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Sinopse

Três amigas inseparáveis vivem seus cotidianos num cenário paradisíaco da Bahia.

Crítica

Antes de começar a ação de Fala Sério!, retorno do cineasta Augusto Sevá ao litoral da Bahia, ambiente que ele havia explorado em seu longa anterior – Estórias de Trancoso (2007) – alguns letreiros são exibidos na tela. Ali é explicado que o roteiro do filme surgiu a partir de um processo colaborativo entre os moradores e turistas, que relataram histórias pessoais vividas na região e com isso foi elaborado um material ficcional. Também fica claro que foram realizadas oficinas de atuação para a seleção do elenco, formado (quase) inteiramente pelos habitantes locais, sem nenhum tipo de experiência prévia. Uma vez que a obra começa, no entanto, esses avisos perdem o caráter informativo e se transformam em um alerta preocupante. Afinal, é tudo tão amador que é de se perguntar a quem ele deve interessar além dos diretamente envolvidos em sua realização?

Daia (Naiara Carvalho), Mônica (Mônica de Oliveira) e Lê (Luciana Louvadini) são três amigas que vivem em Trancoso, cidade que desperta atenção e curiosidade de visitantes de todo o país (e também do exterior), mas cuja estrutura própria é bastante precária. Isso se reflete nas condições de quem ali mora – elas próprias, portanto. São adolescentes, frequentam a escola e lidam com suas famílias disfuncionais – a maioria é filha de mães solteiras. E tal qual o exemplo que possuem em casa, parecem condenadas a repetir o erro: na primeira oportunidade que lhes aparece, se envolvem e engravidam de imediato. Métodos contraceptivos, portanto, são elementos inexistentes em suas realidades.

Logo vemos as três já mães, envoltas em relações infelizes com os pais das crianças. Uma luta para que o ex-amante reconheça a filha, as outras duas estão morando com os namorados/maridos, porém já não lhes despertam atenção – ambas estão sendo traídas. O tempo vai passando, separações inevitáveis acontecem, novos namoros começam. Surgem intervenções externas, como juízes, advogados e até empregadores que as introduzem no mercado profissional. Nada, no entanto, parece ter muita consequência. Seus únicos objetivos, além de darem continuidade a uma amizade que mais parece força do meio, é se arrumarem com o homem que escolheram, seja retomando os relacionamentos iniciais ou descobrindo novos amores. Os frutos dessas uniões, ou seja, os filhos, são apenas notas de rodapé sem maiores influências ou repercussões.

Sevá é um realizador das antigas, que atua também como roteirista, editor, câmera, compositor e produtor. Ou seja, no estilo dos self made men, que abraçam todas as frentes. E quando o esforço é demais, poucas vezes o resultado fica à altura do investimento, pois sem foco é difícil atingir a excelência. Exatamente como vemos em Fala Sério! (aliás, qual o motivo desse título? Será que alguém consegue explicar?). Das interpretações aos enquadramentos, do argumento narrativo às condições técnicas, é tudo tão primário que a impressão que se tem é a de se estar diante de uma produção colegial, mais ou menos como aquelas que nós mesmos fizemos nos tempos de escola. Um bom exemplo é perceber os atores fazendo os mesmos personagens durante todo o filme, sem a menor preocupação em figurinos, maquiagem ou direção de arte, ainda que a trama abranja um período de mais de dez anos.

Fala Sério!, no entanto, não é ruim apenas por isso. Seu maior problema é simplesmente não oferecer condições para que o debate que propõe se desenvolva a contento. A própria abordagem dos temas mais polêmicos – gravidez na adolescência, falta de condições para que destinos turísticos formem profissionais à altura de suas necessidades, formação de novas estruturas familiares, violência doméstica – são absolutamente superficiais, sem embasamento, nem profundidade. O espectador, ao passar pelo filme, pouco absorverá, distraído pelas carências da produção e pelos clichês e obviedades perseguidos pelo realizador. Assim, tem-se uma experiência que talvez sirva de incentivo para que aqueles que aqui estão começando artisticamente – afinal, trata-se de uma obra de entretenimento – decidam ir além, aprimorando-se no longo caminho que possuem pela frente. De qualquer forma, triste mesmo é perceber a participação discreta de Vinícius de Oliveira, o menino que começou sua carreira ao lado de Fernanda Montenegro e Marília Pêra no oscarizável Central do Brasil (1998), tendo que se virar hoje em dia em projetos como esse.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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