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Crítica

Marco (Alejando Awada), protagonista de Filha Distante, se desloca de Buenos Aires até a Patagônia, um dos endereços turísticos mais procurados da Argentina, para duas coisas: rever a filha e pescar. Não parece haver qualquer entrave para ambas as tarefas. Contudo, o primeiro indício de que a realidade muitas vezes teima em contradizer os prognósticos é o tipo de pescado que Marco procura e como ele se prepara para a tarefa. Não há como fisgar tubarões com um molinete que, forçando bastante a barra, serviria apenas para tirar do mar alguns peixes de pequeno porte. Nessa aparente ingenuidade, tratada como algo sem importância inicialmente pelo diretor Carlos Sorín, está, porém, um traço essencial da personalidade desse homem que também enfrenta dificuldades para lidar com as pessoas, talvez e, sobretudo, com aquelas que lhe são mais próximas, por exatamente não saber como, por inabilidade.

Devagar, sem muito alarde, o filme se desenrola, assim, em velocidade contrária a dos ventos que sopram sem trégua no território turístico que lhe serve de cenário. Marco é bem recebido no hotel e seu único contratempo para encontrar a filha é o fato de ela ter se mudado sem deixar o novo endereço, isso resolvido com uma chamada na rádio. Na seara da pesca, a falta de jeito se conserta com treino. Sorín nos leva a crer que o protagonista pode, sem tanto esforço, obter sucesso em suas duas empreitadas, a despeito dos pequenos problemas do começo. Contudo, sob as aparências, em Filha Distante há uma tensão de forças, o amor de um lado e o ressentimento do outro, como se a maré se recusasse a obedecer a direção do vento.

Até aí, temos a impressão de apenas acompanhar um homem, que como tantos outros já registrados pelo cinema, resolve mudar de vida após ter a saúde abalada. O encontro inicial com a filha é exemplar de que tipo de cinema pratica Carlos Sorín, um cinema cuja fundação não está nos rompantes emocionais, na saturação de qualquer elemento que busque uma resposta mais fácil do público. Com um pouco de atenção, percebemos que a camada de cordialidade entre pai, filha e genro é bastante frágil, que por debaixo de toda aquela hospitalidade a filha guarda uma mágoa profunda daquele pai que agora volta depois de muito sem vê-la. Mas é durante uma música, cantada em alusão ao passado, que as dores de antes retornam numa torrente de violência dissimulada, contida pela mulher em olhos marejados de profunda melancolia. Uma cena tão sutil quanto forte.

Sem chamar atenção demasiado para seu estilo, o diretor Sorín se incumbe basicamente de moldar o tempo e trabalhar a interação do protagonista com um meio aparentemente pacato, mas severamente hostil na essência. Tanto a filha relutante em perdoar os erros do passado, quanto o mar que lhe embrulha o estômago durante a tentativa de pescar tubarões, são obstáculos que ele precisa transpor para, de fato, começar vida nova, abrandando, quem sabe, a culpa de ter feito sofrer seus próximos. Filha Distante é minimalista, investe todas as suas fichas na assimilação por parte do espectador das intenções de um protagonista simpático justamente por suas falhas, pela humanidade que transborda da tentativa de diminuir certas feridas abertas na época do alcoolismo. Marco é apenas mais um querendo andar com certa retidão depois de ter percorrido por muito tempo os caminhos tortuosos.

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