Crítica
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Sinopse
Pedro Malasartes vive de pequenas trapaças e está sempre se safando das situações, mesmo as criadas por ele. Mas terá que enfrentar dois grandes inimigos: Próspero, que fará de tudo para impedir que sua irmã Áurea namore um sujeito como ele, e a própria Morte encarnada, que quer tirar férias e colocar Malasartes no seu lugar. Ele ainda terá que lidar com a bruxa Parca Cortadeira e suas irmãs, além de Esculápio, assistente da Morte. Agora, com tipos deste e do outro mundo se unindo contra ele, Malasartes terá que usar de toda a sua esperteza para sair ileso dessa confusão.
Crítica
Pedro Malasartes é a cara do Brasil, ainda que não seja, intrinsicamente, brasileiro. Personagem tradicional da cultura portuguesa, teve sua primeira menção registrada em cânticos datados entre os séculos XIII e XIV. Descrito pelo historiador Câmara Cascudo como exemplo de “bufão invencível, astucioso, cínico, inesgotável de expedientes e de enganos, sem escrúpulos e nem remorsos”, é uma figura que se adaptou facilmente ao imaginário nacional, marcado por recursos como o “jeitinho brasileiro” e uma malandragem que, à despeito de todas as dificuldades, representava a esperança por um final feliz – ainda que sem se preocupar às custas de quem. E se esse tipo parecia se encaixar ao nosso imaginário meio século atrás, hoje sua presença se revela mais complicada. É por isso que o resgate promovido por Malasartes e o Duelo com a Morte, de Paulo Morelli, investe no lúdico em detrimento de suas características mais marcantes, uma aposta que resulta acertada, mesmo que não isenta de alguns tropeços.
Como é típico a casos como esse, Malasartes é o caipira do interior que acredita que as pequenas mentiras e golpes fugazes que pratica no dia a dia são a garantia de sua sobrevivência. Interpretado com gosto por Jesuíta Barbosa, resulta em uma composição que emula de modo satisfatório as imagens de comediantes clássicos do ideário nacional, como Amácio Mazzaropi e Renato Aragão. Não por acaso, os dois responsáveis pelas personificações mais eficazes do matuto. Mazzaropi o levou às telas como ator e diretor primeiro em As Aventuras de Pedro Malazartes (1960) – assim mesmo, com o sobrenome grafado com “z” – num sucesso tamanho que por pouco não eclipsou sua criação mais famosa, o notório Jeca Tatu do longa homônimo lançado no mesmo ano. Já o líder d’Os Trapalhões foi responsável pelo telefilme Didi Malasartes, exibido em um especial de final de ano em 1998. Jesuíta, sabiamente, não renega essas influências, criando um protagonista que combina o melhor dos dois, ainda que não renegue uma personalidade própria.
É aniversário de Pedro Malasartes, e o que ele mais espera nesse dia é, enfim, conhecer seu padrinho, homem muito ocupado que, apesar de olhar por ele, nunca teve a oportunidade de visitá-lo. O que o protagonista não imagina é ser esse a Morte em pessoa (Julio Andrade, divertindo-se com os exageros típicos do papel). E o que essa quer é entregar ao afilhado um presente que jamais esquecerá – conceder-lhe o cargo que hoje desfruta, manipulando vidas como velas acesas que se apagam com um sopro, enquanto parte para um merecido e necessário descanso. Mas o rapaz prestes a completar sua maioridade tem outras preocupações: enganar a namorada apaixonada (Ísis Valverde, encantadora como um tipo tão ingênuo quanto seguro do que sente), enquanto tenta se engraçar para a morena de gingado encantador das redondezas. Ao mesmo tempo, evita cobranças de dívidas atrasadas e escapa da fúria acusadora do irmão da noiva (Milhem Cortaz, fazendo jus a alcunha de grande vilão da trama).
O enredo, aliás, se desenvolve em duas linhas narrativas. No plano terráqueo, Malasartes foge do trabalho, escapa de compromissos, se esforça para comparecer à festa preparada pela mãe e tenta levar vantagem até em cima dos amigos mais próximos. É o personagem que simpatizamos não pelas virtudes, e, sim, por suas fraquezas. O que desconhece durante a maior parte do tempo, no entanto, é que um jogo muito maior está se desenvolvendo à revelia de suas vontades. A Morte quer vê-lo no seu lugar, mas essa possível mudança pode abrir a brecha necessária para que as bruxas tecedeiras lideradas por uma inspirada Vera Holtz, que antigamente dominavam essa habilidade, possam retomar esse poder para si. As mudanças de um tom para outro são feitas não sem alguns percalços, ainda que a profusão de inserções digitais em um lado terminem por chamar mais atenção do que o cenário bucólico do outro. É quase como a dualidade entre a noite e o dia, o bem o mal. Malasartes está, literalmente, no meio destes extremos. Seu duelo, portanto, é mais consigo mesmo do que com qualquer outro.
Malasartes e o Duelo com a Morte sofre por estas divisões, tanto no ambiente ficcional, como também no lado de cá da audiência. Primeiro, temos a condução não muito segura do diretor Paulo Morelli, realizador mais afeito aos dramas pessoais – vide os ótimos Cidade dos Homens (2007) e Entre Nós (2013) – do que à comédia rasgada – basta lembrar do problemático Viva Voz (2003) – ou ao épico grandioso – alguém aí chegou a ver O Preço da Paz (2003)? Quando está focado nas relações entre seus personagens, o filme cresce. Porém, na mesma proporção, se perde a cada tentativa de ampliar seu escopo narrativo, indo atrás de uma magnitude que termina por não lhe servir. Mortes e traições, milagres engendrados e amizades forjadas na desconfiança são introduzidas de modo forçado. Trinta, ou até cinquenta anos atrás, o despreparo da plateia era maior, resultando ser mais fácil aceitar tais reviravoltas. Hoje em dia, as ressalvas se impõem, fazendo difícil abraçar causas como as aqui expostas sem um pé atrás. Por fim, lhe cabe, de fato, a alcunha de “filme com o maior uso de efeitos especiais do cinema brasileiro”. É, realmente, bonito aos olhos, porém dono de uma grandiosidade que apenas serve para destacar a ausência de maiores emoções em seu discurso.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
---|---|
Robledo Milani | 6 |
Edu Fernandes | 4 |
Bianca Zasso | 6 |
Marcelo Müller | 6 |
Leonardo Ribeiro | 5 |
MÉDIA | 5.4 |
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