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Crítica


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Sinopse

John Harrison é um treinador de time de basquete de ensino médio que tem seus sonhos arruinados quando a maior fábrica da cidade é fechada, o que obriga centenas de famílias a se mudarem. Relutante em abandonar o esporte, se vê obrigado a treinar corredores, o que acaba o unindo com uma inusitada atleta para ganhar a maior corrida do ano.

Crítica

Eu era um bêbado
Que vivia drogado
Hoje estou curado
Encontrei Jesus
Encontrei Jesus
Encontrei Jesus

Iniciamos esta crítica com um dos refrões do clássico popular "Xô Satanás", da banda Asa de Águia, porque ele remete exatamente a um trecho bem importante de Mais Que Vencedores. Tudo bem que filmes religiosos tendem a encampar mensagens de incentivo perante às tentações que a vida traz, nesta jornada tão cheia de pecados para quem perambula pela Terra, mas o novo longa dirigido por Alex Kendrick capricha nesta missão. Após um início até interessante, em que ensaia uma subtrama de fundo social em torno do impacto do fechamento de uma fábrica junto à população de uma pequena cidade, tudo é esquecido em nome do louvor a Deus. O que seria até aceitável, se a própria narrativa não apresentasse alguns absurdos, disfarçados em meio às boas intenções.

Com isso, partimos então à lista dos sete pecados capitais existentes em Mais Que Vencedores, nova peça panfletária religiosa a aportar aos cinemas brasileiros:

1) Os dois únicos personagens com histórico de problemas, um com furto e outro com drogas, são negros. Seus "salvadores" são todos brancos bem intencionados, escancarada metáfora social que o filme silenciosamente (e maldosamente) incute junto aos fiéis;

2) Uma fábrica é fechada, dezenas - talvez centenas - de pessoas perdem o emprego e são obrigadas a se mudar, e o treinador de basquete em momento algum se dá conta do impacto perante a sociedade. Mais importante é que o time colegial de basquete por ele dirigido perdeu seus principais atletas, o que elimina suas chances de ser campeão da temporada;

3) Ao descobrir o pai perdido da jovem Hannah em um hospital, o técnico e sua esposa sequer cogitam consultar a avó da garota antes de contá-la sobre a descoberta, com a ressalva de que Hannah era menor de idade. Ou seja, os "salvadores" brancos passam por cima da vontade da família em nome do "bem maior", recebendo o insólito apoio da diretora da própria escola. E a avó ainda é insinuada como vilã, muito graças à manipuladora trilha sonora;

4) Por mais que seja uma escola cristã, a diretora não pensa duas vezes antes de evangelizar Hannah - uma menor de idade, é bom lembrar -, sem sequer consultar a família para saber se este era o desejo da mesma;

5) Em meio a uma votação sobre a mudança de regra na prática de cross country, o treinador deixa de lado qualquer interesse no esporte em si em nome do que importa para sua pupila. Uma vez mais, o coletivo é ignorado em nome da individualidade, algo repetido algumas vezes no decorrer do filme;

6) Ao receber a incumbência de dirigir o time de cross country da escola, o treinador desmerece o trabalho por ter apenas uma atleta. "Não vale a pena ter uma equipe de apenas uma pessoa", ele diz, deixa perfeita para a mensagem de que toda pessoa, seja ela quem for, importa. Amém!;

7) Na audição de teatro da escola, o professor dispensa um aluno com a seguinte frase: "Nós não acreditamos em você, nota 7". Além da incoerência absoluta da nota em relação ao comentário, como se diz algo do tipo a um jovem que está iniciando seu interesse por algo tão complexo e desafiador quanto as artes cênicas? Inclusive, o professor de teatro tem trejeitos afeminados, estereótipo básico do meio artístico.

Os "salvadores" brancos e a "pecadora" negra

Diante de tais situações, todas apresentadas sob a aura da mais absoluta normalidade, fica escancarada a mentalidade dos roteiristas, os irmãos Alex e Stephen Kendrick, de que o louvor a Deus está acima de tudo e de todos, mesmo que haja um embasamento tão raso e frágil. Tecnicamente, Mais Que Vencedores até é bem feito e o roteiro tem algum mérito, especialmente na busca inicial por um certo humor envolvendo o cotidiano. Entretanto, a missão de catequisar a todo custo é tão forte que faz com que o filme deixe de lado o pouco que havia apresentado de positivo em seu primeiro ato, em busca de uma louvação maciça e contínua, entremeada por mensagens (supostamente) inspiradoras. Dá sono.

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Jornalista e crítico de cinema. Fundador e editor-chefe do AdoroCinema por 19 anos, integrante da Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) e ACCRJ (Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro), autor de textos nos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros", "Documentário Brasileiro - 100 Filmes Essenciais", "Animação Brasileira - 100 Filmes Essenciais" e "Curta Brasileiro - 100 Filmes Essenciais". Situado em Lisboa, é editor em Portugal do Papo de Cinema.
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