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Sinopse

Um movimento juvenil transformou a paisagem urbana de Porto Alegre na década de 1980. Principalmente o bairro do Bom Fim foi palco de uma geração que se expressou por meio do cinema, da música e de outras formas de arte.

Crítica

Filme Sobre um Bom Fim é um relevante e interessante documentário sobre a efervescente cena cultural gerada no bairro portoalegrense na década de 1980. Cinema, teatro, literatura, música. Muito saiu dali, dos artistas que se encontravam na Osvaldo Aranha, tomavam uma cerveja na Lancheria do Parque e terminavam a noite no Bar Ocidente ou no Bar do João. O cineasta Boca Migotto empreendeu uma longa jornada para ver seu trabalho na tela grande, com 13 anos separando o início de toda a função até a primeira projeção, no festival É Tudo Verdade. A boa notícia é que a espera valeu a pena. Com ótimos depoimentos, com inesquecíveis músicas e imagens da época e algumas boas sacadas na hora da montagem, o documentário tem tudo para conquistar o público.

Logo de início temos um interessante cotejo entre o presente e o passado, o velho e o novo. A câmera passeia pelo início da Oswaldo Aranha dentro de um ônibus e a edição corta para uma cena do filme Deu para ti anos 70 (1981), de Giba Assis Brasil e Nelson Nadotti, que faz o mesmo trajeto. O espectador tem a oportunidade de observar as mudanças pelas quais passaram aquela avenida, o coração pulsante do bairro do título. Os diretores daquele clássico do cinema gaúcho dão seus depoimentos, assim como outras figuras centrais para o cinema da época (e de hoje) como Werner Schünemann, Jorge Furtado, Carlos Gerbase, Ana Luiza Azevedo, entre outros. Mas não é só sobre cinema que Filme sobre um Bom Fim se debruça. Temos depoimentos de músicos como Wander Wildner, Nei Lisboa, Frank Jorge, Julio Reny, Márcio Petracco, Edu K, Gordo Miranda. E de escritores como Eduardo Bueno (hilário) e Juremir Machado da Silva. A gama de depoentes é bastante variada e esta lista aqui descrita é uma pequena porcentagem do que vemos em tela.

Existe um clima de nostalgia nos depoimentos, com lembranças de uma época que simplesmente não volta mais. O ponto de encontro das pessoas era nas ruas, em um período no qual o perigo de ficar na Osvaldo Aranha à noite, com amigos, era bem menor. Com essa facilidade do encontro cara a cara, grupos eram formados, amizades eram forjadas e a efervescência cultural do Bom Fim foi eternizada. Claro que nem tudo são flores e o documentário é feliz em trazer alguma voz dissonante neste discurso. Eduardo Bueno é um que minimiza a importância daqueles movimentos, ainda que concorde que exista, sim, qualidade no que foi feito à época.

São tantas histórias, tantas músicas, tantos filmes a serem citados, que é incrível como o documentário consegue abarcar tanto em tão pouco tempo. São 88 minutos intensos, com muito conteúdo e material de arquivo. Ainda que existam umas boas ideias na montagem aqui e ali, o filme é bastante convencional em sua estrutura. Para um doc que retrata uma época tão criativa, não seria nada mal se arriscar um pouco mais em sua estrutura. Da forma como foi realizado, é como se o filme não quisesse chamar atenção para si, deixando o caminho aberto para as histórias e depoimentos que são ali costurados. Funciona bem.

Depois de 13 anos em cima do projeto, Boca Migotto entrega um filme que tem tudo para cair nas graças do público. É relevante, tem sua parcela de irreverência e consegue ser informativo sem nunca ser enfadonho. Captura uma das cenas mais intensas da nossa cultura gaúcha e dá a devida importância aos retratados e aos seus movimentos. Um filme não só para fãs daqueles artistas ou moradores do bairro Bom Fim, mas para curiosos e admiradores em potencial de uma cena que há 35 anos nasceu e continua reverberando até hoje.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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