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Crítica


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Sinopse

Matteo e Ettore são irmãos com vidas distintas e não muito próximos. Enquanto o primeiro é um empreendedor carismático, o segundo leva uma vida simples na cidade onde nasceram, trabalhando como professor. Após um evento traumático, os dois começam a viver juntos em Roma. A situação faz com que trabalhem suas diferenças, possibilitando o nascimento de uma ligação genuína entre eles.

Crítica

Atriz de sucesso, com livre trânsito em Hollywood (estrelou o oscarizado Rain Man, 1988) e duas vezes premiada no Festival de Veneza e outras duas no David di Donatello (o Oscar italiano), Valeria Golino também não pode ser considerada uma novata no âmbito da direção – o primeiro longa que assinou, o drama Miele (2013), colecionou louros por mais de duas dezenas de festivais, inclusive em Cannes. Cinco anos se passaram e agora ela está mais uma vez atrás das câmeras com o igualmente dramático Euforia, que também passou pelo prestigioso evento na Riviera francesa e lhe garantiu nada menos do que oito indicações ao David, inclusive a Melhor Filme e Direção. A mudança, no entanto, está no foco do olhar: sai o universo feminino que a cineasta tão bem explorou anteriormente, para se focar na relação de dois irmãos, um à beira da morte. A troca pode ter servido como estímulo para ela, mas não é feita sem alguns tropeços em cena.

Matteo (Riccardo Scamarcio, mais uma vez vivendo um personagem homossexual com bastante sensibilidade, assim como fizera em O Primeiro que Disse, 2010) é o filho perfeito, porém distante. Publicitário de sucesso, mora numa bela casa na cidade, tem muitos amigos e todos os luxos e conforto possível. Ettore (Valerio Mastandrea, de Belos Sonhos, 2016), por outro lado, foi o que ficou na casa da família, no interior, e sempre levou uma vida mais acomodada. Professor, casou cedo com a primeira namorada e, com ela, teve um filho. Num primeiro momento, é o mundo desse que começa a naufragar, quando recebe a notícia de estar com câncer. Separado, está morando com a mãe e mal tempo tem para cuidar da criança. Os dois, no entanto, são irmãos. E quando o caçula recebe a notícia sobre o que está se passando com o mais velho, decide fazer tudo ao seu alcance para ajudar. Mesmo que aquilo que lhe é possível de imediato não faça muita diferença no destino do outro.

Pois veja bem, a dualidade que Golino estabelece entre os dois, através do roteiro escrito por ela própria, em parceria com Valia Santella (Mia Madre, 2015) e Francesca Marciano (Eu e Você, 2012) não chega a ser a mais elaborada: um é rico, o outro é pobre; um é expansivo, o outro tímido; um é amoroso, o outro é carrancudo; um está vivo, o outro prestes a morrer. É curiosa a inversão, no entanto, de que aquele com dias contatos não seja o irmão gay, e sim o heterossexual (mais um jogo de inversos). Se nesse ponto a trama consegue escapar do clichê recorrente, nos demais o interesse está em observar até quando os opostos irão se sustentar. Sim, pois Matteo vai buscar Ettore e o leva para morar consigo, prometendo os melhores tratamentos. Há anos não ficavam juntos. Agora, estarão mais próximos do que nunca, talvez desde a infância que compartilharam. E se a distância havia sido eficaz em evitar que a frágil relação deles sucumbisse, agora ambos precisarão descobrir como reinventá-la.

A euforia a qual o título se refere – e esse já era o batismo original – está menos ligada a uma busca dos verdadeiros valores da vida (algo que, diante de uma morte anunciada, pode ser tão clichê quanto desnecessária) e mais em função do que de fato liga estes dois homens, um com o outro. São uma mesma família, mas nunca amigos. A tragédia eminente os colocou lado a lado, e como dois estranhos, passarão a aprender como cada um enxerga a si e aos demais. A namorada distante, o flerte de cada noite, a relação com o filho, como se portam com a mãe, o que pensam do trabalho: pequenos detalhes, mas o próprio material do qual é feito o tecido social, aquele que tanto falta entre eles. Valeria Golino não quer discutir doenças ou vitórias: ela demonstra, desde o começo, estar mais interessada na humanidade de cada um destes personagens, e é justamente aí em que reside o maior mérito do seu filme.

Dono de uma história que fala de pessoas – e para pessoas – Euforia é, acima de tudo, um conto sobre os tempos em que vivemos. E se mesmo assim tais estereótipos acabam sendo explorados – aquele com todos os bens materiais, sofre de solidão e carência, assim como o que enfrenta uma luta diária para seguir adiante, tem mais com o que lidar dentro de si do que com o que se passa ao seu redor – eles surgem como ferramentas para um discurso superior, de fraternidade e aceitação. São humanos, repletos de falhas e alegrias, tristezas e acertos. E será justamente esse conjunto que fará, do banal, algo acima do esperado. Um acerto de pequenos detalhes, que resulta em um conjunto maior do que a soma das suas partes.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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Grade crítica

CríticoNota
Robledo Milani
7
Francisco Russo
6
MÉDIA
6.5

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