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Sinopse

Desde o celebrado momento do seu nascimento até a sua chegada em Jerusalém para ir de encontro com a crucificação, a história de Jesus de Nazaré foi um marco que perdura até hoje. Pouco antes de cumprir seu destino na Terra, Jesus passa por um longo retiro de 40 dias pelo deserto da Judeia, atravessando diversos tipos de obstáculos, provações e tentações.

Crítica

Produção espanhola, Jesus de Nazaré: O Filho de Deus se encarrega da árdua tarefa de recontar a chamada Paixão de Cristo. A dificuldade, aqui com ares de missão, advém das inúmeras versões anteriores dessa passagem cara ao cristianismo, o que, portanto, deixa pouco espaço às novidades. No começo, há flashes do calvário que o autoproclamado filho de Deus sofre nas mãos de algozes. Cenas do que antecede a crucificação entrecruzam, por exemplo, a provação do protagonista por Satanás no deserto. Todavia, essa promessa de uma narrativa rebelde quanto à cronologia relatada nas escrituras não se cumpre integralmente, acentuando, assim, a regra confirmada, exatamente, por suas esparsas exceções. Uma das grandes fragilidades do filme está na representação frágil das figuras emblemáticas, vide o demônio tentador, que se parece demasiadamente com Palpatine, um dos maiores vilões da saga Star Wars, com a sua túnica preta e a máscara que o empalidece.

Jesus de Nazaré: O Filho de Deus apresenta um elenco essencialmente de caucasianos, reiterando uma visão romântica pouco próxima da realidade dos povos que habitam as regiões nas quais a trama se passa. Contrariando a qualidade dos cenários, senão ótimos, mas funcionais, as barbas exemplarmente feitas, bem como as sobrancelhas simétricas. Isso acentua a artificialidade dos personagens, deixando-os a mercê da inverossimilhança. O longa-metragem se ressente de uma maior acuidade no que tange à maquiagem e aos cabelos, detalhe aparentemente banal, mas que, assomado às demais debilidades visíveis, desenha um painel à beira da caricatura. A beleza dos intérpretes, tanto os masculinos quanto as femininas, parece um atributo essencial para suas escalações. Julian Gil, que tem a complicada tarefa de viver Jesus, se restringe a olhares perdidos e a máximas bíblicas, supostamente suficientes para gerar a magnanimidade desse ícone religioso.

O filme passa burocraticamente, como se riscasse tarefas de um itinerário, por todos os instantes da Paixão de Cristo, contudo não se esforçando para estabelecer consistência. Jesus de Nazaré: O Filho de Deus sofre por conta de seu caráter excessivamente episódico, o que, para começo de conversa, não permite a demonstração efetiva das engrenagens do poder por trás da crucificação do nazareno. O brasileiro Sérgio Marone encarna Pôncio Pilatos, aquele que literalmente lava as mãos quando o povo escolhe Barrabás para ser salvo da pena capital. Ele não chega a fazer feio, principalmente ao seguir o tom predominante, ou seja, preocupado mais com a gravidade das falas transmitidas milenarmente do que com a profundidade de seus significados. Em dados momentos, a articulação dos milagres chega a criar uma sensação de que o protagonista não passa de um exibicionista intentando arregimentar ovelhas para seu rebanho ao provar possuir dons de pura divindade.

Fundamentado num roteiro repleto de lacunas, Jesus de Nazaré: O Filho de Deus acelera determinados acontecimentos, se demora desnecessariamente em outros, e acaba sendo supérfluo. O diretor Rafa Lara passa em desabalada carreira por episódios cruciais, como a expulsão dos vendilhões do templo e as suas subsequentes implicações políticas, conferindo terreno amplo somente aos testemunhos dos milagres. Nesse sentido, os apóstolos são meros apêndices. O único que ganha um pouco de espaço para expressar-se é Judas Iscariotes (Santiago Raimundo). Porém, a sua franja milimetricamente desarrumada e seus olhos claros são apenas alguns dos traços postiços de sua pífia caracterização. Essa falta de apuro no concernente à direção de arte, aliás, combina com a afetação da encenação e a postura predominantemente enrijecida dos intérpretes. Há poucos lampejos de qualidade e muita de ingenuidade nessa versão anêmica da conhecida Paixão de Cristo.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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