Crítica
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Sinopse
Um homem e uma mulher se reencontram e constroem uma vigília por um grande e extraordinário acontecimento que os arrebatará. A vida passa enquanto especulam sobre de quê é feita esta Fera à solta nesta Selva do interior paulista.
Crítica
Primeiro nasce a letra, que depois decide se aventurar pelo palco e, enfim, chega à tela. Assim tem sido a trajetória de A Fera na Selva, longa que marca a segunda incursão por trás das câmeras de Paulo Betti, um dos mais reconhecidos atores brasileiros. Inspirado pelo livro homônimo de Henry James, que foi levado ao seu conhecimento muitos anos antes por sua então esposa, a atriz Eliane Giardini, esse texto foi experimentado pelos dois, primeiro, como teatro. Duas décadas depois, eles voltam a se reunir mais uma vez em cena, porém agora no cinema. E o resultado, se não é para todos, ao menos deixa evidente as intenções nobres que nortearam esse processo, assim como a inegável paixão dos realizadores pela mensagem aqui defendida.
Assim como em Cafundó (2007), no qual a função de diretor foi dividida com Clovis Bueno, Betti mais uma vez abre mão do isolamento autoral em A Fera na Selva, chamando à colaboração não apenas o seu diretor de fotografia, como no exercício anterior, mas também a sua colega de cena – e, enfim, a grande motivadora por trás de todo o projeto. Assim, temos um filme feito por seis mãos: Betti, Giardini e Lauro Escorel. E se tantas vozes no comando poderiam resultar numa falta de norte, o que se vê é justamente o contrário. Nem os próprios envolvidos tinham consciência dos rumos assumidos – a verdade é que Giardini e Escorel realizaram uma direção “instintiva”, e só foram notificados que receberiam os créditos principais no final do processo. Justiça que também se percebe no alinhamento destes profissionais.
João (Betti) está em meio a um passeio turístico quando reconhece, na mesma situação que ele, Maria (Giardini), mulher que havia conhecido anos antes, em circunstâncias bem similares. O diálogo estabelecido entre eles a partir desse instante é repleto de reminiscências, de ambas as partes. “Estávamos em um navio, e o dia estava nublado?”, ele questiona. “Não, era um pequeno barco, e o céu reluzia azulado”, ela replica. “Você estava sozinha, e conversamos por horas”, ele insiste. “Estava com minha mãe e irmão, e mal nos cumprimentamos”, ela se resigna. O homem, simplesmente, não se lembra de detalhes além da presença dela. A mulher, por sua vez, deixa evidente o quanto aquele encontro, ainda que breve, lhe foi marcante.
Essa retomada de contato logo passa a ser constante, quando os dois se veem juntos na mesma escola – ele, como o “velho professor de português”, ela, como a “nova professora de literatura”. A vida pacata, de cidade do interior, é interrompida por uma determinação dele: “não posso tomar alguma decisão, pois tenho certeza que algo extraordinário ainda há de acontecer comigo, e preciso estar à espera, pronto para quando esse dia chegar”. A imobilidade dele se revela na insatisfação dela. Primeiro, há compreensão. Depois, questionamento. Por fim, indignação. Ao esperar um momento único, ele deixa passar uma vida toda. E o triste é que apenas ele não percebe isso. Não o quão desnecessário pode ser aguardar por algo incerto que talvez nem se concretize. E não ter olhos para reconhecer aquilo que já está na sua frente, o raro e incrível que se desenrola diante dele, mesmo sem seu conhecimento. A ignorância, como se percebe, também pode ser um estado de espírito.
Paulo Betti e Eliane Giardini foram casados durante anos. Ao se reunirem deixam claro a química que ainda possuem. A Fera na Selva é quase inteiramente os dois juntos, conversando sobre suas existências, durante o desenrolar dos anos. Ainda que a referência mais imediata pareça ser Cópia Fiel (2010), Betti afirma ter se inspirado de fato na trilogia Céline & Jesse, vividos por Julie Delpy e Ethan Hawke. Não há como discordar do realizador, por mais que seu filme se ressinta da ausência da discussão pop dos filmes de Richard Linklater, muitas vezes optando por um viés mais filosófico e menos concreto, como na obra de Abbas Kiarostami. Melancólico, é um filme assumidamente teatral, e por isso mesmo exagera-se em sentimentos que, de forma mais natural, poderiam ser melhor assimilados pelo público. Ainda assim, longe de ser cinema em estado pleno, é dono de elementos que não podem ser ignorados, e por mais turbulentos que cheguem até o espectador, revelam-se válidos da jornada pesarosa que empreendem. Difícil, mas nunca irrelevante.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Robledo Milani | 6 |
Cecilia Barroso | 3 |
MÉDIA | 4.5 |
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