena vila rural polonesa, o Padre Adam administra um centro de cuidados para garotos com problemas de comportamento. Ele prega o evangelho nas missas, ajuda os jovens na construção de uma nova sede e escapa das constantes investidas de Ewa, esposa de seu amigo Michal. No entanto, seus votos de celibato são colocados à prova quando ele percebe uma atração crescente por um simples rapaz da comunidade, que também parece nutrir uma afeição especial pelo pároco.
Adam se aproxima dos quarenta anos abnegando quaisquer vontades e estímulos em prol de sua missão pelo catolicismo – com exceção de algumas cervejas, um cigarro ocasional e a masturbação. Em Nome De... humaniza seu protagonista desde suas primeiras sequências, a partir de pequenas sugestões que explicitam os verdadeiros desejos deste. A empatia do espectador pelo personagem, no entanto, só será possível se o primeiro relevar os preceitos morais e católicos que demonizam qualquer pulsão sexual em alguém que dedica sua vida à igreja.
Representado magnificamente por Andrzej Chyra, conhecido pelo longa indicado ao Oscar Katyn (2006), de Andrzej Wajda, Adam carrega expressões angelicais em seus olhos azuis e cabelos louros cacheados, porém sua calvície e olheiras indicam a mácula em sua santidade. Quando ele tem o primeiro contato com o jovem Lukasz, seu deslumbramento é sutilmente retratado numa cena sublime em sua simplicidade: o rapaz, com seu fenótipo que remete a figura do Cristo de cabelos longos encaracolados e barba aparente, é apresentado num contra-plongée que o engrandece contra um céu azul e puro.
Malgorzata Szumowska, a partir de situações cotidianas e até mesmo banais, desenvolve habilmente as relações entre seus personagens. O centro de cuidados retratado no filme é concebido exclusivamente a partir daqueles que habitam o local e o mesmo serve para a cidadezinha rural; seus códigos e valores são os de uma sociedade parada no tempo. Neste cenário, o Padre Adam parece dividido entre paraíso e inferno, uma vez que sua fé e compromisso são testados constantemente com todos os jovens colocados sob sua responsabilidade e, a partir de uma visão deturpada, à sua disposição.
Indicado ao Urso de Ouro no Festival de Berlim, Em Nome De... recebeu na mesma ocasião o Prêmio Teddy, destinado a obras com temáticas homossexuais. Szumowska também recebeu o prêmio especial do júri da revista Siegessäule no festival, que viu em sua obra características contestadoras para tratar um tema tabu e confrontar a igreja católica com a homossexualidade de muitos de seus representantes.
O filme aparece num momento oportuno em que tais questões são amplamente discutidas, porém ainda refutadas pela instituição – como o documentário Mea Culpa: Silêncio na Casa de Deus (2013) já denunciou. Ainda que apresente muitos artifícios corriqueiros aos filmes que abordam romances entre homens, a última sequência de Em Nome De... não deixa qualquer dúvida de que a principal intenção de Szumowska com sua obra é a denúncia e crítica social, como já fez recentemente em Elles (2012).
Em Nome De... transmite tantas mensagens quanto sensações divergentes, que podem o qualificar como uma obra bonita, estranha ou ambígua, corajosa ou próxima demais da blasfêmia para alguns. Acima de quaisquer aspectos, no entanto, é inegavelmente impressionante e pungente.
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