Crítica
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Sinopse
Hypolite Leon Denizard Rivail, o homem que ficou famoso sob o codinome Allan Kardec, além de tradutor e escritor, iniciou o estudo do espiritismo, uma das doutrinas mais praticadas no Brasil. Ele escreveu os cinco livros que compõem a Codificação da Doutrina Espírita, entre eles O Evangelho Segundo o Espiritismo e O Livro dos Espíritos.
Crítica
A suntuosidade visual em Kardec é preponderante. A reconstrução da Paris do século 19 é esmerada, da direção de arte aos figurinos detalhados. Para sustentar a cinebiografia do homem inicialmente cético que gradativamente é convencido da existência de fenômenos ligados ao mundo espiritual, recorre-se à imagem hiperestilizada, aos artifícios que esgarçam os limites da realidade. Isso é visto, de pronto, na cena inicial, a dos alunos ouvindo atentamente o professor Hippolyte Léon Denizard Rivail (Leonardo Medeiros) num cenário minuciosamente escurecido e com destaque à luz pontual irrompendo da janela. Aliás, esse facho que adquire contorno lírico está presente em praticamente todas as tomadas do protagonista diante de indícios de algo insondável. É uma espécie de marca registrada, um recurso poético que visa sublinhar a luminosidade tentando quebrar os grilhões da chamada idade das trevas. Portanto, a ambientação cumpre seu papel vital.
Demonstrando a veia contestadora de um homem adepto de preceitos científicos, Kardec, mais do que reforçar uma mudança essencial de paradigmas internos, intenta criar uma noção de resultado praticamente à prova de questionamentos. Pois, o sujeito posteriormente chamado pela alcunha de Allan Kardec, que rechaçava completamente a consistência dos fenômenos das mesas rodopiantes e a possibilidade de contato estrito com desencarnados, ao deparar-se com aparentes "provas" mensuradas metodicamente se transforma num ferrenho propagador da polêmica boa nova. A guinada obedece aos fatos, mas não se dá num terreno cinematograficamente crível, configurando uma transformação abrupta demais para ser verossímil. De uma hora para outra, lançando mão de elipses mal conjuntadas, o realizador faz de seu empedernido defensor da escola laica um homem disposto a jogar sua reputação para cima a fim de alertar a todos sobre o espiritismo.
O maior ponto falho de Kardec é a direção de Wagner de Assis, que permite articulações empostadas. Amélie (Sandra Corveloni), esposa de Kardec, é limitada a um espaço meramente funcional. Ela aparece em cena somente para sustentar a trajetória abnegada do marido, ocasionalmente ventilando a relevância da exposição de um vínculo bonito, mas sendo constantemente podada na raiz de seus ímpetos. Problemas de montagem, como o corte seco no meio da demonstração de emoção de determinada personagem, se assomam à incapacidade de cerzir assuntos com o devido peso dramático. Por um lado, o filme aposta bastante nas sequências alteradas em pós-produção para atestar a pretensa legitimidade cinematográfica dessa Paris que não existe mais. Por outro, não é visto semelhante empenho na encenação de passagens capitais, como os protestos parisienses, simples aglomerações de meia dúzia de gatos pingados que não imprimem força.
Kardec aborda acontecimentos demais num curto espaço de tempo, não oferecendo o amadurecimento devido às dinâmicas. Elementos descartáveis, como os perseguidores misteriosos e a indignação da médium pela omissão de seu nome em O Livro dos Espíritos, configuram desperdícios pontuais, mas sintomáticos de uma vontade de abarcar muito, contudo sem pagar o tributo que as circunstâncias pedem quando transpostas ao cinema. A inconsistência da dramaturgia fica mais exposta pela forma como atores e atrizes interagem, num tatibitate quadrado, não pautado essencialmente pela pompa do século acessado, mas demonstrativo da falta de fluidez narrativa perceptível em quase todos os momentos. Do meio em diante, o longa-metragem passa a ser um elogio desajeitado a Kardec, pensador arrojado, convencido por pretensas evidências da existência dessa dimensão repleta de almas desencarnadas que esperam a chance de voltar melhores ao reino dos vivos.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Marcelo Müller | 4 |
Francisco Carbone | 6 |
MÉDIA | 5 |
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