Crítica

Apesar do título, Jogos Patrióticos usa os ataques terroristas do IRA e seus confrontos com a Coroa Britânica apenas como plano de fundo, quase como um McGuffin, para desenvolver a história de vingança do radical Sean (Sean Bean) contra o famoso analista, e agora aposentado da CIA, Jack Ryan (Harrison Ford). Trata-se, claro, de mais um roteiro adaptado de um livro de Tom Clancy, cujas tramas parecem sempre usar o plano político militar de background para um conflito essencialmente mais básico e humano.

Inferior ao seu antecessor, A Caçada ao Outubro Vermelho (1990), esta nova “aventura” de Jack Ryan peca ao demorar-se em sequências desnecessárias e de pouca ou nenhuma tensão, como a que acompanha a eliminação de dois membros do grupo de terroristas, o que toma alguns dez ou quinze minutos e que poderia ser facilmente omitido sem danos maiores à narrativa. É verdade que o filme também não conta com coadjuvantes tão interessantes e nem mesmo muito aprofundados. Se antes tínhamos até no pequeno papel de Sam Neil um personagem completo, com nuances, desejos, arrependimentos e uma tridimensionalidade palpável, dessa vez o protagonista até possui um amigo próximo, Robby (Samuel L. Jackson), mas do qual não ficamos sabendo nada a respeito, a ponto de, em boa parte da trama, ter-se a dúvida se ele não estaria a ponto de trair Ryan. Uma pena não ser o caso. É difícil competir com o carisma de Sean Connery, mas o Sean da vez, o Bean, tampouco faz por onde para se destacar, e a própria escalação do ator para este papel, vista dos dias de hoje, é um spoiler sem tamanho. Afinal, todos sabem o que acontece com seus personagens em quase todos os filmes em que aparece, certo?

Por outro lado, Ford, com 16 anos a mais que Alec Baldwin, é um Jack Ryan muito mais carismático e enérgico, e sua encarnação só perde para a de Chris Pine – que, infelizmente, é estrela do único filme da série que se pode chamar de insosso. Harrison Ford também é mais preparado para as cenas de ação, filmadas de forma compreensível por Phillip Noyce, que habilmente torna lógico o mise em scène de uma perseguição de lanchas em alto-mar durante uma tempestade à noite (!), inclusive apostando o seu clímax nessa sequência. Noyce também faz escolhas interessantes ao cortar do rosto de Jack para um enquadramento exatamente igual de um de Sean, contrapondo, ainda que sem maiores pretensões, herói e vilão. Da mesma forma, dosa a ação ao nos poupar de uma sequência de tiroteio ao mostrar um ataque do exército americano a uma base de radicais apenas através de imagens de satélite, o que torna a ação dos militares muito mais tátil. E pode-se destacar também a divertida decisão do roteiro e da direção de omitir uma informação ao fim do fita, a fim de nos deixar com a sensação que seria gostoso voltar a acompanhar aqueles personagens.

O que de fato voltaríamos a fazer. Aqui, contando com uma trilha curiosa de James Horner, que prefere os tons dramáticos e instigantes aos barulhento arranjos comuns ao gênero, Jogos Patrióticos ainda se mostra um longa-metragem tenso em diversos pontos de sua duração – a sequência final no casa dos Ryan é especialmente cativante neste ponto. E mesmo não sendo um grande filme – nem mesmo obrigatório – é parte da franquia de adaptações dos livros de Tom Clancy, e vale ser conferido principalmente por trazer Ford em mais um papel de herói para a sua coleção; papel que ele reprisaria, aliás, na admirável terceira continuação, Perigo Real e Imediato (1994).

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é formado em Produção Audiovisual pela PUCRS, é crítico e comentarista de cinema - e eventualmente escritor, no blog “Classe de Cinema” (classedecinema.blogspot.com.br). Fascinado por História e consumidor voraz de literatura (incluindo HQ’s!), jornalismo, filmes, seriados e arte em geral.
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