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Crítica


8

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16 votos 6.2

Onde Assistir

Sinopse

Em 31 de dezembro de 1999, um jovem armado invade uma das maiores emissoras de televisão da Polônia. Ele exige transmitir uma mensagem ao vivo, em rede nacional, após o pronunciamento do presidente da república. Enquanto isso, faz uma apresentadora e uma segurança de reféns. Começa uma corrida para superar a crise e manter todos em segurança.

Crítica

Interrompemos a Programação (2021) constitui um filme corajoso por uma série de motivos. À primeira vista, ele se aparenta com tantas histórias sobre a tomada de reféns em programas de televisão ao vivo por algum invasor desesperado (caso de Jogo do Dinheiro, 2016, e Esta É a Sua Morte: O Show, 2017). No entanto, o diretor Jakub Piatek revela ambições inesperadas para um suspense popular, feito para grande plataforma de streaming. Em primeiro lugar, ele oculta o máximo possível a motivação do sequestrador: que mensagem ele exige vincular em rede nacional, com tanta fúria? Por que o ato ocorre no dia 31 de dezembro de 1999, na virada do milênio? Por que escolheu esta emissora de televisão em particular? Que recado pretende passar para o único homem a quem faz uma ligação telefônica durante a crise? Ele seria realmente perigoso? Existe uma bomba dentro da mochila? O cineasta acredita que a premissa, por si própria, baste para reter a atenção do espectador, mesmo sem fornecer respostas fundamentais. Por isso, revela a invasão na cena inicial, preservando o mistério até a conclusão. Somos capazes de nos identificar com o jovem descontrolado, ou com suas vítimas, sem sabermos de onde veem, o que desejam, como se comportavam anteriormente? A iniciativa representa um belo teste de direção e de uso da linguagem cinematográfica.

Além disso, a maioria das produções comerciais partiria das dúvidas rumo ao esclarecimento total. Em outras palavras, começariam cheias de perguntas, explicadas cena a cena (a origem do garoto, seus motivos, a resolução do impasse policial) até o desfecho, quando todas as peças estariam colocadas em seus devidos lugares. Ora, no caso da obra polonesa, o espectador termina a projeção com tantas dúvidas quanto entrou – tendo resolvido algumas e adquirido tantas outras ao longo do percurso. Recursos simplificadores como algum familiar munido de um discurso emocionante, ou uma namorada tentando impedir a crise são substituídos por um único parente, perverso e manipulador, e pela incapacidade da equipe em gerenciar a situação. Se a narrativa clássica se encaminha à manutenção da ordem, este drama privilegia o caos – vide o desfecho aberto que não resolve os problemas de nenhuma das pessoas envolvidas. O criador apresenta notável ambição para, diante de uma situação propensa ao maniqueísmo (pela disposição de criminoso versus vítimas), sustentar ambiguidades jamais esclarecidas: afinal, havia colaboração entre o invasor e determinado funcionário? Os policiais estavam tentando, de fato, proporcionar a transmissão ao vivo ao sequestrador, ou apenas ganhar tempo? Ninguém se torna digno de raiva, nem de pena. O julgamento moral é deixado ao espectador, caso decida tomar partido por um ou por outro.

Isso não significa que os personagens sejam desprovidos de complexidade, pelo contrário. Cuidadosamente, o roteiro de Piatek e Lukasz Czapski introduz pequenas referências ao mundo fora do estúdio de gravação: seja pelos monitores de canais concorrentes, seja por insinuações nos diálogos, descobrimos a crise econômica que assola o país, a futilidade da programação da TV aberta, o elitismo do presidente da empresa, os caprichos de Mira (Magdalena Poplawska), uma apresentadora famosa, e a desigualdade de tratamento em relação a Grzegorz (Andrzej Klak), funcionário de baixa renda. O retrato de um país marcado por grave desigualdade social invade as portas trancadas por Sebastian (Bartosz Bielenia). Ao mesmo tempo, a reflexão se desloca das óbvias questões de sobrevivência (Os reféns serão salvos? O jovem sairá impune?) para as questões de ética profissional e da imagem: a emissora deveria transmitir ao vivo o recado do garoto? Ela teria o direito (ou dever) de registrar este momento ou, pelo contrário, deveria ocultá-lo? Os instantes mais graves, envolvendo gritos e sangue, devem ser repercutidos, ou isso equivaleria à espetacularização do caso? É sintomático que, após inúmeras sequências de tensão, alguém grite: “Deixe as câmeras em paz!”. Afinal, são elas os verdadeiros motores de conflito.

