Crítica
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Sinopse
Crítica
Os filmes de roubo, também conhecidos como heist movies, podem ser considerados uma instituição cinematográfica. Sua estrutura clássica contempla uma missão praticamente impossível de arrombamento e/ou assalto que, por sua vez, resulta de uma extraordinária engenharia – possível pelo envolvimento de gente com habilidades complementares. A saga Onze Homens e um Segredo exemplifica bem o modelo utilizado várias vezes e em circunstâncias diversas – como em Army of Dead: Invasão de Las Vegas (2021), ambientado num mundo pós-apocalíptico repleto de zumbis. Então, não foram os responsáveis por La Casa de Papel (2017-2021) que criaram essa lógica, no máximo a reaproveitando competentemente (um feito). Lift: Roubo nas Alturas não pretende “inventar a roda”, seguindo obedientemente os preceitos do filme de roubo. Há um líder carismático por quem os comparsas dariam a vida; um interesse amoroso para apimentar as coisas; além de mestres em disfarces, arrombamentos, tecnologia e pilotagem. E, claro, um vilão caricatural cheio de grana que utiliza seu poder para acumular mais poder. Tudo está ali, sem tirar nem por. O cineasta F. Gary Gray percorre a cartilha do filão e aplica praticamente todas as suas regras. Porém, o resultado é medíocre. Não por conta do reaproveitamento de tipos e situações (isso faz parte), mas pela falta de ânimo e brilho próprio.
Lift: Roubo nas Alturas traz algo inusitado: Kevin Hart como protagonista dramático. Ele interpreta Cyrus Whitaker, líder de uma quadrilha internacional especializada em roubo de obras de arte. Pouquíssimo afeito a gracinhas durante o planejamento detalhado e a execução do seu ganha-pão, Cyrus está distante dos personagens que notabilizaram o ator norte-americano como um dos comediantes mais famosos do mundo. Por um lado, é bem-vindo esse desafio encarado pelo artista, o de escapar à sua imensa zona de conforto. Por outro, fica evidente ao longo do filme que Hart poderia ter contribuído mais à trama caso relaxasse a musculatura do rosto e injetasse algumas doses de graça num protagonista que, por convenção, tende a ser charmoso e irresistível. Hart até que convence bem como esse sujeito cirúrgico que tende a lidar de modo pragmático com seus sentimentos, mas é visível que está contendo a sua essência em prol desse passeio distante da comédia. Em diversas cenas há óbvias deixas para ele acrescentar tiradas espirituosa que poderiam quebrar, mesmo que momentaneamente, a sisudez do plano mirabolante executado em conjunto com a Interpol. O encarregado dos alívios cômicos é Billy Magnussen, ansioso e acelerado arrombador de cofres. Mas, como a tônica dominante parece ser “evitar que Hart tenha recaídas”, o humor é constantemente asfixiado durante essa aventura.
O vilão é vivido por Jean Reno. Jorgensen é um daqueles ricaços que influenciam negativamente o mundo com a ajuda dos bilhões acumulados em conta. Restrito a mandar e praguejar à distância, é um tipo que nunca (ou quase nunca) coloca a mão na massa. Ele terceiriza a ação. Outra figura arquetípica e de existência meio burocrática é o pretensioso chefe da Interpol interpretado por Sam Worthington, alguém que existe em Lift: Roubo nas Alturas como sinal da dubiedade moral das autoridades, o típico homem da lei que teria atitudes ainda menos nobres caso estivesse lotado do outro lado da ação. A falta de espessura emocional e psicológica desse sujeito engessado, que deveria servia para revelar a complexidade humana, é um indicativo do porquê esse filme tende a ser rapidamente esquecido em meio ao manancial de estreias diárias no streaming. Assim como ele, os demais homens e mulheres do longa-metragem parecem funcionários batendo o ponto por obrigação, ou seja, sem demonstrar paixão ao desempar suas atribuições. F. Gary Gray não injeta algo que nos mobilize nessa jornada, de certa forma, previsível na qual motivações individuais são soterradas pela constante falta de interesse. Nem mesmo a conexão entre os parceiros de crime é suficiente para temermos por algo como, por exemplo, a dissolução do grupo ou mesmo o fracasso da missão e a consequente tragédia global.
Também falta senso e urgência a Lift: Roubo nas Alturas. As cenas de ação não empolgam e, como boa parte dos outros componentes narrativos, parecem existir somente como pagamento de tributo ao cânone do filme de assalto, ou seja, precisam existir senão podem descaracterizar a proposta. Outra lástima é reduzir a personagem de Gugu Mbatha-Raw, outra que poderia representar a ambiguidade moral, ao troféu que deve ser alcançado pelo protagonista esforçado em parecer infalível e irresistível. Sem dúvida, o coadjuvante mais interessante é o “mestre dos disfarces” de Vincent D’Onofrio. Dentro de uma equipe com tantas habilidades mais úteis, ele parece um bobo da corte assimilado pela boa vontade do líder. Mais à frente, essa capacidade de parecer o que não é se mostra imprescindível ao plano estrambólico de sabotar a transação internacional a bordo de um avião de luxo. Contudo, F. Gary Gray faz pouco com essa quebra de expectativa, sobretudo porque também utiliza esse personagem somente como indício do seu compromisso com o filão, nada mais. Já a presença de Úrsula Corberó parece especificamente um modo de atrair fãs de La Casa de Papel – ela interpreta Tóquio na série espanhola de sucesso. Por fim, ainda dentro da análise dos desperdícios, Paul Anderson, um dos destaques de Peaky Blinders (2013-2022), é tratado quase como um figurante, do tipo que precisa aparecer e morrer.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Marcelo Müller | 5 |
Leonardo Ribeiro | 4 |
Francisco Carbone | 5 |
MÉDIA | 3 |
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