Crítica
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Sinopse
Crítica
Há no ar uma promessa de verão inesquecível. As britânicas Tara (Mia McKenna-Bruce), Skye (Lara Peake) e Em (Enva Lewis) sequer esperaram para ver as notas finais do secundário e partiram a uma região paradisíaca da Grécia. Elas ficam num hotel com hóspedes semelhantes: jovens em busca de festas intermináveis. São muitos os filmes que têm premissas parecidas, mas a maioria é protagonizada por adolescentes homens. O discurso das três amigas também é cinematograficamente mais frequente na boca de meninos, afinal de contas elas chegam a criar uma aposta para premiar a mais sexualmente ativa. Quem transar mais fica com a cama, ganha bebidas e será tratada como a rainha das férias compartilhadas. Portanto, How To Have Sex parte de uma afirmação de gênero, uma vez que as atitudes majoritariamente atribuídas aos homens, pois a eles é muito mais permitido esse tipo de postura livre, também aqui cabem às mulheres. Por que não? Quem disse que as três não podem simplesmente escolher a primeira pessoa por quem se interessarem e ir para a cama, depois refazendo essa dinâmica com mais gente? E dentro dessa perspectiva reivindicativa, a diretora Molly Manning Walker insere habilmente outro lugar-comum do filme adolescente no qual busca subsídios a uma interessante releitura: há uma virgem entre elas, alguém que pretende finalmente se iniciar sexualmente.
American Pie: A Primeira Vez é Inesquecível (1999) é apenas um dos vários filmes que tratam a perda da virgindade como a transposição de um limite entre a adolescência e a vida adulta. No entanto, ele se vale da linguagem do besteirol para fazer chacota com as expectativas juvenis (especialmente as dos garotos), tirando onda com medos/inseguranças, criando momentos constrangedores com os quais parte da plateia pode se identificar e rumando inevitavelmente para um encerramento feliz em que lições são aprendidas e o futuro é positivo. How To Have Sex tem uma abordagem completamente diferente. Ele começa sinalizando os excessos das protagonistas histriônicas e barulhentas, como convém a pessoas dessa faixa etária em férias de verão distante dos pais e responsáveis, para aos poucos ir se focando na turbulência interna de Tara. Ao ponto de em algumas cenas essa atenção à intimidade abafar os sons intensos do mundo que continua pulsando frenético alheio a angústias pessoais. Molly Manning Walker é habilidosa ao construir essa diferença perceptiva, alternando a algazarra promovida por pessoas que parecem exacerbar uma alegria apenas possível naquela situação e os desassossegos da personagem que assume o protagonismo a partir do instante em que se distingue dos demais. Tara faz parte da fauna, está integrada ao ecossistema, mas há algo nela levemente destoante.
Ainda dentro da utilização dos arquétipos de filmes adolescentes nessa releitura reformadora com tons menos românticos e mais realistas, How to Have Sex oferece a Tara dois pretendentes de perfis completamente diferentes que se candidatam naturalmente a possibilitar sua primeira vez. Um é Badger (Shaun Thomas), o cara meio bobão, de beleza pouco chamativa, mas que demonstra atenção à protagonista, em vários momentos deixando a algazarra de lado para verificar se ela está bem – ainda que não seja tão diferente dos demais, vide a cena do sexo oral em público durante a prova à beira da piscina. O outro é Paddy (Samuel Bottomley), o bonitão com pouca sensibilidade que parece ser o único completamente adequado ao discurso geral de curtição sem travas, próximo da exaustão de tanto beber e fazer sexo. Aliás, ele avança enquanto os demais recuam em algum momento dessa intenção manifestada verbalmente de ir às últimas consequências e ter noites selvagens sem olhar a quem – a falácia adolescente que não encontra sustentação absoluta na realidade, inclusive diante de responsabilidades afetivas e afins. Paddy é a representação desse enunciado imprudente do “verão selvagem”. Tanto que dos personagens mais eloquentes ele é o único que não demonstra qualquer característica além dessa disposição à inconsequência. Os demais sempre deixam à mostra alguma breve hesitação.
Não é porque os personagens falam que desejam fazer A, B ou C, tomados por uma euforia contagiante, que devem levar isso inconsequentemente a cabo. Paddy é o sujeito que fere esse princípio separador entre palavras e ações, sendo basicamente uma encarnação literal e egoísta do “vamos curtir sem olhar a quem”, nem que para isso seja necessário cometer até um crime. Lá pelas tantas, Molly Manning Walker se foca ainda mais estritamente na percepção de Tara enuviada pela tristeza de ter feito algo porque isso se esperava dela, por ter oferecido a alguém com quem não tinha a mínima afinidade o instante que a ela será inesquecível por motivos grosseiros. A fotografia assinada por Nicolas Canniccioni oferece essa diferença de tons visuais entre o antes e o depois da perda da virgindade, sendo o antes uma festa maluca enxergada em planos mais abertos e o depois uma viagem mais pessoal pelas angústias de uma menina prestes a colocar os dois pés na vida adulta – nova fase cujo cartão de visitas foi a demonstração misógina de sua fragilização enquanto mulher. A se lamentar apenas o fato de a diretora não ter estendido um pouco o então breve sumiço de Tara como motivador da tensão enervante entre os demais – no estilo de A Aventura (1960), de Michelangelo Antonioni, em que o sumiço da mulher durante as férias paradisíacas revela os aspectos essenciais dos demais. Ainda assim, é instigante essa ressignificação de itens dos filmes adolescentes pela perspectiva feminina.
Filme visto durante a 25º Festival do Rio (2023)
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 8 |
Chico Fireman | 7 |
Daniel Oliveira | 7 |
Maria Caú | 8 |
Alysson Oliveira | 8 |
Francisco Carbone | 9 |
Miguel Barbieri | 7 |
MÉDIA | 7.7 |
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