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Crítica

Roger Ebert é considerado um mestre por muitos críticos de cinema. Escritor reconhecido, dono de um conhecimento monstruoso sobre a atividade que dedicou boa parte de sua vida, Ebert provocava deleite naqueles que acompanhavam seus textos, pois era possível aprender muito sobre a sétima arte com eles, além de termos um ponto de vista interessante sobre cada obra em questão. Foi também importantíssimo para a crítica cinematográfica em si, tendo ajudado a popularizá-la. Sua morte, em 2013, foi uma tristeza não só para seus admiradores, mas para o cinema de modo geral. Na época, Steve James (mais conhecido por seu trabalho em Basquete Blues, 1994) estava realizando um documentário sobre Ebert baseado em seu livro de memórias, Life Itself. Sem saber, o diretor terminou captando alguns dos últimos momentos da vida do crítico. O resultado é um documentário que faz jus a grande pessoa que Ebert foi.

Em Life Itself, Steve James faz um belo apanhado da vida de Roger Ebert, passando por momentos como sua chegada ao jornal Chicago Sun-Times, a consagração com o Prêmio Pulitzer (ele foi o primeiro crítico de cinema a receber a honraria), a parceria com Gene Siskel e o casamento com sua amada Chaz. James faz isso ao mesmo tempo em que mostra o impacto que o trabalho de Ebert teve, além de acompanhá-lo em suas idas e vindas ao hospital para tratar o câncer que tanto o afligiu nos últimos anos.

Mesmo com a batalha por sua saúde, Ebert ainda era capaz de dar um sorriso contagiante, de alguém que se encontra feliz mesmo com os obstáculos que enfrenta. Isso não é surpresa alguma, considerando a força e o amor que vêm de toda sua família. Não à toa, muitos aparecem dizendo que Ebert se tornou uma pessoa muito melhor depois que se casou. E como podemos ver ao longo do filme, esse sorriso também vem de alguém que teve uma grande vida, algo que o realizador mostra de maneira bem completa através de imagens de arquivos, fotos e depoimentos de pessoas próximas ao jornalista.

Em meio a isso, é interessante acompanhar o profissional influente que Roger Ebert se tornou, algo que veio em parte graças ao programa de TV que apresentou durante anos ao lado de Gene Siskel. Assim como era com Pauline Kael, as críticas de Ebert poderiam ajudar a dar mais atenção a um filme. Nesse aspecto, ver o excepcional documentarista Errol Morris dizer que deve sua carreira a Ebert é absolutamente notável. O mesmo pode ser dito sobre Martin Scorsese (que, inclusive foi produtor executivo do documentário), que afirma que o apoio que Ebert e Siskel deram a ele o ajudou num período difícil, quando teve problemas com drogas. No entanto, Ebert era um profissional íntegro, e por mais que fosse amigo e entusiasta de alguns cineastas, isso não o impedia de reconhecer quando via um filme problemático feito por eles (o “Ops!” que Scorsese solta em determinado momento soa divertido por isso).

Mas o que surpreendente em Life Itself é o fato deste ser um filme que não teme exibir um lado mais falho do biografado, revelando uma honestidade admirável em sua narrativa. Ebert teve problemas com álcool durante um bom tempo (ficamos sabendo que ele quase parou embaixo de um ônibus por causa disso), além de ser dono de uma arrogância desafiadora, que poderia irritar as pessoas que entrassem em uma discussão com ele. Steve James até insere alguns embates entre Ebert e Siskel, e é difícil não se sentir um pouco desconfortável pelo modo como eles discutem, com um tentando destruir o outro. Aliás, com relação a essa parceria marcante, ainda que os dois críticos entrassem em disputas tensas, é inegável que havia amor e respeito entre eles. Por isso mesmo, é emblemático que o filme traga dois momentos em que a dupla grava um comercial para seu programa de TV, sendo que no primeiro brigam e se xingam, enquanto que no segundo brincam e se divertem.

Life Itself é um documentário que causa reações diferentes ao longo de sua narrativa. Em uma hora pode divertir com naturalidade, em outra pode emocionar sem ser piegas. Mas acima de tudo, é uma homenagem maravilhosa a uma figura que merece todo o reconhecimento possível pelo que representou tanto como pessoa quanto como escritor. Roger Ebert era conhecido por seus “thumbs up” e “thumbs down” (polegares para cima e para baixo), que marcavam as notas que dava aos filmes. Life Itself certamente faz por merecer seus “thumbs up”.

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