Crítica
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Sinopse
Três mulheres com origens e histórias diferentes têm algo em comum: participam da Liga das Obsessivas Compulsivas por Amor, grupo de apoio para aquelas que sofrem por viver relacionamentos tóxicos.
Crítica
O cineasta espanhol Pedro Almodóvar sempre teve predileção por personagens femininas intensas. Criou em torno delas universos hipercoloridos e repletos de elementos kitsch. Neles, manipulou habilmente estereótipos e arquétipos em observações que não perdem a ternura mesmo ao lançar mão de perspectivas corrosivas sobre o comportamento humano. A menção ao cineasta é justa porque L.O.C.A. parece querer trilhar caminhos bastante parecidos. O longa-metragem brasileiro abraça uma ideia semelhante de explosão de cores vibrantes para dar matizes próprios a um percurso inclinado ao exagero, esta premissa cômica que se bem utilizada pode render ótimos frutos. Então, o que inicialmente chama a atenção na comédia estrelada por mulheres à beira de um ataque de nervos é a sofisticação da cenografia, sobretudo a dos ambientes que flertam com uma deliciosa irrealidade artificial. O intuito é pincelar a noção do desbragado. A protagonista é Manoela (Mariana Ximenes), doutoranda que não enxerga futuro no relacionamento meio às escondidas com seu orientador (Fábio Assunção). Ela ainda corta um dobrado para exercer sua profissão de jornalista numa revista feminina comandada por um homem machista (Otávio Müller). Estabelecido o quadro, a roteirista/diretora Claudia Jouvin parte à apresentação das coadjuvantes imediatas: Rebeca (Roberta Rodrigues) e Elena (Débora Lamm).
Manoela resolve escrever sobre a Liga das Obsessivas Compulsivas Obsessivas por Amor (L.O.C.A.), grupo de apoio que visa oferecer respaldo emocional às vítimas das pressões sociais machistas. A protagonista destrincha em off essa constatação de que revistas, novelas e outras engrenagens são responsáveis pelas cobranças excessivas que minam gradativamente a autoestima feminina. Um dos principais problemas de L.O.C.A. está exatamente no fato de que as nuances desse discurso abraçado pelo filme são pretensamente resolvidas nos voice over ou nos diálogos meramente expositivos. Quando próximo ao fim, depois de alguns arroubos de desvario e/ou respostas equivalentes em intensidade à toxicidade masculina, surge outra dessas falas fora de quadro. E ela carrega uma espécie de diagnóstico social que bem poderia ser diluído ao longo da trama. Além disso, o desfecho também aparentemente almeja aparar arestas após uma sucessão de gestos e ações que podem ser mal interpretados (ou será que são mal inseridos nessa evidente vontade de quebrar lugares-comuns?). A explanação final busca justificar atos e comportamentos violentos, como se fosse uma espécie de mea culpa que suaviza bastante o potencial cáustico do filme. Além do mais, várias singularidades, como a natureza da figura vivida por Maria Luisa Mendonça, são bem intencionadas, mas geram ruídos.
L.O.C.A. foge da armadilha de construir personagens unidimensionais, mesmo que flerte com modelos popularmente consagrados. No começo da trama, temos a mulher passiva, a passivo-agressiva e a agressiva. No decorrer do filme, esses papeis vão sendo intercambiados e/ou ressignificados, num movimento existente para sustentar a tese (pertinente) de que atitudes femininas consideradas desvairadas são resultado da conduta masculina previamente irresponsável e/ou reprovável. Rebeca é superficialmente forte, impositiva, mas sempre volta para o marido que a engana. Já Elena tem maneiras estranhas que prenunciam algo de errado. Ela se transforma naquela a quem não se deve avalizar 100%, em suma, uma narradora não confiável. Aliás, Claudia Jouvin não investe na fidedignidade (ou não) do que as mulheres contam no grupo de apoio ou nas conversas privadas. A confirmação de que a história de uma delas não bate com a realidade, pois fruto da deturpação de um ciúme excessivo e patológico, abre portas para esse questionamento acerca da veracidade dos vários relatos. Isso poderia trazer complexidade ao conjunto. No entanto, a cineasta passa batido por isso, fazendo do componente uma frustração circunstancial das nossas expectativas. Entre as coadjuvantes, por fim, Valentina Bandeira interpreta o bom alívio cômico, a exceção da esposa satisfeita que confirma a regra vigente.
O fato de L.O.C.A. ser um filme produzido, roteirizado e dirigido por mulheres é algo importante para a análise de seus enunciados. Há uma escancarada vontade de denunciar a subjugação feminina como responsável por precarizações (emocionais, profissionais, etc.). Manoela tem relacionamentos tóxicos com o chefe chauvinista e o professor que a esconde por conveniência. Rebeca está cansada de acordar sozinha por conta das escapulidas do marido. E Elena parece a mais comprometida das três, inclusive no que diz respeito à sua saúde mental avariada possivelmente por experiências anteriores traumatizantes. No entanto, pesa negativamente o fato de o filme justificar de modo simplista até os atos mais agressivos como decorrências unicamente do machismo estrutural. A despeito do bem-vindo discurso progressista e empoderador, quase todas as ações das mulheres no filme estão vinculadas a algo que homens fizeram ou deixaram de fazer. Há pouca autonomia. As personagens cometem atrocidades quando não veem outro caminho senão a vingança para se sentirem melhor. No encerramento, atestam que aprenderam lições valiosas e evoluíram. Para que as vendetas tivessem aquele gosto saboroso dos filmes tresloucados, por exemplo, de Pedro Almodóvar – a matriz reiterada –, Claudia Jouvin poderia investir na incorreção política como resposta (efeito colateral) não de todo justificável. A resposta à lógica machista não decorre de um acúmulo que estoura a represa do superego. Ela não é torrencial, pois diluída nas lições morais rasas e redentoras, vide os certos e errados bem determinados.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 5 |
Alysson Oliveira | 3 |
Lucas Salgado | 4 |
Francisco Carbone | 4 |
Robledo Milani | 6 |
MÉDIA | 4.4 |
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