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Sinopse

Em 1961, o governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, liderou um movimento sem precedentes na história do Brasil: a Legalidade. Lutando pela constituição, mobilizou a população na resistência pela posse do presidente João Goulart. Em meio ao iminente golpe militar, uma misteriosa jornalista se via envolvida diretamente nos rumos do país.

Crítica

Um dos elementos centrais de Legalidade, mais novo filme do cineasta Zeca Brito, é a paixão de Leonel Brizola (Leonardo Machado) pelos ideais democráticos da nação brasileira. Isso fica bem posto nas manifestações inflamadas do então governador do Rio Grande do Sul após a renúncia do presidente Jânio Quadros em 1961 e a ameaça iminente de golpe militar – que, infelizmente, se concretizaria poucos anos depois. Nesses instantes, nos quais a câmera de detém na demonstração dos brios de um estadista absolutamente apaixonado pelo povo, o ator mimetiza com acuidade seus trejeitos, a peculiar expressão de uma entonação vocal que conferia o devido peso às palavras. Todavia, a trama não fica restrita ao personagem principal, se espraiando por outras narrativas que tangem àquele momento histórico, passando pelos afetos e atos de Cecilia (Cléo Pires), jornalista brasileira radicada nos Estados Unidos que retorna ao país natal justamente em meio à grave crise.

Legalidade estabelece várias frentes, conferindo peso semelhante aos arroubos amorosos e aos ímpetos de resistência. A direção de arte nem sempre remonta com qualidade aos períodos retratados, o que restringe determinados planos. Essa artificialidade visual se estende às interpretações, como a de Cléo Pires, incapaz de atribuir a Cecilia a ambiguidade que lhe é tão importante, inclusive como exemplo das peças ardilosamente orquestradas num jogo geopolítico cujas regras são ditadas por nações economicamente dominantes. Tonho (José Henrique Ligabue) é o jornalista jovem, idealista, logo apaixonado pela “forasteira” com ares de femme fatale. Adiante, o triângulo amoroso, desenhado com a entrada em cena do antropólogo Luis Carlos (Fernando Alves Pinto), toma espaço demasiado no enredo, cumprindo a função de dispor certas peças, mas escorregando no que diz respeito ao âmbito emocional, pouco verossímil na dinâmica íntima vista em meio ao caos.

Outro problema sensível em Legalidade é a propensão ao didatismo. Em vários instantes do longa-metragem personagens explicam de forma pormenorizada o que está acontecendo, pavimentando o conjunto de informações, mas esvaziando o discurso do ponto de vista dramático, tornando-o menos efetivo pela ausência de matizes. A utilização de imagens de arquivo, dispositivo que frequentemente entrecorta a narrativa, parece bem mais um artifício para compensar certas debilidades da produção, assim supostamente conferindo genuinidade a sequências pontuais, isso para além do entrelaçamento formal entre verdade e encenação com intuitos estéticos. Há três linhas temporais no roteiro. A primeira dá conta do começo dos anos 60, entendido como presente, justamente quando estoura o conflito. O segundo, o passado não muito recente, serve meramente de explicação do envolvimento de Luis Carlos e Cecilia, embora nele haja instantes relevantes, como o contato com Che Guevara (Ignacio Leon). No presente, uma filha desavisada procura pela mãe.

Blanca (Letícia Sabatella) representa os que buscam a verdade arquivada nos porões da História. Todavia, seu núcleo de pesquisa, afora as possibilidades de colocar dados nesse caldo pedagógico, serve para adicionar uma nesga de consequência, a fim de mostrar que escarafunchar o ontem é essencial para compreender o agora. Legalidade, porém, seja por suas inabilidades técnicas (exceção feita ao esmero fotográfico a cargo de Bruno Polidoro) ou por conta da incapacidade de definir circunstâncias a partir de focos consistentes, não consegue ir além da pura exposição de exemplos que deveriam nos servir na atualidade igualmente embotada por uma tensão sócio-política considerável. Um indício da fragilidade do filme de Zeca Brito é o questionamento de Neusa Brizola (Juliana Wolkmer) ao marido sobre a natureza de sua impetuosidade, se civismo cego ou vaidade. Sem a exploração desse dado humano, que extrapola a esfera ideológica, a pergunta se transforma num ruído, tal como outros que gradativamente empalidecem os enunciados relativos à bem-vinda luta.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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Marcelo Müller
4
Robledo Milani
4
MÉDIA
4

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