Crítica
Leitores
Sinopse
Em Lobisomem, um homem deve proteger a si mesmo e sua família quando eles são perseguidos, aterrorizados e assombrados por uma criatura mortal à noite durante a lua cheia. Mas conforme a tempo avança, ele próprio começa a se comportar de forma estranha. Mesmos responsáveis por O Homem Invisível (2020).
Crítica
Um dos grandes problemas relacionados ao sucesso de um projeto com potencial de se desdobrar em franquia é a ânsia dos produtores em lucrar ao máximo com esse momentum, que invariavelmente acaba se traduzindo na realização de sequências feitas a toque de caixa, uma atrás da outra, até um inevitável esgotamento da fórmula. Leigh Whannell e Jason Blum, respetivamente diretor e produtor, felizmente se mostram propensos a trilhar caminho inverso em suas releituras sobre os famosos monstros da Universal. Após o positivo impacto da estreia de O Homem Invisível (2020), eles esperaram cinco anos para novamente se aproximar desse contexto, e o resultado é mais uma vez interessante, no mínimo: Lobisomem é, ao mesmo tempo, uma abordagem discreta sobre o mito, quase como um conto à parte, como uma singela piscada de olhos em direção ao clássico, não tanto uma refilmagem, mas uma nova leitura, uma adaptação moderna. E o que alcança, tanto num intento, como noutro, é igualmente digno de nota.
Antes de se entrar nos meandros dessa nova trama, algo chama atenção. Ao contrário dos anteriores O Lobisomem (1941), com Lon Chaney Jr., ou do mais recente O Lobisomem (2010), com Benicio Del Toro, esse de agora se chama apenas Lobisomem, sem o artigo. A semiótica é óbvia: trata-se, portanto, de um ser amaldiçoado, talvez mais um dentre tantos, e não do homem-lobo em si, do primeiro e original, responsável por toda uma história de desgraça e mortes. Não há irmão desaparecido, uma jovem donzela em perigo ou ciganos com superstições estereotipadas. Estes elementos ficaram para trás. No entanto, um segue vívido: o acerto de contas entre pai e filho. É justamente essa a questão que coloca uma família em crise rumo ao fantástico e aterrorizante.
Blake foi criado sozinho pelo pai em uma fazenda ao pé da montanha, em um lugar distante de tudo e de todos, rodeado por um bosque quase impenetrável. Logo no começo da história, um letreiro se detém em explicar uma lenda sobre um trilheiro que, ao se aventurar por entre as árvores da região, nunca mais foi visto, tendo provavelmente morrido. Outros, no entanto, afirmam que ele teria contraído uma doença local, a tal “febre do lobo”, e seguia vivo até hoje, porém adotado um comportamento selvagem. Blake foi ensinado a se defender por aquele que se demonstrava disposto a tudo para garantir a segurança do garoto, mesmo que seu modo radical de agir tenha terminado com o afastamento do filho. Trinta anos depois, adulto, casado e ele próprio agora pai, a notícia chega que aquele que o criou, há anos desaparecido, foi declarado oficialmente morto. É chegada a sua vez, portanto, de voltar à casa para se desfazer daquilo que restou.
Se O Homem Invisível tinha, por detrás da fantasia, uma importante discussão a respeito de assédio, comportamento abusivo e misoginia, em Lobisomem o debate também resgata um tema urgente e contemporâneo: a masculinidade frágil, que tem sido combatida e apontada por movimentos como o dos red pill, por exemplo. Blake é visto como um homem emasculado, por assim dizer. Ele e a esposa, Charlotte, são profissionais da escrita. Se ela chega em casa em meio a ligações de trabalho, entre novas demandas e compromissos, ele, por sua vez, se encontra “entre empregos”, como afirma – ou seja, está desempregado. Portanto, é quem cuida da casa e da filha. Numa relação igualitária, tal dinâmica seria perfeitamente normal. Mas o marido se sente diminuído. Reclama quando vê a esposa sendo solicitada, e garante ter toda a atenção da menina deles para si, por mais que afirme à companheira que ela é uma “excelente mãe” – o que a própria coloca em dúvida. Despertar o monstro em si era questão de tempo.
Curt Siodmak, autor do roteiro de O Lobisomem (1941), se interessava tanto por essa analogia que, em sua primeira versão, a fera nem chegava a dar às caras, permanecendo apenas como sugestão, restando a dúvida se a transformação seria real ou um delírio do protagonista. A Universal não gostou da ideia, e mandou deixar tudo bem explícito. Oito décadas depois, as coisas parecem ter mudado, ainda que não tão radicalmente quanto se poderia esperar. Christopher Abbott se mostra um lobisomem assustador, principalmente por sua mudança não ser instantânea, mas parte de um processo que vai lhe consumindo aos poucos. A dinâmica estabelecida entre ele e a criança, assim como a manutenção de um constante clima de tensão, não lhe é estranha, e remete o espectador ao thriller Ao Cair da Noite (2017), por mais que sejam distintas as nuances por aqui exploradas. Outra presença que impressiona é a de Julia Garner, que no papel da esposa precisa fazer frente ao perigo que se aproxima, tanto físico, quanto no âmbito familiar. Ao longo de uma noite, homem e fera irão se enfrentar. E Lobisomem cumpre bem a tarefa de mostrar que esse é um embate cuja resolução é bem mais complexa do que se poderia desejar.
Últimos artigos deRobledo Milani (Ver Tudo)
- Maria Callas - 16 de janeiro de 2025
- Lobisomem - 16 de janeiro de 2025
- Ad Vitam - 12 de janeiro de 2025
Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Robledo Milani | 7 |
Alysson Oliveira | 4 |
Ticiano Osorio | 3 |
Francisco Carbone | 7 |
Ailton Monteiro | 7 |
MÉDIA | 5.6 |
Deixe um comentário