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Sinopse

Jonas descobre o amor aos 14 anos de idade, na figura de um novato recém-chegado à sua escola.  

Crítica

Após ter interpretado homossexuais no excepcional 120 Batimentos por Minuto (2017) e no corajoso Selvagem (2018), é pouco provável que Félix Maritaud esteja preocupado em ficar marcado por apenas um tipo de personagem. Tanto é que está de volta a esse universo de sentimentos e exaltações em Jonas, longa escrito e dirigido por Christophe Charrier, aqui em seu segundo trabalho nesse formato. Mais do que aparecer como a figura que dá título ao filme, o ator surge de forma enigmática com a função de esconder as emoções vivenciadas por ele dezoito anos antes, quando é visto em cena sob a pele do adolescente Nicolas Bauwens (Graças a Deus, 2018). A tarefa, se imaginada facilitada pelo fato de estar dividida com um companheiro das artes, se revela ainda mais intensa nesse hábil jogo de revela a esconde elaborado pelo realizador, no qual as peças, ainda que expostas desde o primeiro instante, só farão pleno sentido nos minutos derradeiros da história. Uma habilidade sutil, mas não fácil de ser encontrada em todos os lugares.

Durante a narrativa, Jonas é visto quase que simultaneamente nestes dois momentos distintos de sua vida: primeiro, como um jovem retraído que sente a falta do melhor amigo, que precisou trocar de colégio por causa da separação dos pais; e segundo, como um rapaz encrenqueiro, que é expulso de boates e da casa do namorado, ao mesmo tempo em que tenta se manter em um subemprego num hospital. Entre os dois pontos, não será preciso esforço para perceber que algo de trágico aconteceu com ele. Mas o que seria, e em qual proporção? Garoto bem-nascido, filho único de um casal presente e amoroso, está longe de ser o mais popular da escola, mas também não chega a ser a vítima preferida dos bullies. Por outro lado, quando adulto se mostra infiel a quem lhe deposita confiança, revela ter uma carreira profissional errática e há tempos se mostra afastado dos pais.

Tudo parece ter começado a mudar quando Nathan (Tommy-Lee Baïk, de Winter War, 2017) não só entra, como toma conta, de sua vida. O recém-chegado coloca olhos sobre ele desde o primeiro instante na escola, e a aproximação entre os dois será inevitável. Quando percebem, estão fazendo tudo juntos, desde matarem aulas até o passar dos finais de semana. Os amigos logo desconfiam que pode existir algo mais entre eles, e qualquer deboche, se chega a afetar Jonas, para o outro é nada mais do que um leve incômodo, do qual conseguirá se livrar sem maiores problemas. Afinal, esses ao redor não deixam de estarem certos. É o primeiro amor que está surgindo. Tão bonito quanto marcante, tão importante quanto definidor das pessoas que eles virão a ser no futuro. Ou não.

Até porque, quase duas décadas depois, apenas Jonas continua presente. Logo no começo da história ele é expulso de uma boate, a Boys, onde é uma figura mais do que recorrente. Acusado de estar sempre atrás de confusão, queixas são prestadas na polícia, e, como consequência, é proibido de lá retornar. O que desperta curiosidade, no entanto, é tentar entender por quê insiste tanto em ir a um lugar pelo qual parece demonstrar tamanho desprezo. Antes repleto de perspectivas, agora está acomodado em um trabalho aquém do seu potencial, sem casa onde morar, nem amigos que possam lhe acolher. Um olhar furtivo na beira da praia, se num instante inicial parece sugerir um flerte casual, logo revela ser bem mais do que isso. Jonas tem uma missão a cumprir. Ele precisa fechar um círculo. Só assim, imagina, conseguirá encontrar a paz perdida tantos anos antes.

Mas não é apenas ele que permanece inquieto. Outros foram afetados, como a mãe solitária (Aure Atika, de A Natureza do Tempo, 2017), o irmão que não existia (Ilian Bergala, de A Família Bélier, 2014) e, principalmente, o rapaz que foi levado, sem nunca mais voltar. Diante de um trauma que, mesmo tanto tempo tendo se passado, segue repercutindo, estará na bagagem emocional de Félix Maritaud a dor e a superação tão necessária a estes que seguem sofrendo, quando nada mais há a ser feito. Ninguém foi responsável pelo ocorrido, mas todos se culpam por não terem agido diferente. Jonas é um só, e por isso não poderá mais carregar sozinho todo esse peso nas costas. É chegado o momento de compartilhar. Um detalhe pequeno, quase irrelevante, mas suficiente para transformar um mundo.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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