Crítica
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Sinopse
Duas pessoas peculiares e solitárias se encontram na capital da Finlândia em busca de um amor verdadeiro. No entanto, esse vínculo é travado pelo alcoolismo dele, números de telefones perdidos e outros obstáculos da vida.
Crítica
Alguns dos melhores filmes do cineasta finlandês Aki Kaurismäki são protagonizados por homens e mulheres proletários. Em Ariel (1998) o personagem principal é um carvoeiro; em A Garota da Fábrica de Caixas de Fósforos (1989) é a supervisora de embalagens numa linha de produção; já em Nuvens Passageiras (1996) a trama acontece em torno do casal atingido por uma dura onda de desemprego – esses longas-metragens formam a chamada Trilogia da Classe Trabalhadora. Folhas de Outono reabre o assunto na filmografia desse realizador que tem marcas autorais notáveis, novamente com duas adoráveis figuras principais. Ansa (Alma Pöysti) trabalha precificando num supermercado e Holappa (Jussi Vatanen) manuseia o compressor de ar numa obra. Ela mora sozinha num apartamento próprio, enquanto ele divide as acomodações precárias de um contêiner com os colegas. Os dois são demitidos quase simultaneamente, Ansa por colocar em sua bolsa um item vencido que deveria ter sido descartado no lixo; Holappa por beber em serviço (na verdade, o seu empregador aproveita a descoberta do nível alcoólico inadequado em seu sangue para se livrar de um questionamento sobre segurança no trabalho). Kaurismäki volta aos velhos tempos para fazer um retrato melancólico, mas transbordante de doçura, dessa realidade difícil na qual estão inseridos personagens que vagueiam desanimados.
O estilo de Aki Kaurismäki é característico. As pessoas agem quase mecanicamente, paralisadas por um misto de tédio e conjuntura desfavorável; os cenários internos constantemente são mal iluminados (geralmente um feixe de luz “corta” essa precariedade); e os contexto está muito distante daquela ideia da Finlândia como um lugar sem problemas sociais. Sobre o país, diretor faz questão de enfatizar o seu lado menos glamoroso, assim dando visibilidade a realidades e estratos sociais que tendem a ser invisibilizados. Produto desse estilo peculiar de Kaurismäki e nova incursão do realizador pela realidade do proletariado de Helsinque, Folhas de Outono tem um quê de conto de fadas adorável. Ansa e Holappa se esbarram várias vezes antes de pensar em envolvimento amoroso. Os dois trocam olhares enquanto seus amigos flertam em meio ao diálogo hilário sobre estar velho para atender expectativas. Mais tarde, ela demonstra compaixão diante dele entorpecido de álcool enquanto é vasculhado pelos jovens ávidos por encontrar em seus bolsos algo de valor para roubar. Depois, os dois se cruzam quando o novo patrão dela é preso repentinamente por vender drogas no estabelecimento. É como se o destino estivesse dando uma forcinha para ambos se conhecerem e, quem sabe, iniciar o romance. No entanto, a sina que parece benevolente também pode ser sacana. O destino dá, o destino toma.
Pelo menos em duas passagens de Folhas de Outono o desencontro dos protagonistas acontece por obra desse arranjo um tanto aleatório de coisas, algo que sugere a existência de um roteiro previamente determinado. Holappa gasta um tempo danado em seu intuito de se aproximar de Ansa porque perde (por displicência) o telefone dela. À frente, um atropelamento adia ainda mais essa união que pode representar a ambos uma alternativa menos solitária de futuro. Então, inicialmente há coincidências providenciais que facilitam os encontros, porém posteriormente surgem acasos que definem os desencontros. Aki Kaurismäki constrói uma nova pérola de sua filmografia ao elaborar com ternura essas idas e vindas que podem estabelecer a junção de dois corações errantes. Os excelentes Alma Pöysti e Jussi Vatanen assumem papeis que certamente caberiam anos atrás aos igualmente admiráveis Kati Outinen e Kari Väänänen – colaboradores frequentes do realizador, não à toa os inesquecíveis protagonistas de Nuvens Passageiras, com os quais os intérpretes mais jovens têm até certas semelhanças físicas. Voltando à trama, em vários momentos os personagens recebem notícias pelo rádio sobre a guerra entre a Rússia e Ucrânia. Não por acaso, nesses instantes é comum alguém trocar de estação, substituindo relatos da situação desesperadora por músicas que consigam trazer certa leveza ao momento.
A progressão da história é marcada por suaves elipses que impulsionam gentilmente a trama à frente. Além disso, há um minimalismo nas expressões e nos gestos dos personagens, marcas registradas do cinema de Kaurismäki que sugerem a contenção nessa coletividade bem menos fervorosa e vulcânica do que as latinas, por exemplo. Os diálogos são outros pontos altos dessa pequena (e linda) crônica de trabalhadores braçais à deriva numa sociedade repleta de gente entorpecida pelos desafios da vida. O cineasta finlandês consegue extrair graça até de episódios que parecem inevitavelmente melancólicos, sobretudo por encarar os seus personagens como figuras notadamente tragicômicas. Toda a sequência envolvendo a ida dos protagonistas ao cinema é impagável. Começa com a total falta de noção de Holappa ao levar Ansa para assistir a um filme nada romântico (Os Mortos Não Morrem, 2019) – embora ela diga mais tarde que nunca riu tanto. Depois, desconhecidos forçam comparações descabidas do filme de Jim Jarmusch com obras-primas de Robert Bresson e Jean-Luc Godard – aqui, Kaurismäki faz uma breve chacota com a cinefilia pedante. Folhas de Outono interliga magistralmente comédia e tragédia, gerando uma ternura agridoce para construir o retrato comovente de dois pobres solitários que apenas desejam amar, nem que para isso seja preciso estancar vícios e dar um voto de confiança.
Filme visto durante a 47ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo (2023)
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Folhas de Outono é um filme por vezes entediante mas não conseguimos desgrudar "os olhos da tela". Sempre torçendo pelo acerto Romántico dos personagens.. E quando isso acontece nos sentimos no Nirvana. Valeu !!!!!!