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Crítica


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Sinopse

Laura é uma mulher que leva uma vida tranquila e que faz o possível para ajudar as pessoas. No entanto, seus desejos e sua generosidade entram em conflito quando precisa levar Jack, seu pai - e também é um criminoso - em uma viagem de carro do Texas até a Califórnia. Os dois - e Henry, filho dela e neto dele, que também vai junto - irão aprender da maneira mais confusa e difícil o que significa ser uma família.

Crítica

Basta ler a sinopse de Limites, longa escrito e dirigido por Shana Feste (a mesma da desnecessária refilmagem Amor Sem Fim, 2014), para que a impressão se confirme: você já viu esse filme antes. E não apenas você: a realizadora, os atores, qualquer um na audiência – todo mundo já assistiu a essa mesma história. Talvez tenham mudado o elenco, a época ou o argumento, mas o enredo é basicamente o mesmo: dois protagonistas, aparentemente antagônicos, empreendem uma longa viagem que não só irá mudar a forma como veem um ao outro, mas também o modo como lidam com suas responsabilidades no mundo. Podem ser desconhecidos (Antes só do que Mal Acompanhado, 1987), um maluco e um certinho (Um Parto de Viagem, 2010), ladrões (Não Somos Anjos, 1989) ou até mesmo um casal prestes a se apaixonar (Depois Daquela Montanha, 2017). As variáveis se alternam, mas o resultado é sempre o mesmo. Desta vez, o drama é familiar. Há quem adore acompanhar uma boa lavação de roupa suja. Mas até para o circo pegar fogo é preciso combustível, algo aqui parece estar em falta desde os primeiros instantes.

Laura (Vera Farmiga, que apesar de ter no currículo uma indicação ao Oscar – Amor sem Escalas, 2009 – e uma série de sucesso, poucas vezes assumiu a condição de protagonista, como aqui faz com certa eficiência) evita as ligações do pai. Para suprir a carência paterna, que obviamente lhe deixou traumatizada, vai para a cama com qualquer homem que não lhe dê muito valor, ao mesmo tempo em que recolhe para casa todo gato ou cachorro que encontre desabrigado. Quem precisa lidar com isso é o filho único, o adolescente Henry (Lewis MacDougall, de Sete Minutos Depois da Meia-Noite, 2016), um garoto solitário que, obviamente, também tem seus problemas: sofre bullying na escola, não tem amigos e passa o tempo livre retratando as pessoas que conhece em constrangedoras posições nuas.

A jornada dos dois começa quando, após finalmente atendê-lo, ela descobre que o pai (Christopher Plummer, dono de um carisma que apenas a experiência proporciona) está sendo expulso do asilo onde mora. Como o velho tem caráter duvidoso, ela até aceita atravessar o país para levá-lo à casa da irmã, mediante uma condição: após a viagem, ele lhe dará o dinheiro suficiente para que possa inscrever o filho em uma escola especial para jovens superdotados. Ele concorda, e os três caem na estrada. O que a filha não sabe, e nem desconfia, é que o motivo do homem ter sido colocado para fora do lar de repouso foi uma criação de maconha que cuidava clandestinamente. Com o produto bem acomodado entre as fraldas geriátricas, o que pretende é fazer paradas estratégicas pelo caminho e, com isso, ir atendendo a consumidores fieis. E, com o valor arrecadado, pagar a dívida assumida.

Se o tema “consumo de drogas” parece transgressor o bastante, é melhor não se enganar: a trama de Limites é convencional até o último fio de cabelo, das queixas da filha que se sentia abandonada (“você sabe quantas vezes fiquei sem dormir, esperando por você, que nunca estava por perto?”) às desculpas esfarrapadas do pai (“lamento que você tenha sentido medo”) e do ex-marido (“a melhor coisa que você já fez foi ter terminado comigo”), passando pelas estranhices do garoto (“pensei que seríamos colegas de quarto por toda a vida”). Cada um dos envolvidos são meros tipos, e toda tentativa de dotá-los de alguma profundidade logo esbarra em clichês mal resolvidos e respostas prontas. As figuras que vão encontrando pelo caminho – o velho maluco (Christopher Lloyd), o galanteador irresponsável (Bobby Cannavale), o astro decadente (Peter Fonda) – apenas reforçam esses preconceitos, mostrando-se mais como episódios descartáveis do que como elementos capazes de acrescentar algo de valor ao enredo.

Se há algo que faça Limites valer o esforço de atravessar seus mais de 100 minutos de duração são, mesmo, as presenças de Vera Farmiga e Christopher Plummer. Mesmo defendendo diálogos pouco criativos e tendo que lidar com resoluções previsíveis, os dois possuem química juntos, e formam uma boa dupla como pai e filha. Não é nada que vá acrescentar algo de peso às filmografias de ambos, ainda mais depois da participação marcante dele em Todo o Dinheiro do Mundo (2017) – pelo qual recebeu sua terceira indicação ao Oscar – ou do adeus dela ao incensado seriado Bates Motel (2013-2017) – que lhe valeu uma indicação ao Emmy. É possível vislumbrar, no entanto, quão diferente seria esse filme se estivéssemos diante de Sandra Bullock e Jack Nicholson, por exemplo, nos mesmos papéis, mas muito mais afeitos a lidar com as convenções do gênero. E se por um lado a diversidade é válida, por outro é preciso reconhecer que há um preço a ser pago. Às vezes, alto demais pelo que entrega.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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