Entreturnos
Crítica
Leitores
Sinopse
Beto (Paulo Roque) é um cobrador de ônibus casado com Gilda (Janaína Kremer), mas eles tem dificuldades para ter um filho. Beto acaba se aproximando de Leia (Lorena Lima), dona de um bar frequentado por ele. Quando um amigo de Leia, Valcir (Luis Miranda) começa a trabalhar no bar, um quadrado amoroso se forma, que resulta na gravidez de Leia. Para complicar ainda mais a situação, Leia tem um companheiro, Cardoso (Milhem Cortaz), que está em um presídio. Essa história ambientada nas cidades de Vitória e Vila Velha, no Espirito Santo, culminará em um acontecimento inesperado, que vai tranformar a vida de todos.
Crítica
Entreturnos revela no título o íntimo de sua proposta. Filme capixaba dirigido por Edson Ferreira, cuja filmografia tem se mostrado constante desde a estreia com documentário em curta-metragem Auroras de Ébano (2005), o longa passado em Vitória, Espírito Santo, bebe da mitologia das pessoas e histórias da cidade.
Beto (Paulo Roque) é o cobrador de ônibus a quem somos apresentados logo de início. Os turnos referem-se à escolha do estrato social, no qual os personagens comuns são privilegiados, homens da rua a preencher, inventar e moldar o espaço urbano como ponto de encontro e realização pessoal. Para reproduzir o vigor do ambiente, a câmera de André Lavaquial estará em busca do mais cru dos registros, quando qualquer contraste terá como resultado a epifania de uma quase redenção – a qual, por ordem de corresponder à realidade, jamais será completa.
Por outro ângulo, turnos também é o aspecto formal escolhido pela direção para contar a trama. Beto frequenta o bar comandado por Leia (Lorena Lima) e Valcir (Luis Miranda). Quando o protagonista envolve-se com Leia, veremos formado um triângulo de relações que, com o tempo, ganhará a inclusão de Gilda (Janaína Kremer), esposa do cobrador. O conteúdo dramático orbitará entre violência e sexo, dando à busca pessoal dos personagens a trajetória de um épico remodelado.
No momento em que Ferreira opta por contar a relação a partir do ponto de vista dos personagens, Entreturnos se configura como um filme de olhares. Demarcada a partir de um momento central no roteiro, a opção generosa de modificar a vista é interessante, e consegue ser realizada com competência. O revés primeiro, no entanto, passa pela repetição da base dramática que, se inevitável por se tratar de uma teia de relações, acabou agravada com a inserção de Gilda.
Bem articulado, o roteiro assinado pelo diretor junto a André Félix entrega ao público às demandas dos personagens em uma crescente que ajuda a manter a trama. Nada se demostra mais eficiente, porém, do que o empenho dos atores. Ao compreender a maneira orgânica com que deveriam atuar, o quarteto passa ao lado do equívoco de encenações artificiais – o que não é um problema, mas estaria a serviço de outro registro estético – e emolduram a naturalidade
O recorte de Entreturnos ocupa um espaço pouco explorado na cinematografia brasileira contemporânea. Voltado para um discurso de denúncia social ou para o de personagens especiais e estranhos, o cinema nacional vê a obra de Ferreira contemplar com bastante competência uma abordagem que nos remete à literatura brasileira naturalista e à produção cinematográfica dos vinte anos do período Embrafilmes. Dessa forma, Ferreira recoloca o homem comum no seu espaço, extraindo sem medo o que há de melhor – e pior – em tal horizonte.
Deixe um comentário