Crítica
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Sinopse
O gaúcho Glauco Rodrigues (1929-2004) é um dos principais pintores da pop art na América Latina.
Crítica
Quando tinha apenas 12 anos de idade, o jovem Zeca Brito foi com sua família ao aniversário de um vizinho, na cidade de Bagé, interior do Rio Grande do Sul, onde moravam. O aniversariante em questão era o pintor Glauco Rodrigues, que comemorava seus 70 anos. Aproveitando a ocasião – porém, provavelmente sem a real noção da importância do homenageado na data – Zeca levou consigo sua câmera amadora e registrou uma rápida conversa com ele, questionando-o sobre seu trabalho, a dimensão de sua obra e coletando conselhos para um artista em formação (tanto o próprio realizador-mirim quanto qualquer outro que tivesse acesso a essas imagens). Pois bem, nascia ali o documentário Glauco do Brasil, que agora, dezoito anos depois, ganha enfim às telas de cinema em sua versão finalizada. E pelo resultado apresentado, percebe-se que toda essa espera valeu à pena.
Mais do que um cineasta, Zeca Brito é um agitador cultural. Envolvido com cinema desde muito cedo, é responsável pelo Festival Internacional de Cinema da Fronteira, que acontece há quase uma década em sua cidade natal – que, para quem não sabe, é muito próxima das divisas com o Uruguai e com a Argentina – e responsável por uma série de curtas – alguns deles premiados no Brasil e no exterior – e também do longa de ficção O Guri (2011), a história de um menino que vira lobisomem na região da Campanha gaúcha. Como se percebe, ele está atento às mais diversas manifestações artísticas, sem preconceito de gênero ou estilo. Pois é seguindo essa mesma linha que se aventura agora no registro documental com Glauco do Brasil, um título que cumpre bem sua missão de resgatar a vida e a obra do biografado (1929-2004) como também se revela inquieto o suficiente para ir além do esperado, demonstrando uma verdadeira paixão a respeito da personalidade pela qual decidiu debruçar sua atenção.
Exibido pela primeira vez durante a programação da 39ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, Glauco do Brasil é tudo menos um filme bairrista. Ainda que fortemente identificado com as cores do Rio Grande do Sul, assim como seu personagem fez quando vivo, o longa parte do sul do Brasil para conquistar todo o país e ir além, estendendo-se pelo mundo. Do Clube de Bagé, do qual fez parte ao lado de outros expoentes como Danúbio Gonçalves e Vasco Prado, até sua decisão de morar no Rio de Janeiro e o quanto sua obra foi se adaptando a cada um dos cenários vivenciados, passa-se também por suas experiências europeias, como as passagens pela Bienal de Paris (1961), de Veneza (1964) e a influência da Pop Art norte-americana.
O documentário não foge do registro mais tradicional, se apresentando como um mosaico composto por depoimentos alternados por imagens dos trabalhos do artista. E o material coletado é bastante rico, tanto visualmente quanto de informações, o que estimula o espectador a se aprofundar nesse universo. Glauco foi praticamente relegado a um segundo plano em seu país para se tornar um ícone internacional. Relatos captados durante a exposição O Anjo da História, realizada na Escola de Belas Artes de Paris em 2013, ajudam a ilustrar essa condição. Dentre tantos entrevistados – nomes que vão desde críticos e teóricos como Ferreira Gullar e Affonso Romano de Sant’Anna até atores como Stepan Nercessian e Camila Amado – se destaca a conversa informal que o diretor conseguiu arrancar do gigante colecionador Gilberto Chateaubriand (filho do próprio Chatô e dono da maior coleção de arte brasileira do país, com mais de 7 mil obras reunidas). Entremeadas por uma surpreendente descontração, tem-se um testemunho original de um profundo conhecedor sobre a grandeza do artista, feito determinante para revelar nossa própria ignorância.
Zeca Brito é inteligente também em não tornar seu trabalho cansativo, deixando o espectador com gostinho de quero mais – e há muito ainda a ser descoberto sobre a obra de Glauco Rodrigues. Glauco do Brasil é feliz inclusive em seu título, pois indica de partida a importância de sua arte para a construção de nossa identidade nacional, revelando ainda os momentos conturbados enfrentados no último século. Didático quando precisa, dinâmico na medida certa em sua construção – tem-se um filme iluminado, colorido e alegre, refletindo de forma eficiente as imagens perseguidas por Glauco – e de produção detalhada, no qual se percebe na tela os esforços dos envolvidos, este é um longa que cumpre bem seu objetivo não apenas de servir como resgate, mas também como porta de entrada a um dos grandes talentos brasileiros do século XX.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Robledo Milani | 7 |
Alysson Oliveira | 6 |
MÉDIA | 6.5 |
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