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Sinopse

De volta ao lugar onde tudo começou, a icônica estação de bombeiros em Nova York, nos Estados Unidos, a família Spengler se une aos caça-fantasmas originais que criaram um laboratório secreto com a pretensão de levar a caça aos fantasmas a outro patamar.

Crítica

A estrada foi tortuosa. Mas terá encontrado o seu rumo? Exatos quarenta anos após o lançamento de Os Caça-Fantasmas (1984), a saga criada por Dan Aykroyd e Harold Ramis chega, enfim, ao seu quinto episódio (ou quarto, se levada em conta a cronologia oficial). O caminho até aqui, no entanto, não foi fácil. Apesar de ter sido a maior bilheteria do seu ano de lançamento – superando fenômenos como Indiana Jones 2, Gremlins, Karatê Kid, Loucademia de Polícia e Footloose – levou cinco anos até que uma continuação fosse providenciada (Os Caça-Fantasmas 2 é de 1989) e, depois desse, a franquia parecia ter caído num limbo sem fim. Discussões, insatisfações, o gênio terrível de Bill Murray (o protagonista) e tantas outras confusões pareciam ter dado como encerrada tal ideia. Mas após um capítulo estrelado por uma versão feminina do elenco (Caça-Fantasmas, 2016) o sinal de alerta acendeu, mostrando que não apenas ainda havia apelo por estes personagens, como também outras possibilidades a serem exploradas. Ghostbusters: Mais Além (2021) serviu para essa transição, resgatando o conceito e posicionando-o diante de um contexto contemporâneo. Ghostbusters: Apocalipse do Gelo, portanto, deixa de lado inevitáveis desvios (releituras, refilmagens, adaptações) para se mostrar como uma sequência que possa agregar algo de novo a um universo já bastante maltratado. Se consegue alcançar esse objetivo, bom, isso já são outros quinhentos.

Para começo de conversa, é saudável a iniciativa de apresentar um perigo até então inédito, pronto para ser explorado pela primeira vez. Por outro lado, falta consistência a esse “demônio ancestral” que ambiciona congelar tudo ao seu redor para que represente um problema, de fato, sério. Perde-se tempo demais não apenas com a construção da trama, mas também em ligar as tantas pontas pelas quais os eventos acabam se estendendo. Gil Kenan (indicado ao Oscar pela animação A Casa Monstro, 2006) e Jason Reitman (também nominado ao prêmio da Academia, mas pelas ficções Juno, 2007, e Amor Sem Escalas, 2009 – além de ser filho de Ivan Reitman, diretor dos dois longas originais) assumiram a responsabilidade por este “resgate”. Ambos assinam os roteiros de Mais Além e deste Apocalipse de Gelo em conjunto, dividindo-se na direção: Reitman esteve no comando do anterior, enquanto que Kenan tomou para si este posto somente agora. Essa ‘dança de cadeiras’ faz sentido: até pela ligação familiar, o episódio de 2021 foi mais emotivo. Dessa vez, portanto, é chegada a vez de deixar o drama de lado e partir para a ação. Algo que é feito apenas em parte.

Importante não esquecer que Aykroyd, Ramis e Murray, assim como o grande nome da versão atual – Paul Rudd, também conhecido como o Homem-Formiga do Universo Cinematográfico Marvel – são, em suas essências, comediantes. Assim, é impossível negar o espírito cômico que percorre os acontecimentos presenciados em todos estes filmes, tanto nos anos 1980 como em plena década de 2020. Os efeitos visuais cada vez mais apurados e as reviravoltas assustadoras continuam ditando grande parte das regras, mas não há como desviar da série de piadas e apelos a um humor visual, seja pelo espírito caseiro da nova formação – os herdeiros de Egon Spengler (Ramis, já falecido na vida real) – como também pelo forte coleguismo que os unem aos remanescentes Venkman (Murray), Stantz (Aykroyd) e Zeddemore (Ernie Hudson). Participações não tão pontuais – e, portanto, relevantes ao andar dos eventos – de Annie Potts (Janine, a secretária espevitada) e de William Atherton (Walter Peck, agora prefeito de Nova York e eterno inimigo) reforçam essa noção.

Mas eles não são os únicos a voltarem aos seus antigos lugares. De John Rothman (o bibliotecário que estava presente em 1984) aos jovens Logan Kim (Podcast) e Lucky (Celeste O’Connor), passando por Carrie Coon, Finn Wolfhard e Mckenna Grace, pode-se dizer que o excesso talvez seja a maior marca deste Apocalipse do Gelo. Afinal, há “caçadores de fantasmas” por todos os lados, sem falar dos recém-chegados, como Kumail Nanjiani (cujo personagem, sem saber, libera a maldição que irá assolar a cidade) e Patton Oswalt (um cômico excelente, mas que surge apenas para explicar de forma detalhada certos imbróglios do enredo para que o espectador não se perca). Como se vê, Kenan está mais para um malabarista de circo, com muito em suas mãos e tempo – ou habilidade – de menos para equilibrar todas estas opções. Dessa forma, é possível até se divertir com o caráter nostálgico do passeio, ainda que seja inevitável o sentimento de déjà vu, ou seja, um sabor de requentado – os mesmos fantasmas, os mesmos assombros, as mesmas descobertas – que permeia cada problema ou solução apresentada.

Após uma incursão pelo interior que os tirou de sua zona de conforto, ao mesmo tempo em que estabeleceu pontes com um legado que não pode ser desprezado, era de se esperar que Apocalipse do Gelo ousasse mais, enquanto exibia desenvoltura suficiente para se libertar de amarras do passado. No entanto, é exatamente o contrário que se vê em cena. É quase como se a necessidade de se fazer honrarias ao que fora conquistado tantos anos atrás os impedisse de seguir adiante, explorando outros conceitos e buscando um olhar assumidamente original para este momento ao qual, enfim, se posiciona. Ghostbusters segue movendo audiências e embalando aventuras que transitam entre o riso solto e o pulo na cadeira, mas é chegada a hora da passagem de bastão. Sem negar o antes, mas com olho para o amanhã. Somente assim o hoje poderá se construir, abrindo portas para uma mais do que esperada retomada: não o mesmo, mas também não radicalmente diferente. Matemática essa complicada, mas não impossível.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.

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