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Sinopse
Renomada guardiã legal, Marla cuida de pessoas idosas e ricas, e às custas destas leva uma confortável vida de luxos. Depois de achar que tinha encontrado a vítima perfeita, começa a entender que seu novo alvo guarda segredos perigosos.
Crítica
Em tempos como os atuais, com dezenas de títulos sendo literalmente despejados todos os dias nas mais diversas plataformas de streaming disponíveis no mercado, encontrar um filme que realmente consiga prender a atenção não é uma tarefa das mais fáceis. Da mesma forma, uma vez dado o ‘play’, ficar conectado com a história a se desenvolver na telinha, independente dos chamados nos smartphones, tablets, telefones ou mesmo qualquer outra distração caseira, requer uma habilidade singular. Pois é o que se encontra em Eu Me Importo – isso, ao menos, durante os dois terços iniciais da trama. Uma vez conquistada a atenção da audiência, porém, o diretor e roteirista opta por desprezar esse feito, decidido a seguir como se o jogo já estivesse ganho, ignorando que o fim só se dá quando os créditos começam a subir – e que, até lá, tudo pode mudar, seja por uma decisão apressada, um receio infundado ou uma segurança inexistente. Experiências essas também verificadas por aqui.
A Marla Grayson de Rosamund Pike é uma personagem deliciosamente diabólica. A trama criada por J Blakeson começa com um depoimento em off da protagonista, através do qual deixa claro que, na visão dela, o mundo se divide entre caças e caçadores – e que está determinada a fazer parte do segundo grupo. E assim se comporta dia após dia, explorando ninguém menos do que velhinhos indefesos – parece piada pronta, mas é dessa prática que construiu uma profissão. Seu escritório atua se responsabilizando por idosos que não possuem mais condições de cuidarem de si próprios. São dezenas de senhores e senhoras sozinhos no mundo, que não tem quem os alimente, organize os horários dos remédios ou garanta suas seguranças. Assim, ela assumiria essas funções, redirecionando-os à casas de repouso de confiança e lidando com as finanças relacionadas. Tudo isso, é claro, amparado por ações legais.
Seria uma incumbência bonita – e, até mesmo, admirável – não fosse um simples golpe vigarista. Em conluio com uma médica desonesta – que atestaria uma suposta incapacidade de seus pacientes, sem que, de fato, essa procedesse – e o gerente ganancioso de um asilo mais preocupado em entupir seus residentes com drogas ao ponto de torná-los apáticos, ao invés de atentar para o bem estar dos mesmos, Marla consegue assumir o controle da vida dessas pessoas, ingerindo em seus ganhos e posses, ao mesmo tempo em que as mantém distante de tudo e todos – inclusive conhecidos e familiares (quando esses existem, é claro). Na primeira meia-hora de Eu Me Importo o modus operandi dela fica evidente através de sequências didáticas e protestos de um dos diretamente afetados, a ponto de colocar qualquer um na audiência nos nervos. Afinal, a identificação é imediata: e se ela estivesse fazendo aquilo com você, como reagiria diante de tamanho absurdo?
Pois bem, é o que acontece quando cruza o caminho da sra. Jennifer Peterson (Dianne Wiest, que tem poucos – mas intensos – momentos de brilho, fazendo jus aos dois Oscars que possui em casa). Quando essa é tirada de circulação, tal desaparecimento desperta a curiosidade – e a ira – de Roman Lunyov (Peter Dinklage, genial com o tipo que lhe é oferecido), cuja ligação com a vítima é um mistério. Ele passará a agir em sua defesa, enviando emissários, advogados e até capangas para libertá-la dessa prisão. Mas Marla não é fácil de ser convencida do contrário de suas intenções. Assim, tem-se o início de um duelo entre dois titãs, cada um em sua área. Pike desperta repulsa e ódio, mas logo se torna também refém do próprio ego. Quando encurralada, não é raiva que sente – é admiração pelo outro, que soube ganhá-la numa rixa que acreditava ser mestre. Com isso, aprende o suficiente para que, no próximo passo, esteja melhor preparada.
No melhor papel de sua filmografia desde Garota Exemplar (2014) – que lhe valeu sua única (ao menos até agora) indicação ao Oscar – Rosamund Pike deixa claro estar se divertindo ao criar um tipo tão desprezível quanto hipnotizante. Porém, quando uma figura como essa está no centro da ação, há apenas dois caminhos a serem seguidos: após se dar bem na maior parte do tempo, ela precisa, enfim, pagar pelos seus pecados, como toda boa e velha vilã da Disney já ensinou; ou, por outro lado, terminar ainda mais por cima, mostrando que, de fato, o crime pode, sim, compensar – como novelas como Vale Tudo (1988) ou Belíssima (2005) tão bem exemplificaram, refletindo o que muitas vezes se dá na vida real. Falta a Blakeson – responsável por catástrofes como A 5a Onda (2016), que dirigiu, ou Sequestrando Stella (2019), que roteirizou – coragem para assumir um caminho ou outro, restringindo-se a ficar em cima do muro, acenando tanto para um lado, quanto para o outro. E, quando nada mais parecia possível, ele ainda tira um coelho do fundo da cartola, completamente aleatório, para oferecer um desfecho penalizante, mas nada condizente com o caminho tomado até ali. Um balde de água fria, como se vê, bastante aquém das possibilidades levantadas até aquele instante.
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