Crítica


7

Leitores


3 votos 8

Onde Assistir

Sinopse

Luana e Emília se conhecem no primeiro dia de aula do último ano da escola e uma amizade floresce rapidamente. A relação intensa, divertida e explosiva entre as duas é interrompida quando uma foto de Luana é vazada nas redes sociais. Agora ela precisa escolher como pretende enfrentar a sociedade.

Crítica

Muitos filmes sobre amadurecimento que exploram o universo adolescente têm em um evento fatídico o gatilho para o início de uma jornada de autodescoberta e de descoberta do mundo. Em Luna, porém, ainda que parta da sugestão de uma iminente tragédia, o diretor Cris Azzi propõe uma estrutura narrativa que se mostra basicamente inversa, não apresentando de imediato os efeitos resultantes do fato potencialmente trágico, mas sim retornando no tempo para acompanhar o desenrolar dos acontecimentos que levaram até tal ponto. É durante este percurso que a protagonista, Luana (Eduarda Fernandes) acaba vivenciando experiências reveladoras, relacionadas especialmente ao desabrochar de sua sexualidade. Algo que tem real início com a chegada de uma nova aluna em sua escola, Emília (Ana Clara Ligeiro), que desperta a atenção da colega, levando ao estabelecimento de uma conexão imediata, que, com a mesma velocidade, evolui para a amizade e para a atração física.

Tal relação representa o abrir das portas de um novo mundo para a jovem, que vive em um bairro humilde com a mãe (Lira Ribas), e que Azzi registra imprimindo a mescla de sensações típicas da adolescência: com intensidade e ânsia por viver o máximo de experiências simultâneas, mas ainda carregando uma dose de pureza sincera. Assim, o diretor transita por sequências que exploram a descoberta do próprio corpo e de outros, todos envoltos por uma passionalidade e sensualidade latentes, mas sem cair na fetichização – por mais que o fetiche em si esteja presente nas descobertas de Luana, que assume uma personagem (a fantasia, a máscara, a “Luna” do título) – com a mesma desenvoltura que constrói momentos singelos e de inocência, como a cena das amigas jogando pedras na água e fazendo pedidos, conseguindo por vezes unir ambas facetas numa mesma sequência – como quando a mãe de Luana entra no quarto com o bolo de aniversário no momento em que a garota está se masturbando.

O cineasta demonstra delicadeza para captar os sentimentos envolvidos, bem como a realidade da sociedade atual e dos jovens que nela vivem, a começar pela relação destes com a imagem e com a exposição da mesma. Pois é justamente um vídeo íntimo vazado entre os colegas de escola que leva Luana à beira da resolução drástica que se anuncia nos primeiros minutos de projeção. Essa questão da imagem extrapola o discurso para adentrar o âmbito do registro em si, quando Azzi assume as gravações feitas pelos celulares dos jovens ou pela câmera do computador de Luana – na mensagem emocionada que grava para a mãe – como o registro principal. Além deste, outros tópicos atuais pontuam a trama, como diversidade, preconceito, bullying, feminismo, diferença de classes – no contraponto entre as condições de vida modestas da protagonista e a vida abastada de Emília (a casa com piscina, o carro, os pais viajando pela Europa).

Ainda que nem todos os elementos sejam inseridos de modo plenamente natural neste panorama, vide o debate político da abertura, de modo geral, a condução de Azzi, em seu primeiro longa solo de ficção, se mostra bastante segura, se destacando pelo domínio do espaço cênico – como no plano-sequência que percorre as reações dos alunos enquanto estes tomam conhecimento do vídeo de Luana  ou ainda no modo como sua câmera se movimenta acompanhando as personagens, como na apresentação de Emília, vista de costas pelos corredores da escola, preservando certo mistério, mas já sublinhando sua importância na narrativa. O mesmo vale para a concepção estética das sequências mais lúdicas e fantasiosas, caso da cena da festa para a qual a dupla protagonista se produz ou no delírio de Luana em meio às árvores do bosque.

Dentro do escopo dramático, alguns detalhes talvez careçam de um maior aprofundamento, como a questão envolvendo o pai de Emília – que acaba de alguma forma servindo como estopim para a virada na trama – ou ainda a relação de Luana com a mãe, que ganha força no ato final, mas é pouco explorada nos anteriores. Mesmo se considerando tais ressalvas, ao tratar de uma temática recentemente vista em outro bom exemplar nacional, Ferrugem (2018), mas com uma abordagem bastante distinta da investigação sobre o peso das consequências apresentada no longa de Aly Muritiba, Luna resulta contundente e equilibrado, sendo valorizado pelo trabalho de seu elenco. A dinâmica entre Ana Clara Ligeiro e Eduarda Fernandes se mantém sempre envolvente, com a segunda se destacando ao dar vazão a todos os conflitos de Luana numa atuação de entrega total, desde a primeira cena ao desfecho, que com seu misto de ingenuidade, idealismo e furor sintetiza o espírito adolescente.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
avatar

Últimos artigos deLeonardo Ribeiro (Ver Tudo)

Grade crítica

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *