Love Lies Bleeding: O Amor Sangra
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Rose Glass
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Love Lies Bleeding
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2024
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Reino Unido / EUA
Crítica
Leitores
Sinopse
Uma história de amor ambientada nos anos 1980. Lou é uma tímida gerente de academia e Jackie uma ambiciosa fisiculturista. Mas, um ato de fúria impensado as coloca juntas numa rota de sangue e vingança.
Crítica
Muitos filmes e séries recentes recorreram à estética dos anos 1980 como impulso nostálgico. Neons, sintetizadores, cores berrantes, cortes de cabelo extravagantes, figurinos exagerados e comportamentos próprios à época estão na moda, ditando o que podemos considerar uma tendência saudosista. O novo exemplar dessa abordagem é Love Lies Bleeding: O Amor Sangra, filme que tem como protagonista Lou (Kristen Stewart), atendente queer de uma academia de musculação. Aliás, a cineasta Rose Glass apresenta esse cenário enfatizando os seus traços oitentistas, vide os homens de peitos peludos e as mulheres vestindo roupas justas e cintilantes, entre outras coisas. A proximidade da câmera com esses corpos suados e hiperestilizados em planos-detalhe anuncia a abordagem fetichista, cujo interesse é observar pessoas em busca de algo. Outro traço comum é a construção de imagens e/ou situações simbólicas, como o fato de Lou começar a trama tentando desentupir uma privada que tende a enguiçar novamente. Trata-se de uma metáfora sobre a sua vida entalada de problemas persistentes, obstruída por dejetos do passado que inconvenientemente tendem a vir à tona perturbando a pouca paz conquistada. A direção de Rose é estilosa, se orgulha do artifício e tem um quê de conto de fadas às avessas. Os signos dos EUA bélico e cultor da violência são utilizados como marcas de um pertencimento.
Mais ou menos como fizera David Lynch no febril Coração Selvagem (1991), Rose Glass insere um relacionamento fogoso nesse mundo hiperbólico. No caso, o envolvimento é de Lou com Jackie (Katy O'Brian), a forasteira de passagem pela cidade enquanto aguarda o começo da competição de fisiculturismo em Las Vegas. O corpo sarado de Jackie hipnotiza Lou e a cineasta transfere à câmera (representante do nosso olhar) esse encantamento sugestivo de uma paixão à primeira vista. Conforme as cartas vão sendo colocadas na mesa em Love Lies Bleeding: O Amor Sangra, percebemos que as amantes possuem coisas em comum, por mais que pareçam pessoas completamente diferentes. Por exemplo, ambas têm questões físicas a resolver. Lou passa o longa-metragem lutando contra o vício banal em cigarros, inclusive recorrendo àqueles programas de incentivo gravados em fitas cassete. O tabaco é uma espécie de muleta que a faz lidar melhor com certas angústias entranhadas. Já Jackie tonifica o corpo para fazer dele uma fortaleza, estrutura sólida o suficiente para suportar algo que nunca é esmiuçado na história. Então, assim como os personagens de Nicolas Cage e Laura Dern no longa de Lynch, Lou e Jackie experimentam um vínculo intenso que as conecta no mundo hostil. Mas à medida que o enredo avança, somos mergulhados de maneira contundente na sordidez da disfuncionalidade familiar.
Love Lies Bleeding: O Amor Sangra se concentra durante um bom tempo no relacionamento de Lou e Jackie, sempre com destaque à carnalidade desse romance em brasa. Rose Glass reforça a observação de Jackie como alguém em processo de crescimento muscular, sobretudo depois da administração de anabolizantes que a ajudam a chegar numa forma ideal. Gradativamente, essa personagem perde os contornos lógicos e se transforma numa montanha de músculos reativa, a serviço de impulsos primários, enquanto Lou vai tendo revelada parte significativa do seu passado. Da família, ela é a única que não aceita de bom grado os vínculos amorosos atrelados a manifestações de violência. Seu pai, interpretado por Ed Harris, é o típico gângster que coloca a polícia na folha de pagamento a fim de se tornar no mandachuva local. Um patriarca que não enxerga com tanto espanto e indignação o fato de sua filha mais velha, Beth (Jena Malone), ser sistematicamente espancada pelo marido (interpretado por Dave Franco). Apernas Lou pensa em fazer algo contra o cunhado impune, dividindo com a cada vez mais anabolizada Jackie seus pensamentos inconfessáveis. Essa inconformidade com a violência atrelada aos vínculos afetivos mostra que Lou está disposta a romper um círculo vicioso que, por exemplo, sequestrou sua irmã e a condicionou a crer que os elos sentimentais precisam carregar consigo a aceitação das dores.
Love Lies Bleeding: O Amor Sangra derrapa um pouco ao moldar Jackie como uma potência física quase incontrolável à medida que escancara a disfuncionalidade familiar de Lou. Rose Glass puxa toda a atenção para a jovem que tenta desesperadamente se desvincular da influência paterna – sobretudo por intuir que se assemelha mais do que gostaria a esse pai perverso. A cineasta transforma a forasteira musculosa numa manifestação da força bruta – até chegar à ótima e inesperada cena em que toma liberdades poéticas para desenhar uma metáfora com gigantes garantindo heroicamente a vitória dos mocinhos. Ao longo da trama, a realizadora sugere timidamente essa interlocução figurada entre ordinário e extraordinário, ainda que, no fim das contas, o excepcional seja somente a liberdade poética utilizada para dizer algo indiretamente. Lou confrontando o pai gângster, tentando se emancipar da hereditariedade maldita e sentindo a necessidade de proteger as pessoas queridas, mesmo com a utilização extrema de violência, embaça a trajetória pessoal de Jackie. Ela é calculadamente transformada na besta-fera disposta a tudo para proteger e alcançar objetivos grandiosos. Rose Glass conta essa história alguns tons acima do realismo, anabolizando o acerto de contas com a família disfuncional ao administrar nesses corpos intensos injeções de desejo e agressividade, os adornando com ícones oitentistas.
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