Sinopse
Mabel e Jorge estão vivendo as últimas 24 horas juntos, entre tentativas de experienciar o amor enquanto ele ainda reside sob o mesmo teto e lembranças de uma vida conjunta prestes a acabar.
Crítica
É sôfrega a tentativa de sexo no início de La Cama. Jorge (Alejo Mango) e Mabel (Sandra Sandrini) miram um último instante de intensidade antes da separação. Em meio ao processo de desmantelamento da casa na qual constituíram família, buscam uma derradeira fagulha que arrefeça a tristeza, mas não a conseguem. A câmera da cineasta Mónica Lairana fica impassível diante daquele desmoronamento que começa com a ausência da ereção e prossegue por um longo tempo até culminar na manifestação de desespero da mulher frustrada. Aliás, a forma como Sandra Sandrini representa esse momento tem um quê de exagero. Ela esperneia e grita incessantemente na cama até que o quase ex-cônjuge a tranquilize com atenção e um copo d’água. O que se tem dali em diante é o testemunho do desmonte do ambiente doméstico, com a disposição da mobília e de outros artefatos à transportadora que logo chegará ao local. Há insignificantes intervenções do mundo externo.
La Cama constrói esse rompimento psicologicamente violento apostando em cenas longas, no mais das vezes elaboradas em apenas um plano. A rigidez formal intenta transmitir essa paralisação a que os personagens são submetidos diante da separação. Todavia, é excessiva a subserviência dos intérpretes à marcação de cena, algo transparente na maneira como sua movimentação se subordina aos limites do quadro, ao efeito desejado. Tal característica traz um engessamento narrativo para além da imobilidade que a situação gera. Não há elementos que nutram tal esvaziamento gradativo e doloroso do ambiente repleto de memórias. Embora a realizadora focalize fotografias antigas e busque conferir aos objetos aquilo que eles suscitam nos personagens, como as lembranças do tempo em que os filhos eram crianças e eles felizes juntos, o filme sente o peso da apatia que se abate sobre o todo, não conseguindo atrelar valor aos momentos de pura introspecção.
Se valendo de pouquíssimos diálogos, os protagonistas de La Cama expressam essa turbulência por não ditos, através da movimentação corporal combalida pela melancolia vigente. Diante de um futuro incerto, eles, absolutamente aferrados ao passado – vide as tecnologias das quais se valem, como o ventilador barulhento, praticamente onipresente na trama –, não conseguem, sequer, conversar. Afora esses desejos de criar efetivamente um caminho caracterizado pela aridez e a rarefação, Mónica Lairana estende demasiadamente determinas tomadas, deixando as figuras expostas a uma dinâmica reiterativa, ocasionalmente atravessada por alguma coisa que a substancia. O desespero de Mabel com a demora do ex-marido que vai buscar comida poderia ser um desses temperos, mas acaba sendo fragilizada pela inaptidão da encenação para gerar o peso do drama. De modo semelhante, há o histrionismo desajeitado após Jorge sair do quarto na calada da noite.
Há excertos bonitos em La Cama, sobretudo aqueles em que a ternura aparece nos detalhes, como as mãos estendidas ou o cuidado com a integridade emocional alheia. No entanto, o desenvolvimento moroso e a aposta em silêncios e revelações parciais, que se avolumam improdutivamente, fazem com que a sensação de inércia prevaleça. Por conta da fidelidade ao procedimento de construir as cenas com somente um plano, Mónica Lairana compromete passagens como a do sexo supostamente redentor, cuja consumação, observada também a partir de um único ponto de vista, soa artificial. Positivamente se distanciando de convenções, com excelente direção de arte e mantendo suspensa, porém na seara do improvável, a reconciliação, a cineasta, no entanto, cria caminhos repetitivos com componentes inférteis, escrutinando de um jeito não tão orgânico o término doloroso para o par. Depõe contra, portanto, a afetação da direção que condiciona todo o resto.
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