Em paralelo a esta discussão humana, Interrompemos a Programação (uma bela tradução para o original Prime Time) oferece um deleite estético, sobretudo em termos de direção de fotografia. Sem efetuar movimentos vaidosos de câmera, nem contorcionismos com o enquadramento e a profundidade de campo, Michal Luka explora da melhor maneira possível as luzes frias das lâmpadas (a história inteira se passa dentro do estúdio), o contraste acentuado entre as luzes duras e as sombras, além das cores queimadas ressaltando detalhes das roupas e dos acessórios típicos do fim dos anos 1990. O som com eco, distanciado ou transmitido via microfones e sistemas internos, provoca tensão quando os personagens compreendem mal as falas alheias. Não existe um único plano sem um cuidado excepcional de luz e enquadramento para valorizar os olhares expressivos de Sebastian e a solidão dos reféns dentro de um estúdio gigantesco e silencioso. Rumo ao final, os passeios da câmera pelos corredores se aproximam do terror, atribuindo um caráter labiríntico à caça pelo elemento perigoso. Em duração enxuta, o diretor oferece planos contemplativos, longos, dentro dos quais se intrometem as dúvidas típicas dos melhores suspenses psicológicos (Por que determinada pessoa observa durante tanto tempo o sequestrador? Ele guardaria algum segredo?). O diretor faz com que a estética, por si própria, aprofunde a ambientação e o dilema.

Em consequência, o filme polonês rompe com a noção de cinema pragmático, onde cada cena serve a um único propósito (fazer andar a trama e conduzi-la à resolução). O roteiro introduz sequências cuja temporalidade poderia ser trocada na montagem (a dança atrás das câmeras, a evacuação do prédio, a descoberta da mochila), e valoriza o tempo esticado, fundamental para o espectador imergir na duração real, presente e ao vivo. De certo modo, a transmissão tão desejada por Sebastian ocorre para os olhos cúmplices do público: somos os únicos a perceber a indecisão de Mira sobre pegar o revólver, ou a hesitação de Grzegorz entre fugir e ficar no estúdio. O projeto oferece uma bela ciranda de poderes entre personagens tridimensionais. Alternadamente, alguma figura se ampara do controle da situação – Mira, Sebastian, os policiais, a produtora – sem que o espectador saiba ao certo quem prevalecerá, e principalmente, quais são os objetivos de cada um. A narrativa rompe com os pressupostos de heroísmo, de finalidade (visto que as motivações estão abertas a interpretações), e acima de tudo, com a noção de crime-espetáculo. Filmes de sequestro costumam oferecer uma experiência puramente imersiva, mexendo com as emoções superficiais ao invés da razão. Neste caso, nota-se um estranhamento excepcional na condução, permitindo ao espectador se afastar e analisar este cenário de modo crítico. Tamanha ruptura com os códigos hollywoodianos deve se converter no motivo principal pelo qual alguns espectadores abraçarão a obra, e outros a rejeitarão por completo.

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Crítico de cinema desde 2004, membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema). Mestre em teoria de cinema pela Universidade Sorbonne Nouvelle - Paris III. Passagem por veículos como AdoroCinema, Le Monde Diplomatique Brasil e Rua - Revista Universitária do Audiovisual. Professor de cursos sobre o audiovisual e autor de artigos sobre o cinema. Editor do Papo de Cinema.
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CríticoNota
Bruno Carmelo
8
Francisco Carbone
7
MÉDIA
7.5

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