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Sinopse

Bahar é a comandante das Filhas do Sol, um batalhão composto apenas por mulheres curdas que atua ofensivamente na guerra do país. Ela e as suas soldadas estão prestes a entrar na cidade de Gordyene, local onde foi capturada uma vez no passado. Mathilde é uma jornalista francesa que está acompanhando o batalhão durante o ataque. O encontro entre as duas mulheres, dentro do cenário caótico que as cercam, irá mudar a vida de ambas.

Crítica

A guerra é um cenário geralmente associado ao masculino. Todavia, em Filhas do Sol a cineasta Eva Husson oferece duas perspectivas femininas à observação de um conflito no Curdistão. Mathilde (Emmanuelle Bercot), jornalista tarimbada, é acostumada a transitar entre escombros e a se esquivar de projéteis e minas. Ela é a testemunha, aquela que, além da câmera, carrega as marcas do trabalho. Já Bahar (Golshifteh Farahani), a líder do batalhão de mulheres, combatente feroz que investiga locais em busca do filho sequestrado, toma à frente das iniciativas, expondo a importância da maternidade como vínculo essencial (motriz) à determinação de seguir em frente. Ambas são mães e tem lá as suas similitudes, a despeito dos mundos bastante diferentes em que vivem. Uma pena que infelizmente tais potenciais são diluídos em meio a uma narrativa solene, beirando o frio, incapaz de quebrar a fina casca que reveste tudo de superficialidades contraproducentes.

O que Filhas do Sol tem de mais potente é a capacidade de esquadrinhar o feminino nesse contexto dominado por machos. Elas sofrem toda sorte de infortúnios, ainda mais numa circunstância como aquela em que a força bruta, supostamente um predicado deles, é determinante para que vitórias sejam conquistadas. A realizadora permite que, gradativamente, Mathilde perca importância, sobretudo quando a trama se bifurca entre presente e passado, este desvelado por meio de flashbacks extensos e demasiadamente explicativos. Ao invés de utilizar a transição cronológica para adensar o drama da protagonista curda que relembra a senda de reveses, Eva faz do olhar retrospectivo apenas uma instância para demonstrar do que Bahar é feita, porque age com tamanha fúria diante dos inimigos. Esse percurso didático se encarrega de fornecer informações, mas, em virtude de seu simplismo, acaba arrefecendo as personalidades sobressalentes nesse drama moroso e reiterativo.

Golshifteh Farahani coloca à disposição da personagem a expressividade contumaz de seu semblante, além do carisma que a caracteriza. Emmanuelle Bercot, por sua vez, a despeito da experiência acumulada, fica restrita a um espaço delimitado, movimentando-se de acordo com as atividades alheias, perdendo singularidade e importância de modo crescente. Na medida em que os flashbacks vão se avolumando, com a cineasta insistindo em apostar nos longuíssimos vislumbres do outrora, assim quebrando o ritmo da linha temporal principal, Mathilde esmaece. Ela volta a ter certa relevância somente quando próximo do apressado fim, em que a tensão e a dúvida são enfraquecidas pela conveniência das conciliações, ainda que exista um esforço visível para que o enredo acabe com as notas melancólicas da desilusão. As colegas de Bahar são entendidas como meros apêndices, inclusive em virtude da proposta diretiva de concentrar na protagonista as dores.

Filhas do Sol oscila entre o intimismo e a exploração frontal das nódoas que sobrevém às diversas manifestações de brutalidade. A fim de reforçar o relevo da maternidade, do papel sublime facultado às mulheres, Eva Husson cede ao impulso de fazer uma sequência melodramática, destoante. Bahar e sua colega, na companhia de mulheres e crianças conhecidas, precisam fugir, passando por postos de controle e afins. A cineasta não se contenta com a tensão intrínseca à situação, lança mão de uma caminhada penosa, com direito a contagem incentivadora de passos, de alguém praticamente em trabalho de parto. É o tipo de reforço desnecessário, procedimento que instaura o enredo alguns tons acima da verdadeira deflagração da miserabilidade oriunda do combate, algo exitoso e forte quando a preocupação relativa ao impacto emocional parte das profundezas, não ficando subordinada aos desígnios homogeneizantes das triviais aparências.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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