Crítica
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Sinopse
Golda Meir foi uma das figuras mais controversas do ambiente político do Oriente Médio. Também conhecida como a "Dama de Ferro de Israel", ela encarou uma situação repleta de complicações durante a Guerra do Yom Kippur.
Crítica
Grandes líderes em momentos de inacreditável tensão, que exige desses uma acurada capacidade de análise do cenário que frente a eles se exibe e qual a melhor decisão a tomar diante do quadro apresentado costumam resultar em obras cinematográficas de imenso apelo, tanto junto ao público, como também com a crítica. Por outro lado, astros consagrados, que não possuem mais nada a provar a ninguém, quando dispostos a intrincadas transformações físicas a serviço do papel que tem em mãos, também costumam gerar a melhor das impressões entre audiências ao redor do mundo, em especial com aquelas que se veem envolvidas com os processos de votações dos grandes prêmios de Hollywood – como o Oscar, em particular. Um bom exemplo que combina tanto um viés quanto o outro é o drama O Destino de uma Nação (2017), que não apenas resgatou o primeiro-ministro britânico Winston Churchill durante as horas mais cruciais do combate durante a Segunda Guerra Mundial, como alcançou tal feito através de um quase irreconhecível Gary Oldman, que por este desempenho recebeu todos os reconhecimentos possíveis (inclusive, é claro, a cobiçada estatueta dourada da Academia). Pois é fácil antecipar que o mesmo deverá se suceder com Helen Mirren em Golda: A Mulher de uma Nação, longa que, se não se arrisca em almejar o inesperado, ao menos faz o que se propõe com imensa segurança e precisão, resultando não apenas em um filme que vai direto ao seu ponto de interesse, como também proporciona uma performance irretocável de uma das grandes damas do cinema mundial.
A homenageada em questão é ninguém menos do que Golda Meir, a quarta primeira-ministra do recém-criado estado de Israel, responsável pelo comando do país entre 1969 e 1974. Período esses anos de grandes provações, talvez tenha sido o maior deles o conflito que entrou para a história como A Guerra de Yom Kippur. O batismo se deu pois foi justamente durante o feriado religioso de Yom Kippur que tropas árabes tanto do Egito quanto da Síria decidiram atacar os israelenses, por acreditarem que nesse dia suas forças estariam desmobilizadas – o que, de fato, assim se encontravam. De Meir foi exigida uma resposta imediata, assim como também a exigência de um chamado de apoio ao governo dos Estados Unidos, através do secretário de estado Henry Kissinger, com o envio de maquinaria e armamento para que pudessem se defender. O envolvimento norte-americano acabou resultando em protesto das nações árabes, que pararam de exportar combustível fóssil para a América, levando ao início da crise do petróleo. Era, portanto, como um gigantesco castelo de cartas, do qual apenas um movimento em falso foi capaz de colocar em risco uma estrutura que há décadas vinha sendo laboriosamente construída.
Golda Meir não é uma figura inédita no audiovisual. Provavelmente a primeira a interpretá-la em uma obra de ficção foi a oscarizada Ingrid Bergman, no telefilme Uma Mulher Chamada Golda (1982), que além de ter sido seu último desempenho enquanto atriz (ela viria a falecer, com apenas 67 anos, vítima de um câncer de seio, no mesmo ano do lançamento desse projeto), ainda lhe rendeu (como despedida) um Globo de Ouro e um Emmy. Meir é muito citada, ainda que não chegue a aparecer em cena, no israelense O Dia do Perdão (2000), de Amos Gitai, e teve participação decisiva no histórico Munique (2005), de Steven Spielberg, no qual ganhou o rosto de Lynn Cohen. Nenhuma dessas abordagens, porém, foi tão fundo quanto essa dirigida por Guy Nattiv (vencedor do Oscar pelo curta Skin, 2018, que posteriormente foi adaptado por ele mesmo no longa Skin: À Flor da Pele, 2018). Nascido em Tel Aviv, não nega a influência que a ex-líder de sua pátria teve na sua formação. Por isso mesmo, reconhece o quão inútil seria seguir com uma reconstituição tradicional, nos moldes início-meio-e-fim. A escolha de centrar esse olhar em um momento específico – e relevante – acaba por fazer a (positiva) diferença.
Mas talvez de nada isso adiantasse não tivesse ao seu lado uma performance maiúscula como a oferecida por Helen Mirren, que deixa de lado qualquer vaidade em nome das exigências dessa personagem. Dona de quatro indicações ao Oscar e cinco ao Bafta (em cinema), em ambas as premiações ganhou pelo retrato que ofereceu como a monarca Elizabeth II em A Rainha (2006), vitórias arrebatadoras e nunca sequer questionadas. Pois bem, em Golda ela segue o mesmo modelo de sublimação pessoal, ao desaparecer por trás de uma figura altamente reconhecível, mas que, a partir dessa composição – que parte de próteses e de uma delicada maquiagem e vai até um cuidado no gestual e na empostação da voz – acabará por se confundir com a própria identidade da atriz. Seja em momentos pontuais e por demais sutis, como um olhar fugidio para uma funcionária cujo filho está diretamente envolvido no campo de batalha, até outros que beiram a comicidade, quando desiste de uma espera em vão para que seus ministros e comandados prestem a reverência necessária e se levantem da mesa para que ela possa, enfim, se sentar com a honra que lhe é devida, ela ganha uma força ainda maior nas relações por demais breves, mas nunca menos que marcantes, que estabelece com dois interlocutores essenciais ao intento de definir seu caráter durante os dias abordados: a assistente-pessoal e braço direito vivida pela francesa Camille Cottin (Dez Por Cento, 2015-2020), sensível quando possível, assertiva quando necessária, e com o californiano Liev Schreiber, que faz do seu Kissinger um tipo comedido, ainda que ciente do seu potencial de mudar o jogo, se mostrando o parceiro ideal para a protagonista nas passagens que mais dela exigiram.
Não se reconhece a ausência de informações cadastrais – para isso, há sempre o Google e a Wikipedia para atender os curiosos. De onde veio e o que se deu com Meir após os eventos aqui retratados, é não mais do que consequência: a soma do que viveu até aquele momento é o que agora se apresenta, e seu destino a partir de então é não mais do que fruto desse esforço e comprometimento. Dessa forma, Nattiv e Mirren encaram com seriedade e precisão o roteiro lapidado por Nicholas Martin (Florence: Quem é essa Mulher?, 2016), e a partir dessa união constroem não apenas a imagem de uma senhora doente e frágil, que não conseguia largar o cigarro e que gostava de se ocupar com tarefas na cozinha, ao mesmo tempo em que se via envolta por debates e questionamentos que tiveram influência determinante na vida de milhares. “Serão eles responsáveis por uma nação de órfãos e viúvas”, declarou ao ameaçar seus oponentes. Muitos, no entanto, a veem como tal, dado o passar dos anos. Eis aqui um desenho que não tem medo dessa controvérsia, mostrando acertos e deslizes, mas que, quando combinadas, ilustram alguém que lutou, até o último instante, pelo que de fato acreditava. Uma verdade da qual não se pode fugir.
Filme visto durante o 73º Festival Internacional de Cinema de Berlim, na Alemanha, em fevereiro de 2023
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Robledo Milani | 8 |
Alysson Oliveira | 4 |
Francisco Carbone | 6 |
Carlos Helí de Almeida | 6 |
MÉDIA | 6 |
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