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Sinopse
Os últimos anos do casal Hafis e Mara Bertschinger. Enquanto Hafis é um artista suíço-libanês impulsivo que gosta de produzir desenhos e pinturas desafiadores, Mara é uma mulher tranquila e a principal incentivadora do trabalho do marido.
Crítica
Segundo o cineasta Mano Khalil, que veio ao Brasil para apresentar o documentário Hafis & Mara na sessão de abertura do 7o Panorama do Cinema Suíço Contemporâneo, realizadores cinematográficos devem ser caçadores, sempre à espreita, na busca por uma nova história que mereça ser contada. Mas quem decide, enfim, o que pode ou não ser narrado na tela grande, seja como ficção ou não? E ainda mais importante: esse julgamento está em quem conta, naquele que observa ou, em última instância, nos que são usados como matéria desse discurso? Este confronto adquire novos ares de desconforto neste filme sobre um artista que nunca alcançou suas ambições e a mulher que escolheu estar ao seu lado, abdicando de uma vida possivelmente melhor em nome de uma segurança que nem mesmo ela parece ter certeza da existência.
Hafis e Mara Bertschinger moram em uma vila no interior da Suíça. O mundo parece ter parado ao redor dos dois, mas logo percebemos o quão rápido se move, principalmente pelas constantes revelações que vão sendo feitas aos espectadores. Hafis é ar, Mara é terra. Ele está sempre no espaço, criando, pulando – literalmente – e imaginando novas possibilidades. Artista plástico, produz uma tela atrás da outra, em seu estúdio ou em céu aberto. Tudo lhe serve de inspiração. Mesmo que isso signifique não estar atento ao horário do almoço – ou a qualquer outra obrigação burocrática do dia a dia. Quem se ocupa destas responsabilidades é Mara, a âncora que mantém o casal – e não apenas no sentido figurado. A casa, a vida, a rotina que levam: tudo é mais mérito dela do que dele.
Ainda que tão distantes, os dois acabam funcionando juntos. Ou, ao menos, é a impressão que temos num primeiro momento. Isso porque Hafis não consegue parar – e Mara agora já não tem mais como ir. É por isso que ela fica para trás enquanto ele está sempre pensando no próximo passo. Seja para encontrar o filho que há muito não vê – fruto de uma outra relação – ou mesmo no sentido mais prático, quando o trem parte e é ela que permanece na estação. Ele está sempre com um novo pretexto, talvez não apenas para ir, mas também para ter que voltar. A ela, no entanto, as ausências se revelam doloridas, ainda que tenha ciência que são frutos de uma escolha há muito tempo tomada, e da qual não tem como escapar. Essa é sua realidade, e ainda que os olhos volta e meia a traiam, está em paz consigo.
Mano Khalil parece um tanto sem saber o que fazer com o que descobre ter em mãos, no entanto – e esse sentimento é transferido ao espectador. Uma cena casual de nudez – um homem tomando banho – abre espaço para uma discussão sobre homossexualidade, tabus e suicídios. Uma fotografia antiga revela vontades há muito esquecidas, como a volta à casa natal ou a busca por um ideal de país que não mais existe. No meio disso tudo, há a arte, pela qual ambos respiram, e que mesmo assim tão mal os tratou com o passar das décadas. Para ela vivem, ainda que essa se recuse a retribui-los à altura.
E se o diretor se mostra receoso com o que lhe é revelado, como ficam aqueles em posição ainda mais passiva, no lado de cá da tela? Muito é abordado, em questão de minutos, mas pouco é, de fato, aprofundado. Porém, são os silêncios que respondem pelos momentos mais reveladores. Estes e os olhares. Visões molhadas, que lamentam uma realidade que poderia ter sido, mas que não tem mais espaço. Hafis & Mara é um filme sobre possibilidades que não serão concretizadas – o tempo é curto, e nesse ponto não há prorrogação. O homem não se arrepende, mesmo temendo pelo que deixou de conquistar. A mulher, mais sentida, sabe que ali está por sua conta e risco, mesmo sem estar certa de ter feito a melhor escolha. E entre chegadas e partidas, o pior é a indecisão. Tanto na vida quanto na arte.
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