Crítica
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Sinopse
Crítica
A irritante mania brasileira que adicionar adendos explicativos aos nomes internacionais de alguns filmes, neste caso, no entanto, serve de alerta ao espectador nacional. Afinal, se o título Foxcatcher pouco representa – apesar de ser marcante o suficiente enquanto ideia – o acréscimo Uma História que Chocou o Mundo é tanto indicativo quanto enganador. Afinal, o Chocou o Mundo é evidentemente exagerado. Porém, ainda mais necessário é prestarmos atenção ao Uma História. Ou seja, não é A História, e sim apenas mais uma dentre tantas. Pois o que vemos construído aqui é um conto sobre soberba, inveja e insegurança, muito bem interpretado e narrado com segurança pelo realizador, mas o que de fato o difere de tantos outros episódios similares? Há alguns elementos, é certo, porém escassos diante da comoção envolvida.
Estamos em 1987, três anos após os Jogos Olímpicos de Los Angeles – momento de glória para qualquer esportista norte-americano – e faltando pouco mais de um para as Olimpíadas de Seul, na Coréia do Sul. A introdução à história é feita por Mark Schultz (Channing Tatum), medalha de ouro em luta livre. A questão é que ele não é o único medalhista da família: seu irmão mais velho, David (Mark Ruffalo), também subiu ao pódio em primeiro lugar. Além disso, este é o empreendedor, o mais simpático, o dono da academia onde treinam e aquele que está dando os primeiros passos também como treinador. Ou seja, é o que brilha, enquanto que o outro parece viver nas suas sombras.
A chance de mudar esse cenário se materializa quando John Du Pont (Steve Carell), megaempresário do setor químico e um homens mais ricos dos Estados Unidos, entra em contato oferecendo ao caçula patrocínio e a chance de criarem, juntos, um centro de treinamento – visando os próximos campeonatos – em Foxcatcher, a fazenda onde vive. Uma oferta evidentemente generosa demais, e que cobrará o seu preço no devido momento. No começo da trama, Mark está dando uma palestra em uma escolha, com poucos interessados presentes, e logo em seguida descobrimos que para isso ele recebeu um cachê de apenas US$ 20 – e que, ainda por cima, o convite inicial havia sido feito ao irmão mais velho, que não pode comparecer. Pequenos detalhes como esses a respeito das personalidades deste trio de protagonistas são distribuídos ao longo da trama. O que despertou a curiosidade a respeito desse encontro, no entanto, foi que a soma das frustrações entre todos os envolvidos conduziu a trama que os liga a uma conclusão inevitavelmente trágica. Afinal, por mais que pudesse ter sido antecipada, evitá-la era quase impossível.
Há pouca ação em Foxcatcher, e isso é evidentemente intencional. Afinal, este é um filme mais sobre personagens do que a respeito dos acontecimentos que os envolveram. É curioso estudar quem é John Du Pont, uma pessoa que nunca construiu nada por conta própria, ainda que tenha as armas sociais ao seu favor. Essa iniciativa esportiva é justamente uma tentativa de fazer algo que o destaque, porém o desinteresse com o qual esse empreendimento é recebido pela matriarca da família (Vanessa Redgrave, em participação mínima, porém marcante) apenas intensifica sua fúria interna e decepção crescente consigo mesmo. É uma figura patética, porém feita com respeito e admirável entrega. David, por outro lado, é o boa praça que quer ajudar a todos, ainda que não consiga evitar um natural ar de autoridade entre aqueles ao seu redor. E isso, como se pode imaginar, apenas serve para distanciá-lo de quem ele mais quer estar perto.
É de se lamentar as poucas oportunidades que Mark Ruffalo possui em cena, pois o tipo que recria funciona mais como um catalisador de emoções do que um gerador das mesmas. É por causa dele que o irmão é tão problemático, é por ele que Du Pont clama quando as coisas começam a dar errado, e será ele também que representará a derrocada destes sonhos – ainda que em nenhuma destas situações tenha exercido influência direta para tais acontecimentos. Tatum, por outro lado, compõe de dentro para fora, com suas questões internas se tornando cada vez mais evidentes, num processo distante daquele que o ator está acostumado a empreender na maioria dos seus trabalhos mais populares. Mas quem mais chama atenção é mesmo Steve Carell, que se apresenta como outra pessoa, sem em nada lembrar o comediante com o qual o público está acostumado. Se por um lado a transformação merece ser comemorada, por outro é triste percebê-lo submerso a uma maquiagem exagerada que termina por criar novos cacoetes, atrapalhando sua performance num todo – é o Nariz mais notório desde o apresentado por Nicole Kidman em As Horas (2002).
Em Foxcatcher, o diretor Bennett Miller faz novamente uma obra sobre um assunto para falar a respeito de outro. Se em Capote (2005) o foco era a violência como meio para o estrelato, e em O Homem que Mudou o Jogo (2011) o esporte era meramente uma forma de investigar o raciocínio lógico por trás de elementos aparentemente arbitrários, dessa vez ele aproveita esse episódio verídico e surpreendente para investigar os limites do poder – mas não o que compra tudo, mas o que vai contaminando e apodrecendo, aos poucos, aqueles que se deixam por ele corromper. É um filme diferenciado e competente, mesmo que careça de uma maior objetividade. O evento em si, aquele que teria “chocado o mundo”, dá-se nos cinco minutos finais, e sua repercussão limita-se aos letreiros antes dos créditos. No entanto, mais forte são os dilemas e os conflitos vividos pelos protagonistas, e estes, sim, justificam a atenção recebida. Fala-se aqui de momentos que marcaram uma época, mas mais relevantes – e merecedores de um olhar mais profundo – são aqueles que revelavam a intimidade entre os responsáveis por este desfecho absolutamente absurdo.
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Alo Vi o filme hoje e achei muito bom mostrando como os ricos manipulam as pessoas que deles precisam e como a sociedade capitalista pode ser doentia ,ótimos atores.