Crítica
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Sinopse
Margot e Daniel se conhecem em um voo, acabam desenvolvendo uma conexão intensa e imediata. Ela, no entanto, decide reprimir a atração pois é feliz em seu casamento com Lou, um conhecido escritor de livros de culinária. A situação se complica quando descobre que Daniel mora em uma casa quase em frente a sua. Com o passar do tempo, uma série de encontros, inicialmente inofensivos, irão colocar em risco seu casamento e todo seu núcleo de amigos e familiares.
Crítica
Para entender Margot, a personagem de Michelle Williams em Entre o Amor e a Paixão, é preciso prestar atenção em algumas palavras que ela profere nos primeiros dez minutos do longa. Quando questionada porque ela finge ter um problema nas pernas para evitar as conexões no aeroporto, ela revela que tem medo destas. Não pela simples idéia de perder um voo, mas sim de se perder em si mesma entre duas viagens ou, apenas, por causa de uma escolha. Medo de ter medo. E para mostrar ao público como funciona a mente desta complexa mulher, Michelle entrega mais uma soberba performance neste novo filme de Sarah Polley.
A atriz, que foi indicada ao Oscar no mesmo ano por sua caracterização de Marilyn Monroe em Sete Dias com Marilyn (2011), trabalha com um personagem que até podemos dizer que a vimos fazendo antes. Em muitos aspectos, Margot é como a Cindy de Namorados Para Sempre (2010) – por sinal, papel pelo qual também foi indicada a vários prêmios. Casada há cinco anos com Lou (um surpreendente Seth Rogen), ela vive uma relação de amor com marido, mas que já teve seus dias de paixão avassaladora no passado. Agora os dois continuam sua parceria de forma mais tranquila, com as clássicas brincadeirinhas de quem se conhece há tanto tempo para dar uma apimentada vez que outra. Por sinal, é este mesmo período que também deixa qualquer casal acomodado e numa rotina estabelecida.
Trabalhando como escritora de catálogos de viagens, Margot conhece Daniel (Luke Kirby) em uma de suas inspeções em busca de inspiração para um novo projeto. A atração instantânea entre ambos é como qualquer paixão no início de um relacionamento: o medo aliado à força de conhecer os mistérios da outra pessoa, as implicâncias que se tornam motivo de intimidade, a vontade de querer ver o suposto novo amor a qualquer momento. O problema fica ainda maior quando os dois descobrem que são vizinhos de rua. E assim a personagem de Michelle Williams vai seguir uma nova rotina, cada vez mais querendo saber o quão verde é a grama do novo vizinho (com o perdão do trocadilho barato, mas é isto que acontece). Ao mesmo tempo, a culpa por querer se relacionar com outra pessoa e enganar o doce Lou também a consome. E aí o título em português do filme se justifica: afinal, Margot vai querer ficar com seu amor estabelecido de anos ou se entregar a esta nova paixão? O clássico dilema do “trocar o certo pelo duvidoso”.
Os personagens são, antes de tudo, humanos. Nenhum deles é condenável. Margot não prefere um ao outro pelo motivo do marido não a interessar mais. Talvez Daniel seja apenas uma novidade passageira. E, mesmo assim, a entrega dela vai acontecendo aos poucos, sem haver um beijo sequer. Aliás, esta é uma das perguntas que se faz ao longo do filme: afinal, Margot e Daniel vão selar a nova paixão com um beijo, uma noitada na cama ou qualquer coisa do gênero? A protagonista deste conto é uma mulher que fica indecisa ao ter que tomar uma decisão, mas nem por isso deixa de sentir remorso, visível nas expressões e no modo como Michelle a constrói: atente para a forma como ela conversa com o marido e, logo após, de forma completamente diferente (mas sem deixar de ser a mesma) com o quase amante. A explosão do que se passa em sua cabeça acontece de forma contida, transformando o que pode ser o rompimento de uma relação numa das melhores cenas agridoces dos últimos tempos. Simples e que emociona, mas sem ser forçada.
E é assim que a diretora e roteirista Sarah Polley trabalha sua história: de forma leve, mas não leviana. Para contar esta história que poderia, pode ou já aconteceu na vida de qualquer um, ela evita ao máximo os clichês do gênero. Se não ocorreu diretamente com o espectador sentado na sala do cinema, certamente algum amigo ou amiga já lhe confidenciou o mesmo problema. Sarah gosta muito de focar a câmera no rosto de seu elenco, o que proporciona uma ligação maior com o que vemos em tela. O público acaba participando da história como se estivesse conversando com os personagens do filme.
Para tal feito, também foi preciso convocar atores talentosos. Seth Rogen se despe daquela imagem de bonachão de filmes como Ligeiramente Grávidos (2007) e Pagando Bem, Que Mal Tem? (2008) e se entrega ao seu Lou, o marido eternamente apaixonado pela esposa. Luke Kirby também mostra seu amante como um personagem mais palpável, não caindo no simples arquétipo do sedutor que mexe com o tesão de mulheres casadas. E é surpreendente como a comediante Sarah Silverman consegue apresentar um personagem sério. No caso, a irmã alcóolatra de Lou.
Sarah Polley entrega mais uma obra sensível, assim como seu delicado Longe Dela (2006), nos fazendo esperar por mais histórias do cotidiano que sejam retratadas de forma autêntica como estas. A trilha sonora também proporciona uma metáfora ao que acontece na tela, com destaque para a clássica dos anos 1980 Video Killed The Radio Star, do The Buggles. A letra estabelece justamente a luta do novo se sobrepondo sobre o antigo. O que não é preciso pensar muito para associarmos ao triângulo amoroso de Entre o Amor e Paixão. Ao final, podemos até ter uma solução física para as escolhas de Margot. Porém, será que elas refletem o que a personagem realmente sente?
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Matheus Bonez | 9 |
Wallace Andrioli | 7 |
Leonardo Ribeiro | 8 |
Francisco Carbone | 8 |
MÉDIA | 8 |
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