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Sinopse

Os dinossauros passaram a viver em meio aos humanos depois da destruição da Isla Nublar. Mas, essa convivência nem sempre é amistosa e o frágil equilíbrio na interação das espécies coloca em xeque o futuro da vida na Terra.

Crítica

Em mais de uma ocasião, Steven Spielberg declarou que as experiências mais sofridas de toda a sua filmografia foram as realizações de Indiana Jones e o Templo da Perdição (1984) e O Mundo Perdido: Jurassic Park (1997), as duas únicas sequências imediatas com as quais se envolveu diretamente (ele não assina nenhuma das inúmeras continuações de Tubarão, 1975, e os outros capítulos da saga Indiana Jones foram menos traumáticos pois já estava acostumado com a ideia de seguir lidando com os mesmos personagens). E não é que Jurassic Park: O Parque dos Dinossauros (1993), o maior sucesso de bilheteria de toda a carreira do cineasta – o único título assinado por ele a faturar mais de US$ 1 bilhão no mundo todo – ganhou não apenas uma, nem duas, mas chega agora a uma franquia com seis títulos? Após Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros (2015) e Jurassic World: Reino Ameaçado (2018) – ambos mais bem-sucedidos junto ao público do que o original, com US$ 1,6 e US$ 1,3 bilhão arrecadados, respectivamente – essa segunda trilogia se encerra (?) com Jurassic World: Domínio, aquele que pode ser apontado como o mais gratuito e desprovido de motivações de todas as incursões dos seres pré-históricos pela tela grande até o momento.

Os problemas se apresentam de imediato, e estão no próprio conceito por trás dessa mais recente ‘aventura’. Se num a maior ameaça era o T-Rex, no seguinte foram os velociraptores, para depois surgir um tal de gigantossauro, e assim por diante. Ou seja, se aumentava de tamanho, ou de voracidade, para tornar o perigo maior e mais ameaçador. Em Domínio, no entanto, o inimigo a ser temido por todos são ninguém menos do que gafanhotos. Mas não monstros do tamanho de prédios – isso caberia melhor no MonsterVerse de Godzilla e King Kong – e, sim, insetos do período jurássico (ou cretáceo, ou similar, pois a série nunca foi muito fiel a estas questões históricas), medindo mais ou menos o tamanho de um antebraço humano. Sozinhos, portanto, talvez não teriam sido motivo para tanta preocupação. O problema é que andam em bandos – ou, melhor, em verdadeiras nuvens, com milhares de semelhantes. O potencial destrutivo é imenso, e ao aniquilarem plantações ao redor do planeta, podem acabar com alimentos e, com isso, levar a própria humanidade à extinção. O argumento, portanto, tem fundamento. Mas parece fazer sentido dentro de uma trama que sempre privilegiou dinossauros gigantes?

O mais preocupante é tentar entender quem teria não apenas criado, mas também soltado esses animais pelos ares – e com qual propósito? É mais fácil apenas entender que há uma poderosa companhia genética por trás de tudo, e que apesar do seu tamanho e influência, o homem à frente este imbróglio – um maquiavélico Campbell Scott, sem conseguir dosar as expressões faciais carregadas ou disfarçar os trejeitos de vilão de desenho animado – está sempre acessível, assim como desamparado nos momentos de maior necessidade. O destino reservado a ele é tão patético quanto o conceito do personagem. Talvez nos anos 1990 – ou até antes – sua presença fizesse sentido. Três décadas depois, soa como uma piada de mau gosto. Da mesma forma como é desajeitada a inserção do trio original de protagonistas. Laura Dern e Sam Neil, como a pesquisadora Ellie Sattler e o arqueólogo Alan Grant, rapidamente se revela desnecessários, ela servindo apenas para anunciar o perigo, enquanto que a ele pouco resta a não ser repetir caretas e posturas vistas antes. Nada se compara, no entanto, ao matemático Ian Malcolm, papel do carismático Jeff Goldblum. Apesar de ser aquele de todo o elenco que mais vezes esteve nessa situação – aparece em quatro dos seis longas – tem aqui sua versão mais inútil, não acrescentando absolutamente nada ao contexto. É um desperdício de figuras relevantes sem precedentes.

Porém, o que já estava ruim, ainda consegue ficar pior. É quando se desenrola a sequência dos episódios dessa nova trilogia, resgatando as participações da empresaria Claire Dearing (Bryce Dallas Howard, que ao longo de três filmes transformou sua personagem em um tipo que em nada se assemelha com a sua versão original) e o tratador de animais Owen Grady (Chris Pratt, fazendo pouco além do que dele se espera, que é manter a pose e emitir frases de efeito vez que outra). Agora juntos, eles ficaram responsáveis pela jovem Maisie (Isabella Sermon, vista em Reino Ameaçado), que seria a primeira clone humana a ter dado certo – e, por isso, também estaria na mira da tal empresa responsável pelos mesmos gafanhotos de antes. Quando a menina é sequestrada, seus pais adotivos não tem o que fazer a não ser partir no seu encalço. E o que se vê a seguir é ainda mais bizarro, pois soa quase como um cruzamento de Jurassic Park com James Bond: muitos aviões, cenários em países exóticos, perseguições pelos telhados de cidades com muita areia e pouco verde, e após cruzarem meio planeta entremeando continentes, se deparam com um destino desconhecido no coração da Europa. E dá-lhe suspensa de descrença para levar a sério que a floresta tropical apresentada possa estar incrustada em pleno território italiano.

Colin Trevorrow começou no cinema independente, realizando curtas e documentários, até que a comédia Sem Segurança Nenhuma (2012) alcançou relativo sucesso, tendo sido premiada no Festival de Sundance e no Independent Spirit Awards. Ao invés dessa notoriedade ter lhe servido para uma evolução progressiva de trabalhos cada vez mais desafiadores, se viu catapultado imediatamente para o comando de Jurassic World. Mesmo sem ter assinado o quinto longa (que ficou sob o comando de J.A. Bayona, o mesmo de O Impossível, 2012), Trevorrow volta agora a esse universo desprovido de novas ideias, com pouco a acrescentar a uma fórmula que se apresenta desgastada e à beira da exaustão, não apenas exaurindo seus (poucos) acertos recentes, como também tornando irrelevantes conquistas de passagens anteriores. Jurassic World: Domínio peca, principalmente, a despeito de todos os desencontros levantados no decorrer desse texto, pelo maior dos pecados: apresentar um filme de dinossauros no qual estes são os mais irrelevantes em cena, servindo apenas para alguns sustos e correrias que nunca resultam em mudanças drásticas na narrativa. Se tirassem todos os enormes lagartos de cena, o desenrolar dos acontecimentos seria praticamente o mesmo. E uma constatação como essa não se pode perdoar.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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