Crítica
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Sinopse
Henry Spencer tenta sobreviver ao ambiente industrial em que trabalha. O cenário caótico também contempla uma namorada de gritos insuportáveis e seu filho mutante recém-nascido.
Crítica
Mas, afinal, o que é Eraserhead? Ou quem, talvez fosse melhor perguntar? Seria um personagem, uma coisa, uma sensação, algo a ser conquistado ou desprezado? Vindo de David Lynch, pode ser tudo isso, um pouco mais, ou talvez nada do que foi apontado aqui. Sabe-se, no entanto, que este é, muito provavelmente, o mais próximo que o cinema já chegou de um pesadelo. Perturbador, intenso, problemático, selvagem, violento e irremediável são algumas das palavras possíveis de descrevê-lo, ainda que nenhuma consiga fazê-lo por completo. Uma ópera visual, com imagens tão fortes quanto calculadamente apropriadas, que vasculham sentimentos do passado e temores pelo futuro, arrasando conceitos fundamentais e revendo o óbvio através de uma ótica avassaladora, até cometer o mais grave dos pecados e isentar o pecador do ato, como se fossem duas partes de um todo tão amplo quanto desconexo – ou não. Um filme essencial, porém decididamente para poucos.
Trabalho de estreia de Lynch, Eraserhead levou quase oito anos para ficar pronto. Realizado a partir do momento que o cineasta ingressou no American Film Institute para iniciar seus estudos de Cinema, contou com o entusiasmo de alguns colegas da época, no começo da década de 1970, e com uma verba providencial fornecida pelos programas de estímulo da entidade. No entanto, a inaptidão do diretor em se adequar aos formatos mais tradicionais da produção cinematográfica impediram um cálculo mais específico, e logo o dinheiro acabou. Foram precisos apoios fundamentais e inesperados – como da atriz Sissy Spacek, que ao tomar conhecimento do projeto se tornou uma entusiasta – e muita perseverança para que, após quase uma década, ele se fosse, enfim, finalizado. E o resultado, tal qual se apresenta, segue tão poderoso quanto no momento de sua estreia.
Henry Spencer (Jack Nance, um dos atores fetiches de David Lynch) vive, literalmente, com a cabeça nas nuvens – ou na lua, para ser mais apurado. Sua vida é despreocupada, ocupando-se apenas com o trabalho entediante ou com interações ocasionais com vizinhos. Até que uma namorada surge com uma novidade: ela não só esteve grávida, como a criança já nasceu e precisa dele. Os dois se mudam para sua casa, e de uma hora para outra tudo muda. Mas nada é tão simples. Os elementos imagéticos estão dispostos por todo o filme, e cabe ao espectador decidir como lê-los. Há o asteroide perdido no espaço, o homem deformado que tudo observa como se manipulasse cada atitude a seu bel prazer, e a Marilyn pós-apocalíptica de bochechas enormes que insiste em afirmar que “no céu tudo dará certo”. Basta acreditar.
As estranhezas não são apenas incógnitas, mas também alegóricas. O bebê, filho do protagonista, é um mutante quase amorfo que tudo que faz é chorar. A esposa é insegura e desagradável, a sogra é ninfomaníaca e o sogro parece não se dar conta do que preparou para jantar. Ligando estes pontos aparentemente aleatórios está Spencer, que busca apenas sobreviver. Lynch faz de seu protagonista um exemplo da crise do crescimento. O jovem se torna adulto, mas recusa com apatia a nova condição que lhe é imposta. A mulher deve ficar, mas se quiser ir, que não o aborreça. A paternidade é um mal a ser corrigido, e o sexo é sujo e quase incestuoso. Nada parece estar no lugar certo. Para entendê-los, é necessário o esforço de se colocar no lugar do personagem principal. Afinal, é ele que está vivendo cada sequência explorada, independente da ordem em que são apresentadas. E se para ele faz sentido, seja no campo onírico ou real, nada mais precisa ser justificado.
Eleito certa vez um dos “25 longas mais perigosos de todos os tempos”, Eraserhead chegou a ser apontado como o filme favorito de nomes como Charles Bukowski, John Waters, Mel Brooks, George Lucas, Terrence Malick e Stanley Kubrick. Absurdamente à frente do seu tempo, foi influência definitiva para O Iluminado (1980) e segue marcando gerações de cineastas. Na obra do próprio Lynch, por exemplo, seus reflexos são ainda mais evidentes, passando por títulos como Veludo Azul (1986) e indo até Império dos Sonhos (2006), seu último trabalho exibido nos cinemas até então. Questionado sobre o que trata seu filme, o cineasta sempre se recusou a versar a seu respeito, dizendo que as teorias que cada espectador formula após vê-lo são muito mais interessantes do que uma explicação objetiva. Afinal, o cinema raras vezes foi tão experimental. E, dessa forma, cabe a cada um depreender seu próprio significado.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Robledo Milani | 8 |
Matheus Bonez | 9 |
Jorge Ghiorzi | 8 |
Marcelo Müller | 10 |
Francisco Carbone | 10 |
Filipe Pereira | 10 |
MÉDIA | 9.2 |
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