Crítica
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Sinopse
Solteira, Akiko é uma jovem mãe com uma rotina complicada. Quando seu filho adolescente ensaia despertar um mundo fora de seu controle, a tragédia se imporá de modo irreversível.
Crítica
Um dos grandes problemas de parte considerável do cinema contemporâneo é a redundância. Talvez por não confiar na capacidade cognitiva dos espectadores, alguns roteiros empilham repetições para mensagens e/ou pontos de vista ficarem bem claros. Em Laço Materno há uma dedicação quase exaustiva à reafirmação de que Akiko (Masami Nagasawa) é a pior mãe do mundo. Negligente com o pequeno Shuhei (Sho Gunji), irascível com a família cansada de sustentar sua vadiagem e um não menos destrutivo vício em jogo, ela tem poucos instantes para ser de fato alguém. O cineasta Tatsushi Ohmori a reduz a um acúmulo de irresponsabilidades e comportamentos absolutamente reprováveis, não deixando espaço para percebermos, quem sabe, suas motivações, impossibilidades e afins. Essa mulher que parece não se sentir confortável seguindo os protocolos da vida considerada normativa – trabalho, convenções domésticas, obrigações diante dos que a circundam – é reduzida a uma vilã insensível, incapaz de um pingo de solidariedade diante do sofrimento precoce do menino.
De modo igualmente recorrente, vemos Shohei tendo de se virar sozinho, cumprindo tarefas que a mãe desavergonhadamente lhe atribui. Ao invés de focar-se na investigação do laço, observando os mecanismos da fidelidade canina da criança intermitentemente exposta a maus tratos e outras situações deploráveis, Laço Materno prefere acumular eventos de tons bastante parecidos, embora a sua variação circunstancial permita o entendimento da amplitude desse quadro doloroso. São raríssimos os instantes em que, por exemplo, a porralouquice de Akiko se converte em algo positivo, como na breve cena dela subvertendo as regras da piscina para que o filho tenha um episódio de diversão. O envolvimento com um sujeito desprezível, as mentiras contadas às autoridades para gozar de benefícios, a agressividade direcionada aos pais idosos, a vultuosa crueldade materna, enfim, todo esse conjunto se torna sufocante, principalmente porque o filme não se empenha em compreender a personagem. Ela está ali (existe) apenas para contrapesar a bondade do garoto.
A fim de assimilar essa falta de afinação de Laço Materno, é imprescindível colocar em perspectiva o prisma por meio do qual a história é contada e o tempo conferido ao mesmo. Ao optar por privilegiar a experiência de Shohei, o cineasta Tatsushi Ohmori deliberadamente deixa de lado a averiguação da personalidade materna, o que se prova contraditório diante do espaço a ela conferido para repetir-se. Por conta dessa desarticulação narrativa, tanto o comportamento de Akiko quanto as respostas passivas do garoto acabam simplesmente virando contingências, como se a agressividade da adulta fosse praticamente natural e a impassibilidade infantil tivesse uma essência simetricamente imponderável. Na medida em que o filho cresce, passando a ser interpretado por Daiken Okudaira, com o acréscimo da caçula também vulnerável, o filme ameaça estabelecer um conflito, mas o mata por inanição, aos poucos, por não nutri-lo com nuances. É como se o discurso sustentasse que as coisas são como podem ser naquela dinâmica que, assim, aponta a um beco sem saída.
A adolescência, que traz aberturas a um mundo por Shohei ignorado, prevê possibilidades auspiciosas a Laço Materno, chegando a esboçar uma tese acerca desse isolamento social como o maior culpado pela obediência cega do agora rapaz. Porém, seguindo na toada de pesar a mão para reafirmar as mesmas coisas de antes, ou seja, que Akiko é incorrigível e Shohei a seguirá até o fim do mundo se for preciso, Tatsushi Ohmori continua lançando luz sobre as atitudes grosseiras dela e as demonstrações quase sobre-humanas de resiliência dele. Ademais, o filme passa displicentemente por certas ocasiões, vide a tentativa de assassinato que impõe a necessidade de esconder-se, completamente esquecida tão logo a morte do sujeito seja descartada. Por um lado, o longa se empenha para que o espectador não tenha quaisquer dúvidas a respeito do que são feitas as pessoas em cena e até aonde algumas conseguem resistir se penhorarem o próprio bem-estar altruisticamente. Por outro, evita investigar esses personagens com atenção, lendo-os reiterada, superficial e preguiçosamente.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Marcelo Müller | 4 |
Ticiano Osorio | 9 |
MÉDIA | 6.5 |
Para mim, o filme funciona muito bem, e não é nada disto que a crítica descreveu. Somente pessoas que cresceram com mães narcisistas irão compreender a mensagem do filme. Existem muitas "mães" como a dita retratada no filme, ou que agem de maneira até pior para com seus filhos, e os filhos, coitados, amam estes projetos de mãe porque ficaram completamente a mercê da carência. No mais, recomendo que leiam Chi no wadachi que retrata o mesmo tema do filme.
Acho que sua crítica ao filme, vale mais para o próprio artigo. Raso e sem profundidade. Se compreendesse a cultura japonesa, entenderia ao menos que as crianças são disciplinas para obedecer aos pais desde cedo, isso é o senso comum. A alienação parental é um crime comum no mundo todo, e feita principalmente pelas mães. Mães narcisistas são muito mais comuns do que se imagina. No Brasil, onde o progressismo domina, a degeneração dessa geração criada por mães solteiras é muito pior
Não concordo com a sua crítica. Na minha visão, Laço Materno é um filme difícil de engolir. Essa mãe não tem absolutamente nada que possa justificar seu comportamento; Ela passa o tempo todo manipulando o mundo para lhe dar dinheiro - ela não quer trabalhar e se diverte com homens iguais a ela. Na maior parte do filme, o foco está na criança - um filho que parece destinado a uma infância de abusos e dor. Há um nível de crueldade exibido neste filme da Netflix, que faz o público questionar os motivos de mães que não querem fazer o que é certo pelos filhos. O pai, igualmente sem dinheiro, mas ainda assim faz sua contribuição mensal, o que já é alguma coisa. Para a mãe, tudo é dinheiro, manipulação e fraude. A criança é jogada numa vida que, conforme a perspectiva do público, nada faz sentido, tudo é selvagem e é uma enxurrada constante de ameaças. O termo “Somos todos filhos de Deus” é difícil de imaginar quando um filme como este mostra o que algumas crianças têm que passar por causa de uma educação cruel e abusiva. A criança não reage, pois não tem coragem.. Sua mãe o enquadra de forma que o menino fica preso, mas também emocionalmente incapacitado . A diretora derrama seu coração em cada cena para demonstrar como o menino se sente enquanto sua mãe age erraticamente e vai de um projeto para o outro. E é bastante comum que crianças em lares abusivos fiquem assim. O egoísmo dessa mãe é quase patológico,. Ela exibe crueldade, e a mantém em um nível constante nas 2 horas de filme. Um filme como este precisa de um ótimo desempenho e eles são ótimos. O elenco consegue mostrar autenticidade e naturalidade em suas performances. Tudo parece real. Não há uma resposta à vista, apenas melancolia geral. Laço Materno é o trabalho de uma diretora visionária, destacando uma vida familiar desestruturada e abusiva.
Concordo com a crítica, o filme poderia ser mais interessante, adentrando a abordagem íntima dos personagens e as questões que traços sentimentais doentios e por vezes apenas exacerbados nas cenas. Explorar sob um olhar mais sensível algumas questões tão ricas.