Crítica


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Onde Assistir

Sinopse

Na casa dos 40 anos, uma autora se submete a várias fertilizações artificiais, pois deseja ser mãe. A situação acaba colocando em risco o relacionamento dela com o marido, um produtor teatral e dono de um negócio, que está cansado de tentar ajudar a esposa a engravidar e não receber mais o mesmo carinho do início do casamento.

Crítica

Bastam alguns momentos para perceber o parentesco entre Mais Uma Chance e alguns filmes de Woody Allen. Essa proximidade passa, no entanto, ao largo do âmbito formal, até porque a realização de Tamara Jenkins não chega a ser necessariamente agridoce, como boa parte dos longas-metragens do colega veterano que, igualmente, acontecem em Nova York. O enredo deste é alicerçado por uma crise existencial/matrimonial bastante inclinada ao drama. As similaridades ficam por conta da observação de uma fauna nova-iorquina específica, de intelectuais de meia-idade que questionam os rumos de suas vidas, o que os levaram a tomar determinadas decisões em detrimento de todas as demais possibilidades. Os protagonistas são Rachel (Kathryn Hahn) e Richard (Paul Giamatti), ela dramaturga, ele um ex-ator e diretor de teatro que atualmente ganha a vida vendendo picles. A dupla está às voltas com a obsessão de ter um filho, lutando contra improbabilidades, recorrendo a toda sorte de tratamentos de fertilidade, frustrados por tentativas de adoção malfadadas e procedimentos malsucedidos.

Mais uma Chance parte da apresentação de uma rotina médica que, concomitantemente, altera de maneira drástica o cotidiano do casal. Injeções, consultas regulares, punções, exames para verificar a saúde de óvulos e espermatozoides, tudo isso é apresentado para ressaltar o fastio, físico e psicológico, que gradativamente vai minando Rachel e Richard. Uma personagem secundária menciona que tal busca tenaz pela viabilidade da gravidez é descabida, uma vez que o matrimônio vai mal. Todavia, não temos qualquer vislumbre que corrobore isso, fora as brigas compreensivelmente decorrentes de processos falhos em sequência e do crescimento de uma decepção. Assim como nos é negado um background mais significativo dos personagens, que sejamos instados a nos apegar nas poucas evidências surgidas em diálogos periféricos, a realizadora não demonstra muito afinco em investigar fundamentos, detendo-se, basicamente, em situações estabelecidas e suas consequências mais imediatas. Aqui, ações e reações ressoam por curtos espaços de tempo.

A entrada em cena da jovem Sadie (Kayli Carter) dá esperanças à dupla, uma vez que sua proximidade – ela é enteada querida do irmão de Richard – permite o investimento num método de doação de óvulos. Mais Uma Chance, embora possua ritmo aprazível, não aproveita devidamente sua duração para consolidar a relevância dos conflitos. Cynthia (Molly Shannon), a mãe da voluntária, discorda veementemente do envolvimento singular entre a filha e seus cunhados, como visto no jantar de Ação de Graças desmoronado pela notícia. Porém, Tamara Jenkins não confere peso suficiente a essa resistência, sequer dando oportunidade para a personagem desenvolver motivações e inquietações. O máximo que acontece é a deflagração de uma questão hormonal, que ensaia oferecer um panorama feminino, para isso associando, em certa medida, a mulher que deseja desesperadamente ter filhos, a que começa a sentir os primeiros sinais da menopausa e a que acabou de sair da adolescência e tem de lidar com as demandas da vida adulta. Infelizmente isso não decola.

Os personagens de Mais Uma Chance constantemente fazem referências a filmes, livros e peças de teatro, afirmando seu ambiente intelectual. O roteiro não demonstra preocupação em entender profundamente o que move cada pessoa, o que as leva a agir. Figuras como Sam (Desmin Borges) são meros apêndices da jornada principal, que diz respeito não exatamente a uma transformação, como se percebe no encerramento, mas a uma incapacidade de seguir adiante e desvencilhar-se da obsessão que o filme não se preocupa em delinear como fruto de pressões sociais, do desejo de compartilhar amor ou da necessidade de preencher espaços. O ponto mais forte é o trabalho do elenco, potencializado pela óbvia preocupação diretiva com a esfera da interpretação. Kathryn Hahn e Paul Giamatti têm desempenhos dignos de nota, não distantes de zonas de conforto para ambos, por certo, mas, ainda assim, responsáveis pelo carisma dos desorientados Rachel e Richard. A inconsistência do desenvolvimento não invalida a beleza que surge ocasionalmente na trama.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
6
Chico Fireman
6
MÉDIA
6

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