Crítica
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Sinopse
Crítica
O documentário Fios de Alta Tensão toca na importância do cabelo em diversas esferas, mas, principalmente, como potente elo identitário e forma de expressão. O cineasta Sérgio GAG busca criar um painel amplo acerca desse tópico que vem sendo felizmente mais discutido na atualidade, para isso passando por cidades e estados a fim de colher depoimentos aparentemente repletos de singularidades, que, uma vez justapostos, criariam um discurso poderoso sobre a necessidade de afrontar os padrões pré-estabelecidos e compreender as origens da discriminação a certos tipos de penteados. Todavia, algumas escolhas depõem contra a potência dessa colcha de retalhos cerzidos demasiadamente por meio das semelhanças, o que acaba tornando o filme repetitivo. Por mais que os testemunhos carreguem pessoalidade, que cada história seja imbuída de elementos particulares, a atração é feita a partir dos componentes similares, tais como a chancela social e os torpes modelos aceitos.
A questão capilar afeta mais homens e mulheres negras, pois desde muito cedo estes são condicionados a alisar madeixas encaracoladas e/ou com estruturas que fogem ao paradigma eurocêntrico. E Fios de Alta Tensão oferece vários exemplos de pessoas que passaram por constrangimentos públicos e domésticos em virtude da morfologia dos fios a recobrir suas cabeças. Também é quase onipresente a narrativa da desconstrução, da libertação dos grilhões que impõem determinadas configurações. Essa consecução de depoimentos muito parecidos, na essência, faz com que o longa-metragem rapidamente entre num redemoinho de reafirmação sem tantas variações. Plasticamente, são lindas algumas fusões de montagem, com as cabeleiras sobrepostas às paisagens, efeito encarregado de criar uma dimensão poética que dá conta dessa valorização das mechas, especialmente aquelas que apontam às essências étnicas e culturais como algo a ser abertamente celebrado.
Fios de Alta Tensão, contudo, ao invés de abraçar como central o que lhe atravessa constantemente – a promoção da negritude por intermédio do orgulho capilar –, almeja a uma espécie de multiplicidade que soa superficial. Há um desnível de atenção entre os itens conferidos ao longo do filme. Sérgio GAG apresenta pessoas carecas, outras que comentam sua dificuldade para assumir os, às vezes, precoces fios brancos, e ainda aquelas que testemunham em favor da liberdade de experimentação. Sem dúvida é uma vontade de expandir o assunto, tendo em vista, inclusive, a disposição de perspectivas nunca inquestionáveis. Porém, como tais particularidades não reverberam tanto e tampouco encontram aprofundamento, são soterradas pelo viés principal, a experiência negra que baliza, fazendo o documentário efetivamente relevante. Mesmo louvável, o desejo de ser multifacetado não encontra respaldo no equilíbrio entre todos os pormenores apresentados.
Do ponto de vista formal, Fios de Alta Tensão lança mão de dispositivos de implicação oscilante. Os primeiros e mais presentes são as máscaras negras e brancas que boa parte dos depoentes utiliza. No começo, servem para, uma vez removidas, quebrar simbolicamente a ideia de homogeneização, a fim de afirmar a beleza da individualidade e da liberdade. Adiante, uma mulher que se diz em dificuldades para desvencilhar-se das convenções é coberta com a máscara, movimento que soa como julgamento, do tipo “ela ainda não consegue, portanto volta ao caldo geral”. Mas, a relação metafórica, que parece óbvia e estabelecida, adiante é contradita pela criança que coloca o ornamento, ainda sendo fruto do lar que valoriza sua cabeleira. Da mesma maneira, o roqueiro que toca sobre um barco é uma imagem curiosa, entretanto mais valorosa enquanto componente imagético do que necessariamente alegórico. Em suma, um filme que versa sobre algo importante de modo hesitante, cujas transições soam ora líricas, ora meros expedientes para dilatar a metragem.
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