Crítica
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Sinopse
Em 1959, o agente intergaláctico WA4 é preso por fazer um loteamento ilegal. Como pena, ele é lançado no espaço e recebe uma missão: vir para a Terra e matar o presidente da República, Juscelino Kubitschek, no dia da inauguração de Brasília. Sua nave se perde no tempo e aterrissa em 2016, em Ceilândia. Essa é a versão contada por Marquim do Tropa, ator e abduzido. Só Andreia, a rainha do pós-guerra, poderá ajudá-los a montar o exército para matar os monstros que habitam hoje o Congresso Nacional.
Crítica
Principalmente em virtude do excepcional Branco Sai, Preto Fica (2014), o cineasta Adirley Queirós foi celebrado como uma das vozes mais criativas surgidas na recente cena cinematográfica brasileira. Portanto, era de se imaginar que seu trabalho seguinte, Era Uma Vez Brasília, chegasse cercado de expectativas. Não é o caso de dizer, porém, que o possível excesso de esperança depositada neste novo trabalho tenha deposto contra a sua fruição. Desta vez, o realizador aposta numa via bastante distinta, mais contemplativa, embora, de certa maneira, ancorada na necessidade de fazer referência constante aos signos de seu filme mais elogiado. Temos um fiapo de trama, que dá conta de WA4 (Wellington Abreu), agente intergaláctico enviado de um planeta distante para matar o presidente Juscelino Kubitschek no dia da inauguração da nova capital federal. Passamos tempo demasiado dentro da nave com esse homem à deriva nas sendas do espaço e do tempo, do que decorre um enfado que persiste ao longo da projeção.
Adirley parece mais interessado em deter-se nas evidências de sua cenografia singular, calcada na reciclagem de materiais cotidianos para construir uma ambiência de ficção científica terceiro-mundista, que necessariamente em fazer a história avançar ou permitir que os temas tratados rompam a camada grossa de esteticismo que recobre a encenação. Não são esparsas as tomadas longas de Era Uma Vez Brasília, nas quais pouca coisa efetivamente acontece. O olhar perdido das pessoas, a sobreposição de elementos que atuam em falso tentando configurar um caos oriundo da situação sócio-política brasileira, são alguns dos fortes indícios de um vazio que se instaura inapelavelmente até asfixiar o todo. Marquim do Tropa interpreta um homem que divide seus dias entre perambulações por uma Brasília despersonalizada, shows de rap totalmente inócuos enquanto produtor de sentidos e a interação artificial com a ex-encarcerada vivida por Andreia Vieira, supostamente importante.
O que mais incomoda é perceber a prevalência da cenografia sobre a dramaturgia. No que concerne especificamente ao âmbito do texto, só existe alguma representatividade quando o cineasta utiliza trechos de áudios reais, respectivamente, da ex-presidenta Dilma Rousseff se defendendo das acusações de irresponsabilidade administrativa, dos parlamentares justificando o voto pelo afastamento dela e, mais adiante, do discurso de posse de Michel Temer. Todavia, justo nesses momentos em que a realidade entrecorta a ficção para potencializar seu alcance, não há um complemento imagético que sustente satisfatoriamente a combinação. Adirley prefere construir belos planos, sequências geralmente estáticas que prestam apenas por seu senso de plasticidade. Aliás, a inércia aparentemente proposital, a falta de dinamismo resultante desse itinerário predisposto a colocar o aspecto visual acima dos demais, é uma das maiores responsáveis por tornar penosa a sessão de Era Uma Vez Brasília.
Pretensamente protagonista do filme, WA4 praticamente some a partir do instante em que cai na Terra acidentalmente numa linha temporal errada. Ele já encontra Brasília submersa na roubalheira, marcada por escândalos sucessivos da classe política. Entretanto, sua presença estranha e estrangeira não é aproveitada, já que ele se torna quase um figurante de luxo em meio à valorização superficial dos personagens de Marquim do Tropa e Andreia Vieira, representantes de um povo insurrecto. Era Uma Vez Brasília é, no fim das contas, uma grande decepção. A proposta estética continua sendo um dos focos de interesse, contudo, sua inclinação por sobrepujar totalmente os componentes que a ela deveriam se aliar em prol de uma narrativa contundente, que misturasse a fantasia e o cotidiano periférico de forma fértil, acaba por reduzir a densidade do saldo, bem como a capacidade de fazer do pouco, muito. É como se alguém, deslumbrado com o olhar de Adirley Queirós, o copiasse, mas sem êxito, aspirando a uma grandeza que não chega.
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