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Sinopse

É véspera de Ano-Novo e um carregador de malas de um hotel precisa lidar com diversas situações que acontecem por lá, das diabruras de crianças num quarto a uma aposta sangrenta em outro.

Crítica

Numa época em que Quentin Tarantino acreditava mandar no mundo – afinal, havia acabado de ganhar o Oscar e a Palma de Ouro no Festival de Cannes com Pulp Fiction – Tempo de Violência (1994) – ao invés de seguir em sua jornada rumo à consagração, ele decidiu apenas se divertir. E para isso, assim como a maioria das pessoas, chamou seus amigos mais chegados. O resultado é Grande Hotel – nenhuma relação com a produção homônima de 1932 e estrelada por Greta Garbo que ganhou o Oscar de Melhor Filme, no entanto. Esse longa episódico é formado por quatro histórias passadas numa mesma noite de réveillon, todas protagonizadas por Ted, o mensageiro (Tim Roth, numa interpretação tão exagerada e irritante que alguns acreditam que foi por causa dela que ele perdeu o Oscar a que concorria no mesmo ano como coadjuvante por Rob Roy: A Saga de uma Paixão, 1995). E se o filme chama atenção pelo grande elenco envolvido, decepciona terrivelmente pelo resultado muito aquém do esperado pelos talentos que apresenta.

Dirigido por Alisson Anders, que antes havia chamado atenção no Festival de Sundance com o drama Sonhos Femininos (1992) – e que desde então só tem trabalhado na televisão, em seriados como Sex and the City (1999), The L Word (2006) e The Mentalist (2013) – o primeiro episódio se chama The Missing Ingredient (O Ingrediente que Falta, em tradução literal) e é sobre um grupo de bruxas (entre elas Madonna, Valeria Golino e Lili Taylor) que se reúne na Suíte da Lua-de-Mel para realizar um ritual de reencarnação de uma deusa virgem amaldiçoada. Cada uma delas deveria trazer um fluido corporal – mas justamente a mais nova falha em conseguir o esperma do namorado, e sua última chance será conseguir o tal “ingrediente” com o mensageiro do hotel. Bobo, simplista e com efeitos especiais canhestros, já anuncia o tom bizarro que dominará todas as tramas. The Wrong Man (O Homem Errado) tem direção de Alexandre Rockwell, realizador independente pouco conhecido no Brasil e que assina também a produção executiva de Grande Hotel. Numa das tantas festas de Ano Novo que estão acontecendo ali, ligam para a recepção pedindo mais gelo, mas informam por engano o número errado do apartamento. O mensageiro acaba entrando em outro quarto, no meio de uma briga entre marido e mulher, em que ela (Jennifer Beals, de Flashdance, 1983) está amarrada e amordaçada, enquanto que o marido (David Proyal, de Caminhos Perigosos, 1973) a acusa de estar lhe traindo com o rapaz que acaba de aparecer. O enredo é o mais claustrofóbico e um pouco doentio, mas os diálogos são espertos o suficiente para garantir a atenção do espectador. O final simplista, no entanto, prejudica o resultado como um todo.

O terceiro episódio, The Misbehavers (Os Bagunceiros), tem direção do popular Robert Rodriguez, e combina seus dois elementos mais usuais: produções infantis (como a série Pequenos Espiões) e violência estilizada (como em Sin City: A Cidade do Pecado, 2005). O casal vivido por Antonio Banderas e Tamlyn Tomita sai para uma festa de virada do ano e deixa os filhos sob os cuidados do mensageiro. As crianças, verdadeiras pestinhas, irão literalmente colocar o quarto à baixo, com incêndios, seringas e prostitutas assassinadas. A história é até bobinha, mas diverte sem grandes tropeços. Banderas faz quase que uma ponta, como se aparecesse para dar uma força ao amigo Rodriguez. Por fim, o que todos esperavam: a participação de Tarantino. Ele é o diretor, roteirista (assim como seus colegas, também escreveu a trama que dirige) e um dos atores de The Man from Hollywood (O Homem de Hollywood). Um grande astro do cinema, acompanhado de alguns amigos (Bruce Willis, em participação não-creditada, entre eles), precisa do mensageiro para ajudá-lo em uma aposta: ele dará seu carro ao colega Norman (Paul Calderon) se esse conseguir acender seu isqueiro dez vezes seguida, sem errar. Caso contrário, terá seu dedo minguinho decepado, tarefa que caberá ao funcionário do hotel. Este argumento é inspirado em um episódio de Alfred Hitchcock Presents, estrelado por Peter Lorre e Steve McQueen, e isso, além do discurso sobre a importância de Jerry Lewis para a cultura americana, garante o lado pop tão característico do cineasta. O ritmo desse talvez seja o mais desequilibrado – a ação demora muito para começar, com personagens demais e sem função – mas a conclusão é ótima, garantindo um término em alta para o projeto.

Grande Hotel poderia ser muito, mas acabou se contentando com pouco. É uma piada muito particular, que certamente agradou muito mais aos realizadores e artistas envolvidos do que a plateia, que o desprezou impiedosamente. De todos os filmes assinados por Tarantino, é o com pior desempenho nas bilheterias, tendo faturado menos de US$ 5 milhões – além de ter sido premiado com a Framboesa de Ouro de Pior Atriz Coadjuvante para Madonna (uma injustiça, afinal ela nem tem muito o que fazer para ser apontada desse jeito). Do céu ao inferno em pouco mais de um ano, serviu ao menos para que o realizador cuidasse um pouco melhor do seu público – o que, de fato, ele voltou a fazer a partir de então.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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