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Sinopse

Mesmo em dificuldades financeiras, a jovem Bathsheba Everdene não quer casar como forma de garantir seu futuro. Adiante, ela herda uma fazenda e decide coordenar a propriedade. Cortejada por um vizinho, ela se apaixona na verdade por um militar que carrega um enorme trauma amoroso.

Crítica

Pouco se sabia de Thomas Vinterberg quando o diretor dinamarquês apresentou The Biggest Heroes (1996) e Festa de Família (1998), apenas alguns anos após a formatura na Escola Nacional de Cinema da Dinamarca, em 1993. Em 1995, junto com outro diretor desconhecido de nome Lars von Trier, formariam o Dogma 95, um movimento que buscava recuperar os aspectos orgânicos do cinema em detrimento do uso excessivo de tecnologia, predominante nos grandes estúdios. Por essa trajetória, Vinterberg jamais pisaria no set de Longe Deste Insensato Mundo.

FAR FROM THE MADDING CROWD

O mundo, porém, dá voltas e Vinterberg não apenas pisou no set como dirigiu o filme, adaptação da obra mais famosa do escritor inglês Thomas Hardy (1840 - 1928). Ambientado na Inglaterra de 1870, o longa conta a história da jovem Bathsheba Everdene (Carey Mulligan)  a partir da sua chegada para viver junto às terras dos tios. Bonita, mas sem grandes talentos, Everdene parece destinada a compor o mundo passivo das mulheres da época. No entanto, um sentimento íntimo de independência e a morte do avô, que designa Bathsheba como a única herdeira das suas propriedades, descortinam novas possibilidades para a personagem.

Escrito por David Nicholls, o roteiro desenha um enredo que, por um lado, centraliza as atenções sobre o que se pode considerar como o movimento inicial das mulheres em direção à participação social - vale lembrar que a obra de Hardy está no mesmo compasso do protagonismo feminino de Madame Bovary (1856), de Gustave Flaubert - e, por outro, constrói o núcleo de romances vividos por Everdene e seus pretendentes Gabriel Oak (Matthias Schoenaerts), Francis Troy (Tom Sturridge) e William Boldwood (Michael Sheen).

Film Far From The Madding Crowd

Em comparação ao filme de John Schlesinger, adaptação homônima realizada em 1967 com Julie Christie no papel da protagonista,  a mudança mais significativa - além de reduzir o filme de três para duas horas - está em fazer com que o núcleo amoroso não seja mais uma disputa de igual para igual entre os concorrentes ao coração da jovem, mas prefira aprofundar a relação dela com o pastor de cabras Oak. Ancorada ainda pela inversão de papéis, uma vez que o pastor passa a ser subordinado à dona das terras, a decisão faz sentido se tomarmos a  duração do filme como uma característica a ser levada em consideração. Não bastasse ter de lutar para atenuar diferenças (falas, costumes e questões morais) de um mundo distinto, projetos de época sabem da dificuldade que qualquer filme sem a megalomania vazia de Transformers (2007) tem para sobreviver.

A modificação da estrutura faz o desfecho de Longe deste insensato mundo ser apressado, sinal de que provavelmente a história tinha mais a nos dizer, condizendo com o ritmo imposto desde o início, mas que causas externas fizeram a edição de Claire Simpson (de O Leitor, 2008) se encarregar de podá-lo. Nada que prejudique essencialmente o bom trabalho de direção de Vinterberg. Por vezes, há um rebuscamento inimaginável para um dos criadores de uma estética minimalista como o Dogma. Ao buscar planos grandioso - sempre auxiliados pela trilha pomposa de Craig Armostrong (O Grande Gatsby, 2013) - e closes em momentos forçadamente dramáticos, a direção procura reproduzir - com mais acertos do que erros - a imposição melodramática do século XIX.

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Se a mise-en-scène é bem conduzida por Mulligan e Schoenaerts - ela acertando o tom do início ao final enquanto ele orbita a proposta de Carey com correção, chama atenção a composição técnica entre a fotografia de Charlotte Christensen (parceira do diretor no excelente A Caça, 2013) e a direção de arte de Kave Quinn (Trainspotting: Sem Limites, 1996). A alternância entre as cores externas (predominância de verde e azul) e as internas (com tons escuros e alto contraste) exercitam na tela do cinema a ambivalência entre o mundo da liberdade exterior e o da insegurança interior. Longe Deste Insensato Mundo não é um filme provocador e instigante como A Caça, pois as circunstâncias não o permitem - seria preciso retroceder pelo menos cem anos para tal. Contudo, a forma como Vinterberg aborda o traço psicológico de suas histórias é o que o garante como um dos melhores diretores da nossa época, e faz dos seus filmes, mesmo quando adaptações para o cinema de gênero - valerem a pena.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação dos Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul, e da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Tem formação em Filosofia e em Letras, estudou cinema na Escola Técnica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Acumulou experiências ao trabalhar como produtor, roteirista e assistente de direção de curtas-metragens.
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